A um ano de terminar um mandato em que os principais problemas de Lisboa se agravaram e em que a única “obra feita” vem do anterior executivo, Carlos Moedas junta a habitual tática da vitimização contra a “extrema-esquerda” a um discurso anti-imigração que pisca o olho ao eleitorado do Chega. Dossier organizado por Luís Branco.
Nos cinco artigos deste dossier, destacamos alguns aspetos que sublinham o autoritarismo da gestão de Carlos Moedas e o ataque permanente dirigido ao que chama de “extrema-esquerda”, eleita como adversária principal mas também como origem de todos os males que é incapaz de solucionar enquanto presidente da Câmara. Eles abordam o discurso anti-imigração e o piscar de olho à extrema-direita, que passa pelo uso da expressão das “portas escancaradas” mas também por colocar na gaveta a instalação do memorial da escravatura; o discurso securitário com a ordem ilegal à Polícia Municipal para deter pessoas; a adesão à propaganda sionista e o ataque a quem se levanta contra o genocídio; o fracasso na resposta às pessoas em situação de sem-abrigo, a população mais vulnerável de Lisboa; e a estratégia política assente na vitimização e no passa-culpas em todas as áreas da governação.
Desde que tomou posse em 2021, o executivo de Carlos Moedas não resolveu nenhum dos grandes problemas da cidade, e deixou que alguns se agravassem. Se a crise da habitação não é um exclusivo de Lisboa, a insistência de Moedas de proteger o alojamento local e a construção de novos hotéis não contribuiu para a combater. É verdade que ainda enquanto candidato à Câmara já tinha deixado claro o seu pensamento sobre medidas como a renda acessível, ao afirmar que “apoiar os mais pobres ou a classe média não vai resolver nada, são gotas de água. Esses disparates da esquerda ideológica é que têm feito os preços subir". Ao longo do mandato congelou um dos projetos do pilar público de nova construção de renda acessível - o PRA do Restelo - enquanto organizava cerimónias de entregas de chaves de casas construídas ou projetadas no anterior mandato como se fosse obra sua, uma prática comum entre os autarcas. O atual executivo conta com os milhões do PRR para a habitação, mas insiste no modelo das PPP que Medina também defendia e que acabou travado pelo Tribunal de Contas sem construir uma única casa, enquanto volta a atribuir responsabilidades à “extrema-esquerda” pela crise na habitação.
Já à crise do lixo nas ruas da cidade será mais difícil atribuir uma origem alheia à incompetência da autarquia. Apesar da produção de lixo em 2023 ser inferior à de 2019, Moedas tem usado a desculpa do reanimar da economia local e da pressão turística após a pandemia terem feito aumentar a produção de lixo. No entanto, a Câmara não se dotou dos meios e da organização necessária para uma recolha eficiente. As contratações de trabalhadores da higiene urbana anunciadas no inicio do mandato foram insuficientes para compensar os que se reformaram, os que foram transferidos para outros serviços camarários ou os que estão de baixa nesta função que regista o mais elevado índice de acidentes de trabalho na autarquia. À falta de pessoal e de viaturas operacionais junta-se a falta de coordenação com as juntas de freguesia, que resultou num permanente exercício de passa-culpas, outra das características do perfil de Moedas enquanto autarca em várias áreas da sua gestão. O resultado está bem à vista dos munícipes nas ruas da cidade.
O resultado das autárquicas deu à coligação de direita “Novos Tempos” o poder executivo em Lisboa, mas colocou-a em minoria na vereação, o que obrigaria Moedas a procurar consensos para viabilizar as suas medidas. Apesar de contar com a viabilização dos seus orçamentos por parte do PS, em muitos casos Moedas opta por retirar as suas propostas antes da votação para evitar chumbos ou alterações defendidas pela oposição, aproveitando sempre para vitimizar-se. Foi o que aconteceu esta semana com a Carta Municipal da Habitação, como já tinha acontecido com a ciclovia da Almirante Reis, a alienação de terrenos municipais, a proposta que fazia disparar o preço das rendas acessíveis ou a do apoio milionário que queria dar a um projeto promovido pelo mandatário da Iniciativa Liberal nas legislativas. Noutras situações, é o próprio Carlos Moedas que se retira da sala para evitar dar explicações ou ouvir as críticas da oposição.
Nos últimos meses, o autarca de Lisboa tem reforçado os ataques à “extrema-esquerda” e às políticas de imigração para tentar esconder o fracasso do seu mandato, neste caso no que diz respeito às respostas à população mais vulnerável da cidade, as pessoas sem-abrigo. Como se viu no caso dos imigrantes que há mais de um ano dormiam às portas da igreja dos Anjos, com a Câmara e o Governo a prometerem soluções que nunca se concretizaram, era possível encontrar rapidamente uma solução de emergência para terem um teto, o que Moedas só decidiu fazer na véspera da iniciativa que lhe confere um palco político nacional, o discurso do 5 de Outubro, para o poder aí anunciar com grande pompa e beneficiar politicamente com a projeção mediática.
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