segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

Notícias do Bloqueio e da Criadagem -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Jornalismo é rigor. Grande rigor. Os critérios que suportam os conteúdos da mensagem informativa são marcas do rigor: Actualidade. Verdade dos Factos. Imparcialidade. Se o mediador (Jornalista) entre o acontecimento e o consumidor capturar os fragmentos de informação na perspectiva do homem que mordeu o cão, temos o mundo perfeito nos Media. É assim desde que a notícia virou mercadoria valiosa. 

Antero de Quental, no último quartel do século XIX, queixava-se amargamente das “folhas a dez reis, muito informativas, que estão a matar os jornais”. O Jornalismo Doutrinário dava as últimas. Os jornais enquanto espaços de Liberdade começaram a ter donos e a servir poderes ilegítimos. A publicidade estava para as empresas jornalísticas como o vapor para as máquinas. Os Jornalistas passaram a ser assalariados pagos à linha de chumbo ou tipo a tipo. 

Os primeiros Jornais pediram de empréstimo a Linguagem Literária. A comunicação à distância fez nascer a Linguagem Jornalística. A produção de notícias era tão elevada que os Jornais já não conseguiam publicá-las. Assim nasceu a Rádio que fixou definitivamente a Linguagem Jornalística. 

Até ao final dos anos 60, os Jornalistas tinham salários de sargentos. Para ganharem como oficiais (o Jornalismo era o serviço militar dos poetas) os patrões ofereciam uma percentagem dos ganhos na publicidade redigida. Era assim que vendíamos a nossa consciência.

Jornalistas defensores da Ética e Deontologia conquistaram a direcção do Sindicato dos Jornalistas em Lisboa e Luanda, no final dos anos 60. Impuseram as Carteiras Profissionais. Mas só tinham direito ao documento os Jornalistas que assinavam um documento no qual declaravam por sua honra, que não exerciam actividades incompatíveis com o Jornalismo, nomeadamente relações públicas e publicidade. Foi aprovado um Código Deontológico e um Estatuto do Jornalista. 

Após o 25 de Abril de 1974 os Media adoptaram o seu Estatuto Editorial. Nasceram os Conselhos de Redacção. Os Jornalistas passaram a ser reconhecidos como quadros superiores das empresas jornalísticas.

O Jornalismo em Angola nasceu com a Imprensa Independente em oposição ao jornal do governador (Boletim Oficial) na segunda metade do Século XIX. O melhor que se publicava em Língua Portuguesa. Sempre com a independência e autonomia no horizonte. Jornalismo Doutrinário de causas políticas e sociais. Os jornalistas eram proprietários dos Jornais. E todos tinham tipografia própria para não dependerem da Imprensa Nacional do governador.

No Século XX a burguesia negra definhou e perdeu poder económico. O Jornalismo Angolano feito por Angolanos foi trucidado. Mas houve sempre resistência. O símbolo dos resistentes foi o Jornal de Angola (original), revista Mensagem e ABC, jornal diário vespertino, que nasceu na sequência da campanha eleitoral do General Humberto Delgado. Era dirigido por Machado Saldanha, um preso político que cumpriu pena no campo de concentração do Tarrafal. Até ao 25 de Abril de 1974 Angola teve grandes jornais e grandes jornalistas. A revista “Notícia” e o jornal diário “A Província de Angola” (Jornal de Angola) eram exemplos dessa grandeza. A Rádio Angolana era a melhor de Língua Portuguesa. 

Entre 1974 e 1975 verificou-se uma debandada quase geral dos jornalistas, gráficos e técnicos de som. Redacções de 30/40 profissionais ficaram com quatro ou cinco. Diário de Luanda e Jornal de Angola continuavam a sair. A Emissora Oficial (RNA) concentrou todos os profissionais disponíveis. Voz de Angola, Rádio Eclésia e Rádio Clube de Angola fecharam. As estações provinciais tiveram o mesmo destino. 

O Governo de Transição, em Junho de 1975, decidiu dar ordens ao Sindicato dos Jornalistas. Rejeitadas. Para não complicar ainda mais a situação política e social, num plenário dramático, os jornalistas sindicalizados decidiram encerrar a instituição. A Direcção foi entregar as chaves das instalações ao ministro da Informação. Nunca percebi se o senhor  aprendeu a lição. Nós quisemos dizer-lhe que os Jornalistas não são criados de ninguém. Não têm donos.

As Instalações da Avenida dos Combatentes com auditório e secretaria, eram nossas, Compradas com o dinheiro dos sócios do sindicato. Até hoje não foram devolvidas à classe. Que fiquem com elas. Mas não nos toquem na honra e a dignidade.

Jornal de Angola diz em título que um “fotógrafo” da casa foi homenageado no Huambo. Que horror! Os donos já lhes chamaram “bate-chapas”. Mas eles são fotojornalistas. Repórteres fotográficos. Fotógrafo é o Tio Célito.

O “Folha 8” aba-se de fazer “jornalismo independente”. Publica uma foto com as delegações que negociaram e assinaram o Acordo de Alvor: Governo Português, MPLA, FNLA e UNITA. Título: “A Selecção dos Malfeitores”. Já nem os retornados mais asquerosos ou os fascistas e colonialistas mais acéfalos insultam assim o Povo Angolano e o Povo Português. Um crime contra o Jornalismo e o Jornalistas. Impune porque convém ao filho de enfermeiro a destruição do Jornalismo Angolano.

A TPA entrevistou o empresário (assim se declarou) Yuri Simão. Honestamente disse que na Universidade Privada fez uma descoberta: Comunicação é mais do que jornalismo. Por isso criou uma empresa de “eventos”. Corre tudo bem, graças a Deus. Os espectáculos que organizo têm muitos patrocinadores, graças a Deus.

O canal público apresentou o empresário como “jornalista e organizador de eventos”. Ali ninguém sabe que organizar eventos é incompatível com o exercício do Jornalismo. Ismael Mateus era empresário do ramo da comunicação e imagem. Tinha uma empresa de comunicação e imagem. Quando faleceu foi apresentado e chorado como Jornalista!

Tiago Contreiras é o nome do empregado que a RTP (canal publico português) tem em Maputo, ao serviço do pastor evangélico Venâncio Mondlane. Disse esta frase num dos seus fretes asquerosos: “Venâncio Mondlane, candidato presidencial da Oposição”. É o que dá promoverem serventes a jornalistas para desmoralizarem os verdadeiros profissionais da RTP.

O rapazola não sabe o que é isso de rigor, a marca distintiva do Jornalismo. O pastor evangélico já não é candidato a nada. Muito menos presidencial. As eleições aconteceram e os resultados definitivos foram proclamados pelo Conselho Constitucional. Ele perdeu. Daniel Chapo foi eleito. Nunca foi o “candidato da Oposição”. Porque o MDM e a RENAMO, partidos da Oposição, tinham os seus candidatos à Presidência da República. 

O dito candidato presidencial e uma tal Paula Cristina Roque têm uma teoria escaganifobética: Os 1.535 reclusos que foram libertados da Machava (Maputo) pela tropa de choque do Venâncio, foi uma operação do governo para poder reprimir os “manifestantes”. Tomem nota. Se o Presidente Nyusi quiser repressão basta-lhe declarar o estado de emergência. Ou mesmo a Lei Marcial. Acaba o direito de manifestação e quem andar na rua a saquear, partir, incendiar, sofre as consequências. 

* Jornalista

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