sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

Angola | Mais um Prego no Caixão – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O Jornalismo está moribundo a nível planetário. Em Angola nasceu pujante, cresceu ao serviço da paz e da autonomia, impôs-se na defesa da Independência Nacional. Nos anos 40 estava destruído. Triunfou o ocupante e impôs os seus meios de comunicação social. Mas não houve rendição. A revista “Mensagem” juntou forças contra o colonialismo em condições muito adversas. Depois o Jornal de Angola, primeiro título. A repressão acabou com eles. Mas não acabou com a ideia nacionalista. 

Em 1974, na transição para a Independência Nacional, o Jornalismo Angolano voltou a ganhar protagonismo. O MPLA, ao vencer a Batalha da Informação, conquistou o poder político. Agostinho Neto proclamou a Independência Nacional no dia 10 de Novembro de 1975. Está por fazer a História dessa fase. Desse período só resta a Rádio Nacional e o Jornal de Angola, antes A Província de Angola. Grande responsabilidade para os seus profissionais.

Manifestação de interesse.  Drumond Jaime, Cândido Bessa, Guilhermino Alberto, António Cruz e Bernardino Manje são jornalistas de direcção do Jornal de Angola. Trabalhei com todos e tenho uma relação próxima com eles. São excelentes profissionais. Desgraçadamente, estes jornalistas de alto nível pregaram mais um prego na última tábua do caixão onde jaz moribundo e arrefece o Jornalismo Angolano. 

O Jornal de Angola publicou um “pedido de desculpas aos lesados” e em título “demarca-se das declarações de Riquinho”. O texto foi construído com um palavreado pretensamente jurídico onde até se fala na violação do Estatuto Editorial por profissionais da Redacção. Isto porque um jornalista da casa fez a cobertura da conferência de imprensa convocada por Henriques Miguel (Riquinho), para denunciar interferências de Gonçalves Muandumba, dirigente do MPLA, nas eleições para a Federação Angolana de Basquetebol. A Direcção do Jornal de Angola afirma que não foi respeitado o contraditório. Muita desculpa!

Henriques Miguel (Riquinho) concorreu à presidência da Federação Angolana de Basquetebol (FAB). Aquela instituição aceitou a sua candidatura e os nomes propostos para os corpos gerentes. Logo, adquiriu legitimidade. Não é um salteador. Não é um usurpador. É um candidato legítimo à direcção da FAB. Se convoca uma conferência de imprensa nessa qualidade, é normal que os Media façam a cobertura do acontecimento. Legitimidade inquestionável nessa matéria. 

Tudo o que Henriques Miguel (Riquinho) disse sobre o processo eleitoral está dito. Os jornalistas, se tinham alguma dúvida, faziam-lhe perguntas para acabarem com as dúvidas. Para preencherem possíveis vazios de informação. Concluída a conferência de imprensa produziram as suas mensagens informativas.

O jornalista do Jornal de Angola que cobriu a conferência de imprensa não foi lá por sua iniciativa. Não foi contratado por Henriques Miguel (Riquinho) nem é pago por ele. Cumpriu uma missão. E aqui reside o segundo factor da legitimidade. A Agenda de um jornal diário é elaborada por jornalistas seniores de altíssima capacidade. E construída na perspectiva da previsão dos acontecimentos. Se o acontecimento consta na Agenda é porque lhe foi reconhecido interesse jornalístico. O jornalista escalado para cobrir a conferência de imprensa de Henriques Miguel (Riquinho) fez o que lhe competia e produziu uma notícia. 

Se os jornalistas fossem papagaios ou cães amestrados para o circo, provavelmente o profissional que cobriu a conferência de imprensa em causa, em vez de produzir uma notícia, transmitia um recado. Ou censurava o que foi revelado. Perante o acontecimento, ele constactou que o homem mordeu um cão. O candidato à direcção da FAB, Henriques Miguel (Riquinho), disse que Gonçalves Muandumba usou a sua influência partidária para favorecer a Lista B, encabeçada por Carlos Almeida. Pior ainda. Esse comportamento to deveu-se ao facto de um filho de Muammbua, Adilson, fazer parte dos candidatos nessa lista. Grande maka!

Henriques Miguel (Riquinho) denunciou que Gonçalves Muandumbe disse a dirigentes de vários clubes que a Lista B, de Carlos Almeida, era apoiada pelo MPLA. Aqui está o homem a morder o cão. O MPLA perdeu as eleições na província de Luanda em 2022. Há evidentes sinais de divisão no seio do partido. Se o MPLA já nem consegue votos para a sua lista à FAB ganhar, as coisas correm de feição a João Lourenço. O partido está mesmo de rastos. Mas não querem que se saiba! Se o jornalista calasse isto, estava a ser um péssimo profissional. Revelou os factos e cada qual que tire as suas conclusões. Eu estou a tirar as minhas.

Caríssimos camaradas da direcção do Jornal de Angola. Neste caso, invocar o contraditório, não faz o mínimo sentido. É abusivo. Revela desconhecimento da prática numa Redacção. Ou então houve alguma interferência externa, abusiva, ilegítima, para que fosse redigido o pedido de desculpas naqueles termos. O que piora ainda mais a situação.

Henriques Miguel (Riquinho) adquiriu legitimidade quando a FAB aceitou a sua candidatura. A conferência de imprensa tornou-se um acontecimento relevante, quando entrou na Agenda do Jornal de Angola. Tudo o que foi dito na conferência de imprensa é ou não notícia. Mas quem decide isso é o jornalista que cobre o acontecimento. Mais ninguém.

Gonçalves Muandumba tinha ao seu dispor todos os Media presentes na conferência de imprensa para desmentir ou corrigir afirmações feitas pelo candidato derrotado à presidência da FAB. Podia emitir um comunicado desmentindo ou corrigindo ponto a ponto. Ou convocar uma conferência de imprensa. Até podia usar os dois instrumentos. Pelos vistos ficou calado. E a Direcção do Jornal de Angola partiu para a desonrosa tarefa de pregar mais uma tábua (a última?) no caixão do Jornalismo Angolano.

Canais de televisão e estações de rádio fizeram a cobertura da conferência de imprensa de Henriques Miguel (Riquinho). Quando ele disse que Gonçalves Muamdumba influenciou, em nome do MPLA, dirigentes dos clubes para votarem na Lista B, de Carlos de Almeida, os jornalistas desligavam as câmaras e os gravadores e diziam: Espere aí que nós vamos ouvir o dirigente do MPLA e depois prosseguimos! 

Não pode. Não há lugar ao contraditório na mesma peça. Só depois da publicação se dá a palavra ao visado. Não aconteceu. Preferiram tomar as dores de Muamdumba e falar por ele. Pior atentado à credibilidade do Jornal de Angola é impossível. Estou perplexo.

* Jornalista

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