Rafael Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião
Feitas as contas aos resultados, poderá sempre argumentar-se que oito em cada dez alemães rejeitaram ser governados pela extrema-direita. É factual, uma vez que cerca de 80% preferiram partidos com melhores credenciais democráticas, mas é também o equivalente a tentar varrer o lixo para debaixo do tapete. A verdade é que as forças políticas que forjaram a liberdade, o Estado de direito, o progresso económico e o Estado social, à direita e à esquerda, estão a definhar. E não só na Alemanha.
Nos Estados Unidos, Trump é o líder de um conjunto de arrivistas ao serviço de uma oligarquia de milionários (Musk é uma caricatura e apenas um entre vários) cuja única “ideologia” é da acumulação de riqueza e de poder. No país mais poderoso do Mundo, ficou à vista que o processo democrático é mais frágil do que se supunha.
E que dizer dos países mais importantes do Velho Continente, sem os quais não haveria União Europeia, a mais extraordinária construção política dos últimos cem anos (incluindo os seus muitos defeitos e disfunções)? Em França, foi por pouco que a frente republicana evitou a vitória dos extremistas de Marine Le Pen (venceu a primeira volta com um terço dos votos). Em Itália, quem manda é Giorgia Meloni, a herdeira dos movimentos pós-fascistas que nunca esqueceram, nem renegaram, Mussolini. Nos Países Baixos, é também um partido da direita radical que governa.
Regressando à Alemanha, a extrema-direita duplicou a percentagem de votos (conquistou um milhão de eleitores ao centro-direita, 900 mil aos liberais e 700 mil aos sociais-democratas) e foi o partido mais votado entre os 25 e os 44 anos. Foram os mais velhos, os que têm memória de tempos mais sombrios, os que testemunharam e beneficiaram do progresso do último meio século, e talvez os menos suscetíveis ao veneno que circula nas redes sociais, que impediram os bárbaros de tomarem a cidade. Mas já não serão esses a definir o futuro.
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