quarta-feira, 22 de junho de 2011

CIDADANIA POR GERAÇÃO ESPONTÂNEA





“É preciso elevar mais alto as aspirações, subir pelo pensamento a regiões mais puras, aos superiores domicílios do Espírito. Somente aí encontra o homem as verdadeiras consolações, os socorros, as forças espirituais.” Léon Denis. No invisível.

O pensamento é um atributo incomensurável e valioso.

Por mais que se reconheça a vigência desta prerrogativa psico-cerebral, muitos fazem mal uso dela, desconhecem sua amplidão ou negligenciam-na como ferramenta evolutiva.

Oxalá se desfaçam mitos e preconceitos, crenças e inverdades, a fim de que a cidadania seja o efeito de um processo construtivo e não o que nos fazem crer: mero jargão jurídico.

É deplorável que necessidades carnais e materiais regulem as sociedades modernas, das quais o Brasil é um sectário descuidado, a ponto de que os ícones comerciais tornam-se as referências de sobrevivência. Tal é a façanha que paradoxalmente converte um tecnocrata num profissional mais valorizado que o de formação humanista na sociedade regida pelo deus mercado, os proceitos neoliberais e a especulação financeira.

A negligência do pensamento onde ele deveria expressar-se com fartura transforma o Brasil numa Colônia Universal, cujo povo dá risada de pagar caro pela habitação enquanto se vendem as melhores e mais extensas terras do Pará, Mato Grosso e Goiás para investidores estrangeiros, que garantem o abastecimento de alimentos e fontes de energia a seus povos noutros países porque lá se cobram resultados em vez de trapacear.

A reforma do Código Florestal brasileiro, segundo o grupo que o propõe naquele covil Congresso Nacional, visa a reduzir o limite mínimo de reserva ambiental exigido por lei em cada aquisição territorial de terras virgens no país a fim de – diz o proponente – facilitar a fiscalização do governo brasileiro sobre o desmatamento.

Que insanidade! A quem governam?

Como se não bastasse o proveito que tiram da nossa condescendência e tolice, ainda se apresenta discretamente a proposta funesta de privatizar presídios brasileiros, já que se cultivou o preconceito de que instituições públicas são menos eficientes que as privadas. A empresa “concessionária” arrecadaria do Estado por detento. Cadeias amontoadas de pessoas seriam, portanto, um negócio rentável.

Brasileiro é um povo que se convence fácil pelas conversas de qualquer tipo europeu ou norte-americano, cujas fórmulas se aplicam aqui antes que deem certo lá.

Possivelmente é daí que vem o complexo de “país emergente” ou “líder regional” ou “BRIC”, que não passa de piada de mal gosto devido à bagunça interna e ao número ingente de pessoas à deriva e totalmente dependentes de políticas assistencialistas. Países vizinhos põem-se na defensiva sem saber que não é nada disso, pois a violência está sem limites, o preço dos alimentos disparou, e poucos sabem o que fazer com o documento magno chamado Constituição da República Federativa do Brasil.

O eixo do Pacífico, que envolve México, Colômbia, Peru e Chile, é um foro de países que estudam a composição de um bloco em contrapeso ao Mercado Comum do Sul. Embora suas políticas integracionistas sejam questionáveis, todos aqueles coincidentemente têm acordos ou negociações de livre comércio com os decadentes Estados Unidos da América.

Os movimentos internacionais convidam os cidadãos a que entendam as revoltas populares no norte da África e Oriente Médio como inflexão a regimes de diálogo e participação.

A democracia gringa não é o modelo ideal, porém propaga-se como se fosse devido ao torpor em que vive a população daquele país e as justificativas mais bizarras que sua política exterior apresenta para invadir nações (soberanas) e saquear suas riquezas. A maioria dos televidentes anuiu a deposição de Saddam Hussein no Iraque, mas a minoria reconhece o caos que este país vive depois da intromissão porque já não lhes importa o que passa por lá.

Temos que massagear o cérebro e reativar o pensamento sobre a assimilação irrefletida das estupidezes que nos chegam pelas agências de notícias do Norte. O exercício torna-se urgente diante do fenômeno Bin Laden, engano que cinde de uma vez os que valorizam o pensamento e os que se distraem com frivolidades.

A própria narração do evento, se a levarmos a sério, é catastrófica do ponto de vista de endereçar os Estados Unidos como supostos paladinos da democracia e dos direitos humanos, cuja imagem vendem ao orbe: primeiro invadem o Paquistão sem o consentimento deste país (que é soberano como qualquer outro), matam o sujeito sem julgamento prévio (dizendo que o mundo estará mais seguro), e ainda jogam o corpo no mar.

Perde-se a credibilidade quando a verdade intercala-se com a mentira.

Os gringos ainda têm o descaramento de financiar os grupos de direitos humanos para promover a liberdade de imprensa na Venezuela, a defesa das mulheres no Irã, o combate ao trabalho infantil no Brasil, a “guerra” ao narcotráfico na Colômbia. O dinheiro compra muitas destas organizações “de sociedade civil sem fins de lucro”.

O atributo do pensamento é nossa ferramenta mais oportuna.

Não deixe que o inibam ou se apropriem da sua capacidade de pensar.

Tampouco a cidadania brota por geração espontânea.


*Bruno Peron Loureiro é mestre em Estudos Latino-americanos pela FFyL/UNAM (Universidad Nacional Autónoma de México).

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