Angela Merkel visitou três países africanos em quatro dias: o Quénia, Angola e a Nigéria. Um périplo africano que inspira várias reflexões à imprensa alemã.
Nas colunas do Frankfurter Allgmeine Zeitung, Hans Meier-Ewert, diretor da "Afrika-Verein", associação para a África, defendeu um maior envolvimento das empresas alemãs no continente africano.
Ele saudou a visita de Angela Merkel às três potências regionais de África: o Quênia, Angola e a Nigéria. "A África", destacou Meier-Ewert, "é um continente dinâmico que teve entre 2001 e 2008 um crescimento de 6% e atingirá novamente um nível semelhante no futuro", disse.
Mas, na Alemanha, a imagem de África é sempre dominada por guerras, crises, doenças e catástrofes. "Esta imagem não tem muito a ver com a realidade na maioria dos países africanos", concluiu o diretor do "Afrika-Verein".
Escolha da Nigéria e de Angola, produtores de petróleo, não foi por acaso
O que se pode ler noutros jornais é nitidamente menos entusiasta, como nota, por seu turno, o Frankfurter Rundschau... e não é o único.
Para o jornal, "a escolha da Nigéria e de Angola, os dois principais produtores de petróleo em África, não foi por acaso". Em seguida o jornal acrescenta: "a África assume uma importância cada vez maior no aprovisionamento da Alemanha em energia e matérias primas".
Segundo o Süddeutsche Zeitung, "o problema é que a Alemanha não se envolveu, até hoje, de forma concreta, para que as populações dos países africanos também fossem beneficiadas com as receitas do petróleo".
"Merkel e os grandes do petróleo", titulou o Süddeutsche Zeitung, ao sublinhar que a Nigéria e Angola ilustram, cada um à sua maneira "esta maldição dos recursos" muitas vezes questionada em África.
O jornal evoca a violenta guerra pelo petróleo que atinge o delta do Níger. E nota ainda que "muitos outros setores económicos foram literalmente afogados na Nigéria, porque é muito mais confortável ganhar milhões de petrodólares, do que investir a longo prazo noutras áreas".
Em resumo, para o Süddeutsche Zeitung esta viagem de Angela Merkel foi mais um sinal confuso, na medida em que Angola, como a Nigéria, pratica o contrário dos objetivos da política africana da Alemanha, ou seja, promover a proteção dos recursos, a proteção do meio ambiente e o desenvolvimento económico sustentável.
"Elites ricas e cidadãos pobres", escreveu, na mesma ordem de idéia, o Tagesspiegel de Berlim, ao sublinhar que "o défice democrático em Angola é tão grande como as suas reservas de petróleo".
Barcos de patrulha alemães para Angola?
Entretanto, a visita de Angela Merkel, a Angola desencadeou aqui na Alemanha uma grande polémica.
"Angola Merkel", como escreveu o Tageszeitung, ofereceu na quarta feira (13.07) ao presidente José Eduardo dos Santos de Angola, a possibilidade de comprar barcos de patrulha alemães, uma iniciativa que desencadeou várias críticas no seio da oposição. "É uma falta de visão" escreveu o Süddeutsche Zeitung para concluir que "se trata de uma provocação".
"Os esforços da Alemanha para conquistar mercados em África assumem contornos originais", escreveu numa outra edição o Tageszeitung ao noticiar a proposta feita pela chanceler Angela Merkel de vender à marinha de guerra angolana barcos de patrulha alemães.
"O nosso objetivo", disse Merkel, é que conflitos regionais possam também ser pacificados por tropas regionais", tendo citado como exemplo a Somália e o Sudão.
O jornal acrescenta que "para além do facto de na verdade esta idéia não ter funcionado nesses dois países, em caso algum será aplicado no que concerne a Angola".
Angola possui um dos maiores e mais experientes exércitos do continente africano e "por várias vezes realizou intervenções nos dois países vizinhos: a República Democrática do Congo e o Congo-Brazaville. E Angola está também em conflito com esses dois países para a delimitação das águas territoriais".
O jornal recorda que "lá, onde estão as maiores reservas de petróleo off-shore, uma faixa costeira de 20 quilómetros, pertence ao Congo Democrático e separa o território angolano do exclave angolano de Cabinda. Por seu lado, o Congo-Brazaville reclama há anos um aumento da superfície das suas águas territoriais".
"Nesse contexto", sublinha o quotidiano, a venda de barcos de patrulha à marinha angolana é um projeto ultra-sensível".
Num artigo do quotidiano económico Handelsblatt, o chefe da publicação do semanário Die Zeit, Josef Joffe, lembrou que a "Alemanha, defensora intransigente da paz" é o terceiro exportador mundial de armas e "não importa quem dirige o governo, o SPD ou a CDU da senhora Merkel".
E o artigo faz referencia às vendas de armamento a Singapura, aos Emiratos Árabes Unidos, à Arábia Saudita, ao Qatar.....
Aproveitamos para lembrar que a polémica começou no início deste mês de julho com o anúncio pela imprensa alemã de uma iminente venda de 200 carros de combate Leopard 2 à Arábia Saudita.
73% dos alemães são contra, segundo uma sondagem do instituto Forsa publicada na semana passada pelo semanário Stern.
Autor: António Rocha - Edição: Cristina Krippahl
Sem comentários:
Enviar um comentário