quarta-feira, 20 de julho de 2011

Portugal: AJUSTAMENTO FINANCEIRO E RECUO SOCIAL





Não vale a pena estarmo-nos a enganar com eufemismos: política de ajustamento - em Portugal, como em qualquer parte do mundo de economia capitalista -, significa embaratecimento do factor trabalho. O aperto do cinto visível, e socialmente temível, incide sobre a esmagadora maioria da população activa: no congelamento dos salários dos empregados, no corte dos apoios sociais aos desempregados, na redução das indemnizações por despedimento "amigável", nas restrições de acesso a outros programas de apoio social.

Em vez de uma redução dos factores produtivos através da desvalorização competitiva da moeda, o recuo da economia faz-se sentir de forma diferenciada no trabalho e no capital. Neste último, a subida do risco do investimento leva à sua queda e, com ela, à retracção do emprego, que acaba por penalizar fortemente não só os empregos directos como todos os apoios sociais que o Estado montou para minimizar as situações de doença, de desemprego e de velhice.

Nos próximos dois anos, não vamos assistir a outra coisa. O PS sabe-o, por isso negociou com os parceiros sociais o último pacote de redução de custos dos despedimentos por parte das empresas. E os dois partidos do Governo sempre defenderam medidas mais fortes neste sentido para partir de uma base mais competitiva para novo ciclo de crescimento económico. Isto é, a crise modifica invariavelmente a relação entre trabalho e capital, enfraquecendo aquele em favor deste.

Os sacrifícios só serão toleráveis se - na medida de cada um - forem repartidos por todos os tipos de rendimento, se acautelarem o nível de vida de cada um pelo seu contributo produtivo e o dos mais fracos, bem acima do limiar da pobreza. E se, ao entrar--se na fase de crescimento económico, uma cultura de compromisso social passar a assegurar, daqui em diante, a expansão sustentada do emprego e os ganhos reais de rendimento dos trabalhadores, alinhados com os seus incrementos de produtividade.

Democracia britânica

Australiano naturalizado americano, Rupert Murdoch há muito que se habituou a ter uma palavra a dizer na política britânica. Além de uma forte participação na televisão Sky News, que tentava agora tornar dominante, e de ser dono do News of The World, extinto por causa do escândalo das escutas, controla o The Sun, o mais emblemático dos tablóides britânicos. Para muitos, trata-se de um jornal sensacionalista célebre pelas modelos em topless na página 3, mas pergunte-se a Tony Blair ou a David Cameron quanto vale o apoio do diário. Em 1997, ao voltar costas ao primeiro-ministro John Major, facilitou o regresso dos trabalhistas ao poder após 18 anos. E no ano passado, com o mesmo à-vontade, puxou o tapete a Gordon Brown, apelou ao voto em David Cameron, contribuindo para o triunfo conservador.

Faz parte da tradição anglo-saxónica os jornais apoiarem um partido ou um candidato. No caso de Murdoch, isso transformou-se num poder imenso. A ponto de haver figuras que agora se queixam de temer pela sua vida política por afrontarem os media, sendo certo que outras fomentavam alguma promiscuidade entre a governação e o mundo jornalístico. E à medida que se conhecem mais pormenores do caso das escutas, especula-se sobre que mais cabeças rolarão ainda, depois das de directores de jornais, assessores políticos e chefes policiais.

Mas a audição parlamentar que ontem aconteceu em Londres, e a forma como o escândalo está a ser exposto, mostra que se a democracia britânica tem falhas, também revela enorme coragem. Murdoch que o diga. Não é fácil para um multimilionário de 80 anos ter de explicar aquilo que anda a fazer de errado.

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