sábado, 23 de julho de 2011

Portugal - Angola: APOSTA DE PAULO PORTAS NO INTERESSE COMUM - entrevista




KUMUÊNHO DA ROSA – JORNAL DE ANGOLA

O ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros do governo português, Paulo Portas, deu uma entrevista exclusiva ao Jornal de Angola onde defendeu para Portugal e Angola a adopção de um regime de vistos mais fácil e ágil. Falou ainda da grande margem de progressão da CPLP, perspectivando que a Língua Portuguesa seja a grande vencedora da globalização.
Jornal de Angola - A grave crise que Portugal vive condiciona a forma de negociar acordos com países como Angola?

Paulo Portas - As relações são permanentes e as crises são passageiras. Quando uma Nação tem que enfrentar uma crise, identifica as suas causas, escolhe os remédios e cumpre a medicação. E um dia a crise passa e a Nação permanece. Portugal teve ummomento muito difícil que obrigou a um pedido de ajuda externa. Está assinado um memorando com o FMI, Banco Central Europeu e com a Comissão Europeia. Nós vamos cumprir porque os Estados, na ordem internacional e na ordem interna devem cumprir a sua palavra. têm interesses comuns. É uma relação com dois sentidos. Confiança atrai confiança e desconfiança atrai desconfiança. Nós optamos deliberadamente pela confiança.

JA - C omo se gera a confiança?

PP - As empresas, os quadros, os trabalhadores e os investimentos portugueses devem contribuir para o desenvolvimento de Angola nos termos e orientações definidos pelo Executivo de Angola. E desejamos que sejam bem-vindos e bem tratados em Angola. Da mesma maneira queremos que os investimento angolanos em Portugal, que já são significativos, sejam bem recebidos. Portanto, é preciso que haja uma situação em que os dois países ganham.

JA - Qual é a sua visão sobre as relações comerciais entre Angola e Portugal?

PP -  Há muitas empresas portuguesas a investir em Angola e há também significativo investimento angolano em Portugal. Mas, sobretudo, há cada vez mais empresas mistas e parcerias. E estas parcerias têm uma potencialidade de desenvolvimento em mercados regionais extremamente importante, nomeadamente aqui em África. Se os portugueses e angolanos souberem defender bem os seus interesses, conquistam outros mercados e conquistam outras quotas. As nossas relações económicas são muito intensas.

JA – Há boas condições para o investimento?

PP - Angola e Portugal têm uma cultura comum, uma proximidade que é conhecida, falam a mesma língua e têm um relacionamento diplomático muito elevado. Acontece que Angola depois de conquistar a paz conquistou o desenvolvimento e agora precisa de investidores e de conhecimento que tornem mais célere esse desenvolvimento.
 

Portugal, como tem um endividamento externo grande, precisa de promover as suas exportações, os seus produtos, as suas marcas e as suas empresas. Essa promoção das exportações  tem um dos mercados preferenciais em Angola, da mesma maneira que é fundamental a captação de investimento angolano em Portugal.

JA - Como se cria um clima favorável para aprofundar a cooperação bilateral?

PP -  A política externa não é uma questão de estados de alma. A política externa serve os interesses permanentes dos Estados. A relação entre Portugal e Angola não depende nem de regimes nem de governos, nem de eleições, nem de partidos. Primeiro porque há um consenso larguíssimo em Portugal sobre a amizade com Angola, tal como, creio, existe um consenso larguíssimo em Angola sobre a amizade com Portugal. Não há uns dum lado e outros do outro. Os Estados têm interesses permanentes. É do interesse de Portugal, de Angola e da CPLP melhorar as relações. Para isso é preciso abrir portas, eliminar barreiras e també, que as autoridades políticas se empenhem em resolver o que é fácil resolver.

JA - É desta vez que se resolve a questão dos vistos?

PP - O ministro Georges Chicoty e eu próprio estamos empenhados em ultrapassar os problemas. A questão dos vistos precisa de uma solução que respeite a soberania de cada Estado e as prerrogativas desta mesma soberania. Mas é evidente que é possível ajustar o regime de vistos em Portugal e Angola.

JA - O que faltava para esse ajuste?

PP - Faltava que os dois países trocassem propostas e isso aconteceu esta semana. Já foi um belíssimo sinal. Depois faltava que os dois países marcassem a reunião da comissão dos vistos, que também decidimos que vai acontecer em Agosto. E depois falta que no quadro dessa reunião se aproxime aquilo que falta aproximar. Como conheço as duas propostas acho que estamos no domínio do possível. E, portanto, no domínio de uma boa negociação e de um bom compromisso.

Mais cedo do que tarde vamos ter um regime melhor de vistos, mais simples, mais ágil, e que dá às empresas e às pessoas maior certeza, maior capacidade de planeamento e maior previsibilidade.

JA - E as cartas de condução?

PP - Eu trato dossier a dossier. O desenvolvimento quem o faz são as empresas. De um lado e do outro. As autoridades políticas têm o dever de remover obstáculos, limar arestas, simplificar as coisas. E eu acho que é isto que vai acontecer.

JA - Os resultados da visita do Presidente Cavaco Silva ficaram aquém do esperado?

PP - Há muitos investimentos que estão a andar de um lado e do outro que não são notícia. Há muitos domínios onde há investimentos angolanos em Portugal e muitos domínios onde há investimento português em Angola. E isso é que adensa economicamente as relações, todos os dias. A política não é um acto instantâneo. Entre a declaração de vontade política e a sua concretização medeia um certo tempo. Eu procuro que este tempo seja o mais rápido possível.

JA - Há boas perspectivas para os dois países?

PP - Estou convencido de que há oportunidades no quadro da lei do investimento em Angola, da lei das micro, pequenas e médias empresas que está a chegar, no quadro do processo de privatizações em Portugal. Há interesses em Angola e Portugal que são geríveis de uma forma equilibrada e a meu ver vão permitir mais colaboração, maior aproximação e mais parcerias.

JA - Quais as conclusões da reunião ministerial da CPLP em relação a Guiné-Bissau?

PP - A Guiné-Bissau teve níveis de instabilidade política extremamente elevados, e níveis de conflituosidade e até de violência extremamente indesejáveis. A comunidade internacional, nomeadamente a CPLP, pode enquadrar um roteiro que permita reformas no sector de segurança e o processo político se passe nas instituições e não através de pronunciamentos militares. É isto que estamos a fazer no quadro da CPLP, da União Europeia, das Nações Unidas Como os países estão a fazer e particularmente Angola, que tem a presidência da CPLP.

JA - A promoção da Língua Portuguesa é prioridade?

PP - Isso eu acho que é um grande desafio. Faço parte daqueles que acreditam que o português vai ser uma das línguas vencedoras da globalização. Há línguas que hoje são consideradas relevantes e se calhar daqui a 50 anos não são faladas por muita gente.
 
O português da CPLP é um português dinâmico e universal. É falado por 250 milhões de pessoas, até 2050 rão 350 milhões. É a sexta língua mais falada no mundo, é a terceira língua europeia mais falada. O português é falado em quatro continentes, em oito países e inúmeras regiões. Se os países da CPLP tiverem uma estratégia de defesa da internacionalização do português, a língua que todos falamos é uma língua global num mundo que é global. A língua tem um valor económico extremamente elevado.

JA - O que está a ser feito de concreto?

PP - Tudo o que tem a ver com a língua, desde a educação, tradução, edição, comunicação, televisão, só para dar alguns exemplos, vale quase 15 por cento do Produto Interno Bruto, ou mais. Por isso é preciso tomar medidas práticas para se defender a internacionalização da língua. Não basta o discurso. Temos o exemplo da Guiné-Bissau. Nos fóruns internacionais, a CPLP falou como um núcleo. Um falou por todos. E isso, quando é possível, é bom porque torna muito respeitável a CPLP face a outras organizações.

JA - O que esperar da presidência moçambicana da CPLP?

PP - Acho que, como a angolana, vai ser uma boa presidência. Acho, com toda a franqueza, que a CPLP é uma comunidade em expansão.

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