LUSA
Após a derrota de Manuel Inocêncio nas presidenciais de domingo em Cabo Verde , o PAICV, no poder desde 2001, nunca mais será o mesmo, devendo realizar rapidamente um Congresso Extraordinário.
A conclusão é de dois analistas políticos cabo-verdianos que, ao comentarem à Agência Lusa os resultados da segunda volta das presidenciais cabo-verdianas de domingo, ganhas por Jorge Carlos Fonseca, do MpD (oposição), destacaram como facto principal a inédita coabitação que haverá no país em 20 anos de abertura política.
Corsino Tolentino, investigador, e Manuel Brito Semedo, antropólogo, coincidiram na opinião de que a derrota do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) vai permitir a chegada de uma "nova era" ligada a um novo capítulo da democracia, a coabitação.
"A estratégia do líder do PAICV (José Maria Neves, primeiro-ministro) foi derrotada nas urnas e o Presidente eleito contou mesmo a transferência de mais de 50 por cento dos votos de Aristides Lima (candidato também da esfera «tambarina» e que ficou pela primeira volta, com 44.500 votos", afirmou Tolentino.
Brito Semedo foi mais longe, ao referir que a vitória de Fonseca foi uma "derrota pessoal" de Neves, que terá agora de pedir a realização de um congresso extraordinário para "sarar as feridas profundas" da campanha da primeira volta, em que as acusações a Lima, ex-Presidente do Parlamento, foram "acesas".
Em causa acaba por estar, afirmam ambos, a divisão que reina no antigo partido único, uma vez que nem todos os que apoiaram Lima votaram em Inocêncio, tendo Fonseca disso "beneficiado" para bater o candidato oficial do PAICV na segunda volta.
Mas as presidenciais, que trouxeram de novo à ribalta o Movimento para a Democracia (MpD), uma vez que apoiou Fonseca, demonstraram as divergências de fundo no partido de Neves que, confrontado com a ala conservadora, tem agora em Felisberto Vieira um opositor que promete dar-lhe uma luta sem tréguas.
"Para já, Vieira já deixou o Governo. Tem a seu cargo a região de Santiago Sul, a mais influente e a maior do país. Depois, as feridas não sararam e as divergências acentuaram-se. Falta agora o congresso para clarificar as posições", disse Brito Semedo.
Prova disso, referiram Tolentino e Brito Semedo, foi a forma como Neves se recusou a comentar os resultados da votação -- "felicitou Fonseca na qualidade de chefe do Governo, mas nada comentou politicamente" -, em que ficou patente que o eleitorado cabo-verdiano "quis esticar" a democracia, unindo-a à coabitação.
"Mais do que isso, basta ver como os votos mudaram da primeira para a segunda volta. Fonseca obteve mais 35 mil e Inocêncio mais 30 mil. Muitos dos que votaram em Lima na primeira volta, optaram agora por Fonseca. Mas a arrogância do regime também ajudou", sublinhou Tolentino.
No mesmo sentido, Brito Semedo evocou a descida de 6,5 por cento da abstenção, que beneficiou Fonseca, o reforço dos votos do MpD, que apostou tudo, e ganhou, nas presidenciais, e a "imparcialidade" de Lima que, na segunda volta, nunca deu qualquer indicação de voto.
O antropólogo lembrou ainda que, no Parlamento, o "grupo" afeto a Lima conta com 11 dos 38 deputados eleitos pelo PAICV nas legislativas de 06 de fevereiro deste ano, realçando que bastam três para que, numa conjugação com os 32 do MpD e os dois da União Cabo-Verdiana e Democrática (UCD, que votou Fonseca), existam surpresas. Para ambos, tudo dependerá de Neves, que tem mais a ganhar do que a perder se convocar o congresso para unificar o PAICV.
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