domingo, 14 de agosto de 2011

Portugal: A AUSTERIDADE QUE É MAIS DO MESMO




DIÁRIO DE NOTÍCIAS, opinião - ontem

Ao ouvirmos as reacções dos partidos da oposição, das associações empresariais e de consumidores e dos sempre insatisfeitos sindicatos, concluímos que, perante o anúncio de novas medidas de austeridade - o aumento do IVA para a electricidade e o gás e o congelamento das carreiras dos militares e forças de segurança -, a percepção dos cidadãos é esta: o Estado, em vez de dar o exemplo, continua com os mesmos níveis de gordura, e os sacrifícios a ser exigidos aos contribuintes.

Antes de chegarem ao Governo, PSD e CDS anunciaram que sabiam exactamente onde cortar nas despesas "inúteis" do Estado de modo a pouparem mais de mil milhões de euros. Passados quase dois meses da tomada de posse, ninguém ainda percebeu onde e como vai o Governo cortar nas despesas dos ministérios e no emagrecimento do Estado. Afinal, a receita seguida é aquela que é mais fácil: obter ganhos do lado da receita por via do aumento de impostos, em vez de, repita-se, dar o exemplo e cortar no supérfluo.

Aliás, aquilo que ontem ficou demonstrado, ao contrário do que os portugueses esperavam - até porque o Governo o fez saber quando pré-anunciou em vários órgãos de comunicação social "cortes brutais" -, foi que uma coisa é o que se promete quando se está na oposição, outra é aquilo que se faz quando se chega ao poder.

Pela edição de hoje do DN, ficamos a saber que, voluntária ou involuntariamente, o ministro das Finanças adiou por tempo indeterminado os cortes na despesa. Se até aqui o País, melhor ou pior, tem demonstrado compreensão pela austeridade que lhe é pedida, é avisado perceber que a paciência não é infinita. E das duas uma, ou o Governo se apressa a dar sinais de que os sacrifícios são realmente para todos, ou que, ninguém tenha dúvidas, a contestação temida pelo núcleo político do Executivo vai mesmo sair à rua.

Contra a Europa dividida

Quando, no seu famoso discurso de 1946, Churchill falou da Cortina de Ferro, esta não passava de uma metáfora para a divisão da Europa. Depois da derrota nazi, Ocidentais de um lado e soviéticos do outro impuseram as suas esferas de influência, adivinhando a Guerra Fria. Mas se era imaginária a linha que ia de Stettin no Báltico a Trieste no Adriático (os extremos da cortina, segundo Churchill), a partir de 1961 passou a ter um troço real, feito não de ferro mas de cimento, barreira com mais de três metros de altura que dividia ao meio Berlim. Foi a 13 de Agosto de 1961, faz hoje meio século, que nasceu o Muro. Durou 28 anos, provocou a morte de muita gente, mas envergonhou também o bloco comunista, obrigado a prender os seus próprios cidadãos.

Se o momento da construção do Muro foi uma tragédia, já o da sua queda trouxe esperança. A 9 de Novembro de 1989, percebeu-se que Berlim seria reunificada, a Alemanha também, e que a Guerra Fria estava condenada. A própria União Europeia ganhava novo fôlego, integrando no ano seguinte o território da Alemanha Oriental, depois, em 2004, oito países ex-comunistas e, em 2007, Roménia e Bulgária. Liderada por Kohl, a Alemanha da reunificação tornava--se mais do que nunca a locomotiva da construção europeia, projecto nascido para evitar guerras como as de 1914-1918 e 1939-1945.

Hoje, com a Europa em crise, só a Alemanha tem poder para ser a locomotiva que a levará para terrenos mais promissores, transportando ricos e menos ricos. E espera-se que o faça. Nos tempos do Muro, contou sempre com a solidariedade dos seus parceiros. E a sua reunificação entusiasmou os europeus (tirando talvez o francês Mitterrand e a britânica Thatcher). Há semanas, Kohl acusou Merkel de não defender a Europa, a sua Europa. Esperemos que se engane. Afinal, a chanceler, que foi criada na RDA, deveria saber melhor do que ninguém que nada se ganha com a Europa dividida.

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