segunda-feira, 5 de setembro de 2011

CHENEY, RUMSFELD E A OBSCURA ARTE DA PROPAGANDA




Amy Goodman - Democracy Now – Carta Maior

A poucos dias do décimo aniversário do 11 de setembro e enquanto aumentam as vítimas em todos os lugares, os livros de Donald Rumsfeld e Dick Cheney nos lembram uma vez mais qual é a primeira vítima da guerra: a verdade. Em seu livro "Em meu tempo", Cheney parece ter adotado o famoso conselho de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda nazista: "Quando se mente, deve-se mentir grande e permanecer fiel a essa mentira". O artigo é de Amy Goodman.

 “Quando se mente, deve-se mentir grande e ser fiel a essa mentira”, escreveu Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda do Reich alemão em 1941. O ex-vice-presidente Dick Cheney parece ter adotado o famoso conselho nazi em seu novo livro: “Em meu tempo”. Cheney continua sendo fiel a suas convicções em temas que vão desde a invasão do Iraque até o uso da tortura. Durante uma entrevista ao programa Dateline, da NBC News, ele disse em referência às revelações deste livro: “Elas farão rolar muitas cabeças em Washington”. As memórias de Cheney seguem as de seu colega e amigo Donald Rumsfeld. Enquanto ambos promovem sua própria versão da história, há gente que os desafia e enfrenta.

O título do livro de Rumsfeld, “Conhecido e desconhecido”, provém de uma tristemente célebre resposta que deu durante uma conferência de imprensa no Pentágono quando era ministro da Defesa. No dia 12 de fevereiro de 2002, quando tentava explicar a falta de evidências vinculando o Iraque às armas de destruição de massa, Rumsfeld disse: “Há conhecidos que conhecemos, há coisas que sabemos que sabemos. Também sabemos que há conhecidos que desconhecemos, o que quer dizer que sabemos que há algumas coisas que não sabemos. Mas também há coisas desconhecidas que desconhecemos, aquilo que não sabemos que não sabemos”.

A enigmática declaração de Rumsfeld tornou-se famosa e emblemática de seu desdém pelos jornalistas. É considerada como um símbolo das mentiras e manipulações que levaram os Estados unidos à desastrosa invasão e ocupação do Iraque.

Uma pessoa que se convenceu graças à retórica de Rumsfeld foi Jared August Hagemann.

Hagemann se alistou no exército para servir seu país, para fazer frente às ameaças que repetidamente mencionava o ministro da Defesa Rumsfeld. Quando o soldado do comando do exército dos EUA recebeu a carta de notificação para seu mais recente deslocamento ao campo de batalha (sua esposa não lembra se era o sétimo ou oitavo), a pressão foi demasiada. No dia 28 de junho de 2011, Jared Hagemann, de 25 anos de idade, atirou em su mesmo na base conjunta Lewis-McChord, perto de Seattle. O Pentágono disse que Hagemann morreu por causa de um ferimento de bala “auto-infligido”, mas ainda assim não falou em suicídio.

Jared havia ameaçado se matar várias vezes antes. Não era o único. Segundo se informou, cinco soldados cometeram suicídio em Fort Lewis em julho. Estima-se que mais de 300 mil soldados que voltaram da guerra padecem de transtornos de stress pós-traumático e depressão.

A viúva de Hagemann, Ashley Joppa-Hagemann, inteirou-se de que Rumsfeld autografaria exemplares de seu livro na base. No dia 26 de agosto, Ashley entregou a Rumsfeld uma cópia do programa dos serviços fúnebres em memória de seu falecido esposo. Ela me contou: “Disse que queria ele tivesse vindo ao enterro do meus esposo e assim poderia conhecer o rosto de pelo menos um dos soldados que perderam a vida por causa de suas mentiras em relação a 11 de setembro”.

Perguntei acerca da resposta de Rumsfeld: “Todos o que lembro é ele dizendo: “Ah, sim, ouvi algo sobre isso”. E, logo em seguida, tudo o que lembro é de ter sido agarrada pelo pessoal da segurança, empurrada para fora e advertida para não regressar”. Infelizmente é o sargento Hagemann que nunca mais regressará á sua esposa e seus dois pequenos filhos.

Em sua entrevista para a NBC, Cheney afirmou ter um desempenhado um papel na renúncia do então secretário de Estado, Collin Powell. Sobre isso, consultei o ex-assessor de Powell, o coronel Lawrence Wilkerson, que respondeu: “Pelos trechos que li, não li todo o livro, a coisa mais impactante dita pelo vice-presidente em seu livro é que ele teve algo a ver com o afastamento de Colin Powel de seu cargo, em janeiro de 2005. Isso é um disparate total”. Mas importante, porém, é o chamado de Wilkerson, exortando a que os envolvidos em levar o país à guerra no Iraque sejam responsabilizados por seus atos, o que implicaria um castigo para ele próprio.

Um pilar central da invasão do Iraque foi o discurso de Powell no dia 5 de fevereiro de 2003 nas Nações unidas, no qual expôs o caso das armas de destruição em massa. Wilkerson assume plena responsabilidade pela coordenação do discurso de Powell: “Infelizmente, e já reconheci isso muitas vezes pública e privadamente, fui a pessoa que preparou a apresentação de Colin Powell ante o Conselho de Segurança das Nações Unidas no dia 5 de fevereiro de 2003. Provavelmente foi o maior erro da minha vida. Lamento este dia até hoje. Lamento não ter renunciado nesse momento”.

Perguntei ao coronel Wilkerson o que ele pensa de grupos como o Centro pelos Direitos Constitucionais e do advogado e blogueiro Glenn Greenwald que pediram o julgamento de Cheney, Rumsfeld e outros funcionários do governo Bush. Ele me respondeu: “Estaria pronto a testemunhar, e estaria disposto a enfrentar qualquer castigo que mereça”.

O coronel Wilkerson disse sobre o livro de Cheney: “É um livro escrito sem medo. Sem medo de que, algum dia, alguém faça de Dick Cheney um Pinochet”. O coronel Wilkerson se refere ao caso do ditador chileno Augusto Pinochet, que foi preso na Inglaterra e detido durante um ano antes de ser liberado. Um juiz espanhol queria que o extraditassem para julgá-lo por crimes contra a humanidade.

A poucos dias do décimo aniversário do 11 de setembro e enquanto aumentam as vítimas em todos os lugares, os livros de Rumsfeld e Cheney nos lembram uma vez mais qual é a primeira vítima da guerra: a verdade.

(*) Amy Goodman é apresentadora de Democracy Now! um noticiário internacional diário, nos EUA, de uma hora de duração que emite para mais de 550 emissoras de rádio e televisão em inglês e em 200 emissoras em Espanhol. Em 2008 foi distinguida com o "Right Livelihood Award" também conhecido como o "Premio Nobel Alternativo", outorgado no Parlamento Sueco em Dezembro.

(*) Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desse artigo.

Tradução: Katarina Peixoto

1 comentário:

Anónimo disse...

Nos Estados Unidos há muitas lamentações, poucas convicções e ainda menos decisões!

O lugar desses dois é no Tribunal Penal Internacional e as famílias dos que morreram por causa das suas mentiras, norte americanos, iraquianos e outros, deveriam ser seus acusadores!

O que faz com que essas famílias não se movam nesse sentido? Quem as inibe? Como as inibe? Por quê existe essa inibição?

Quem detém esses criminosos?

Por que julgam africanos e não de outras nacionalidades?

A cosmética da democracia não passa dum passo de mágica dos poderosos!

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