ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA
O ex-presidente do PSD, Luís Marques Mendes, defende que ex-governantes socialistas do Executivo de José Sócrates, agora deputados, deviam estar a ser julgados pela "gestão danosa de orçamentos" e pelo "caminho de ligeireza e irresponsabilidade".
Concordo. A retroactividade deveria ser imposta e levada até às últimas consequências. Não digo que se vá até ao D. Afonso Henriques. Mas poderia, certamente, ir até aquele cavalheiro que foi primeiro-ministro de 6 de Novembro de 1985 a 28 de Outubro de 1995, presidente da República eleito em 22 de Janeiro de 2006 e reeleito em 23 de Janeiro de 2011.
É que nestas coisas, que obviamente não se aplicam ao reino lusitano, ou há moralidade ou comem todos.
Marques Mendes defendeu, sem apontar nomes, que "muitos ex-governantes com ares sorridentes no Parlamento deviam estar a ser julgados", já que "não chega a responsabilização política" para situações como a "gestão danosa de orçamentos".
Tem razão. Mas a gestão danosa da “coisa” pública só se aplicará aos socialistas? Na bancada mais ao lado, a do PPD/PSD, não haverá tantos telhados de vidro como na do PS? É que, desde o 25 de Abril de 1974, têm sido estes dois partidos a governar (melhor seria dizer a governar-se) o país e a usufruir a seu belo prazer dos despojos dos derrotados, no caso o Povo português.
De acordo com Marques Mendes, ex-membros do Governo de Sócrates deviam ter "vergonha" pelo "caminho de ligeireza e irresponsabilidade" que, a seu ver, levou o País à recessão.
Em matéria de falta de vergonha Portugal está nos primeiros lugares do ranking mundial. E, se calhar, o PS e o PSD estão empatados. Mas a estratégia de Marques Mendes é funcional. Ataca para evitar ser atacado. Não creio, contudo, que resulte.
"Pedimos a ajuda externa quando estávamos no limite, em condições em que já não tínhamos espaço de manobra", sustentou Marques Mendes, certamente anestesiado pela congénita enfermidade que só permite ver num sentido.
Sentido esse que o inibe de se lembrar de quem disse que os políticos "recebem porcaria de volta dos cidadãos quando se lhes dirigem com falta de respeito e com promessas não cumpridas".
Quererá Marques Mendes levar a julgamento também aquele político que afirmou: "Se lhes transmitirmos credibilidade os portugueses compreendem, se lhes falarmos sem verdade e com falta de respeito, eles compreendem que estamos a ser batoteiros e em Portugal já temos um Estado batoteiro"?
Ou o que disse que "não interessa chegar ao poder apenas pelo poder, mas sim indicar ao eleitorado o que se vai fazer, dentro de paradigmas satisfatórios e cumprir", considerando ser necessário "cultivar o gosto pelas novas soluções"?
Ou, ainda, aquele que exigiu na negociação para viabilizar o Orçamento para 2011 que não houvesse aumento de impostos? Ou aquele que exigiu igualmente que “toda a diminuição da despesa fosse feita para que o país pudesse proceder à consolidação das contas públicas”? Ou o que disse que mexer no subsídio de férias ou no subsídio de Natal seria um autêntico disparate?
Não. Esse não quer Marques Mendes levar a julgamento. Não só porque é do seu partido, mas porque se chama Pedro Passos Coelho e é primeiro-ministro.
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado
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