Uma vergonha para a democracia
Tavares Lopes é discriminado por ser opositor do Governo e dirigente sindical
José João Tavares Lopes subiu a pulso na sua profissão, estudou e adquiriu qualificações que o transformaram num dos quadros mais habilitados da Imprensa Nacional. Porém, a sua progressão na carreira é prejudicada pelas convicções políticas e sindicais
Praia, 2 de Dezembro 2011 – Apesar de a democracia já levar trinta anos de vida, em Cabo Verde há pessoas que ainda continuam a ser discriminadas pelas suas convicções ou empenhamentos cívicos. Que o diga José João Tavares Lopes, um quadro superior da Imprensa Nacional de Cabo Verde, SA (INCV) que, desde há anos, apesar de reconhecida a sua competência profissional, tem vindo a ser preterido na evolução da carreira.
José Tavares Lopes é um “histórico” da empresa, onde labuta desde 1977. Começou por baixo e hoje, seguramente, deve ser dos que melhor conhece os cantos à casa. Quando ali chegou, tinha como habilitações o 2º ano do ciclo preparatório, porém, com uma vontade indomável de prosseguir ganhando cada vez mais conhecimentos e qualificação, nesse mesmo ano concluiu aquele que, então, se chamava o “Ano Zero”, na área económico-social. Começou por praticante e passou a auxiliar de depósitos, dois anos depois (1979). Não se furtando aos concursos públicos, em 1989 já era 3º oficial, ascendendo depois a oficial principal, mediante um outro concurso, desta feita interno.
Mas não se ficou por aqui, resultante do seu empenhamento académico, em 2003 já era técnico bacharel, por imposição de um concurso interno onde conseguiu a classificação de 15 valores, uma média considerada elevada, tendo em conta a tabela classificativa que vai de zero a 20. Já com licenciatura, dois anos depois, em 2005, torna-se licenciado de nível 1, classificando-se com 18 valores num outro concurso interno.
A sua ascensão na empresa, levou-o já a desempenhar vários cargos de responsabilidade: chefe de armazém e gestão de stocks, de 1993 a 1996; chefe de secção administrativa, de 1996 a 2002; e director de serviço, nível III, de 2002 a 2009.
No entanto, por se considerar ainda preterido na sua intenção de progredir na carreira, remete, em 17 de Maio último, um requerimento ao presidente do Conselho de Administração (PCA) da INC onde, alegando determinação legal que lhe é favorável, solicita a sua progressão de carreira para o grau C, a ter efeitos a partir de 22 de Julho deste ano, mas não tendo merecido qualquer resposta. Mais, no referido requerimento, José Tavares Lopes, fundamenta-se ainda no “artigo 16.º alínea a), conjugado com o artigo 17.º do PCCS da Imprensa Nacional de Cabo Verde (mais de 6 anos na categoria)” para requerer a sua passagem para o nível 11, pretensão que não mereceu também qualquer resposta.
É o próprio que desabafa a Liberal, ao referir que “a minha indignação é a de que estando convicto de que podendo não ser o melhor trabalhador da Imprensa Nacional, também não sou o prior, e assim sendo considero uma discriminação e humilhação a não resposta ao requerimento de 17 de Maio de 2011, visto que, com toda humildade, em toda a história da Imprensa Nacional que completou 169 anos no passado dia 24 de Agosto, sou o seu primeiro quadro superior sem licenciatura e com licenciatura”. “ Julgo não merecer esse tratamento jamais tido nos meus 34 anos e 7 meses naquela que considero a minha segunda casa”, diz-nos ainda José Tavares Lopes.
CONVICÇÕES POLÍTICAS E SINDICAIS PENALIZADAS
Militante do principal partido da oposição e sindicalista no Sindicato de Indústria Geral, Alimentação, Construção Civil, Serviços, Agricultura e Afins (SIACASA), estrutura filiada na Confederação Cabo-verdiana de Sindicatos Livres (CCSL), as suas convicções parecem estar na origem deste caso, conforme o próprio Tavares Lopes nos refere: “tenho duas convicções que não são bem vistas pelo actual PCA: militante assumido do MpD e sócio do SIACSA, e sou também membro da Concelho Executivo da CCSL. Mas, para dizer a verdade, deduzo que a preterição é por ser sindicalista, ou então as duas coisas”…
Mas o facto não deixa de causar estranheza ao nosso interlocutor, porquanto “quando em Maio de 2005 o actual PCA começou a exercer as funções na INCV, ele disse-me que tinha a informação de quem eram os militantes do MpD, mas que no exercício das funções não discriminaria ninguém pelas suas convicções políticas”, o que de facto veio a acontecer, porém – e é ainda Tavares Lopes que o afirma -, “a partir da altura em que, com a passagem da INCV a empresa, me inscrevi no SIACSA e passei às lides sindicais, denotei a diferença”… É que o próprio PCA lhe disse expressamente que “teria de escolher entre o exercício das funções de chefe de secção e a actividade sindical”…
Tavares Lopes seguiu o conselho do seu superior hierárquico e abandonou as actividades sindicais, o que, mesmo assim, não impediu que o PCA lhe tenha dado “por findo o exercício das funções de chefe da secção de Contabilidade, isto em Fevereiro de 2009, pelo que voltei novamente às actividades sindicais”. Mas a alegada incompatibilidade só se aplica a alguns, nomeadamente àqueles que se regem por convicções diferentes da “situação”, segundo as próprias palavras do sindicalista: “essa incompatibilidade é só para os sindicatos filiados na CCSL. Basta ver que o lider sindical do SIHTUR, na empresa, filiado na UNTCS, é chefe da secção de Expedição e Vendas desde 2004”.
A atitude do PCA da empresa não deixa, porém, de ser contraditória, na medida em que “ainda no passado dia 25 de Abril, num encontro em que estava presente o senhor director Administrativo-Financeiro e de Pessoal - meu superior hierárquico imediato -, e mais um colega da área elogiou, mais uma vez o meu desempenho”. É que, já antes, numa reunião de concertação social, o administrador havia feito referências elogiosas às capacidades profissionais do nosso interlocutor, na presença de um representante da Direcção Geral do Trabalho (DGT) …
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