domingo, 11 de dezembro de 2011

É tal o nível da democracia que as eleições de 2012 em Angola não carecem de observadores




ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA*

O melhor é a Europa fazer já um relatório sobre as eleições de 2012 e mandá-lo, a tempo e horas, para ser aprovado pelo MPLA. É que as verdades em Angola têm prazo de validade e, se ultrapassado, constituem crime contra a segurança do Estado.

Recordam-se, por exemplo, que o então presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), Caetano de Sousa, considerou que as observações feitas pela União Europeia em relação às eleições legislativas de 2008 eram extemporâneas?

E eram extemporâneas apenas porque, segundo ele, não foram divulgadas logo após o pleito de 5 de Setembro.

Não esteve mal e poderá ser um precedente útil, ou um aviso, para quem em 2012 ousar meter-se com um regime que estáno poder desde 1975 e tem um presidente, não eleito, há 32 anos no poder.

Em declarações à Voz da América, Caetano de Sousa considerou na altura que as posições expressas no relatório final da Missão de Observação da União Europeia não deviam sequer ser feitas nesta altura.

Eu digo mais. Nem nesta altura nem nunca. Aliás, a União Europeia nem sequer deveria ter mandado uma missão de observadores ao mais democrático e transparente Estado de Direito do mundo, Angola.

É que para fazerem figuras de urso ou de palhaço, os observadores europeus bem poderiam continuar a actuar em exclusivo no circo europeu. Que, ao menos, tenha servido de lição para 2012.

O relatório então apresentado em Luanda pela chefe da Missão de Observação da União Europeia, Luísa Morgantini, denunciou falhas, irregularidades, fraudes e quejandos no desempenho da CNE no que toca à imparcialidade na tomada de decisões, assim como na garantia de transparência durante o acto eleitoral.

“Para nós não nos oferece comentários se não os que já foram feitos anteriormente. O relatório já está fora de prazo, isto devia ser apresentado logo a seguir à finalização e apresentação do escrutínio. Os comentários posteriores a isto já não os comentamos, porquanto achamos ultrapassados”, explicou Caetano de Sousa, certamente num improviso decorado a partir da ordem do soba maior.

Mas para a Missão de Observação da União Europeia foi muito bem feito. Ousaram, embora timidamente, “cuspir” no prato em que o MPLA lhes deu comida e por isso foram tratados como não se tratam os vira latas. Só por isso valeu a pena Caetano de Sousa reproduzir as ordens do dono do reino.

Recorde-se que o relatório referia-se a um leque de anomalias registadas durante a votação, desde a notória falta de acesso dos representantes dos partidos políticos ao centro de apuramento central, à não acreditação de um número significativo de observadores domésticos do maior grupo de observadores na capital.

Interessante foi ver que, mesmo obrigados a comer e a calar, os observadores europeus não deixarem de verificar que, por exemplo, uma província “apresentou uma participação eleitoral de 108%” e que “não foram utilizados os cadernos eleitorais para a verificação dos eleitores no dia das eleições e como tal, não houve mais salvaguarda contra os votos múltiplos além da tinta indelével, e nenhum meio para confirmar as inesperadamente elevadas taxas de participação eleitoral”.

Mas como só o disseram dias depois… são umas verdades que não contam porque passou o prazo de validade.

A Missão de Observação da União Europeia dizia ainda que “houve falta de transparência no apuramento dos resultados eleitorais”, “que não foi autorizada a presença de representantes dos partidos políticos nem de observadores para testemunhar a introdução dos resultados no sistema informático nacional e não foi realizado um apuramento manual em separado”, para além de “não terem sido publicados os resultados desagregados por mesa de voto e como tal não foi possível a verificação dos resultados”.

Também Ana Gomes, eurodeputada socialista portuguesa que integrou a missão da União europeia, disse que eram “legítimas as dúvidas que foram levantadas por partidos políticos e organizações da sociedade civil sobre a votação em Luanda”, ou que “posso apenas dizer que a desorganização foi bem organizada”.

Mas Ana Gomes foi mais longe: “À última da hora, foram credenciados 500 observadores por organizações que se sabe serem muito próximas do MPLA e parece que alguém não quis que as eleições fossem observadas por pessoas independentes”.

Ou, “as eleições em Luanda decorreram sem a presença de cadernos eleitorais nas assembleias de voto e isso não pode ser apenas desorganização...”

Enfim. Como são verdades que não contam porque passou o prazo de validade, o melhor é fazer já um relatório sobre as eleições de 2012 e mandá-lo, a tempo e horas, para ser aprovado pelo MPLA.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor, compilado em Página Global: SAMAKUVA CORTA AS ASAS AO GALO NEGRO?

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