domingo, 17 de julho de 2011

Brasil: A URGÊNCIA DE CONTROLE DE CAPITAIS EXTERNOS





A turminha das finanças continua enchendo os tubos de dinheiro fácil, graças à política de juros altos e câmbio valorizado patrocinada pelas autoridades econômicas. O Brasil parece ir cada vez mais direto, feliz e contente, no rumo da desindustralização.

Ultimamente, a realidade tem dado uma verdadeira chacoalhada nos dogmas da ortodoxia monetária e econômica. A recentíssima tempestade na chamada “zona do euro”, em que a Itália foi elevada à bola da vez dos responsáveis pela especulação das finanças no plano internacional. E os integrantes da Comissão Européia começam a considerar também a adoção medidas de controle de capital, além das já conhecidas práticas de ajuda aos bancos e instituições financeiras.

No nosso Brasil, os dados com gastos no exterior nos últimos meses têm revelado um salto preocupante – em maio subiram quase 50% em relação ao ano passado. Por essa e por outras, o quadro das contas do nosso setor externo dão sinais de intranqüilidade. Afinal, com o real assim tão valorizado frente ao dólar norte-americano e às demais moedas internacionais, a situação fica típica de um mundo de fantasia ou de uma conjuntura periclitante – a escolha fica por conta do freguês. A taxa de câmbio atual remonta aos valores de 1999! A classe média se esbalda em viagens ao exterior como nunca antes. As classes de menor renda se incorporam às fileiras dos que se empanturram na qualidade duvidosa dos produtos “made in China”. Até mesmo algumas lideranças sindicais dos metalúrgicos se vêem compelidas a saírem do estado de letargia e denunciam o crescimento recorde da importação de veículos, com participação de 23% no total das vendas. E enquanto isso, a turminha das finanças continua enchendo os tubos de dinheiro fácil, graças à política de juros altos e câmbio valorizado patrocinada pelas autoridades econômicas. O Brasil parece ir cada vez mais direto, feliz e contente, no rumo da desindustralização.

Porém, ao que tudo indica, a questão do controle de capitais vai sendo cada vez mais debatida e os preconceitos tendem a ser menos efetivos para a sua aceitação. Desde documentos oficiais do Fundo Monetário Internacional (FMI) até economistas brasileiros de renome, passando por integrantes da equipe do próprio Ministério da Fazenda, muitos já falam mais aberta e tranqüilamente a respeito da necessidade de implantarmos mecanismos de controle desse tipo de recurso em nosso País.

O ponto a reter a partir de agora é relativo às formas possíveis para alcançar tal objetivo, bem como à intensidade do controle a ser estabelecido. Afinal, todos se recordam de que o Ministério da Fazenda chegou a anunciar e publicar há poucos meses uma medida nesse sentido. Antes mesmo da posse da nova Presidenta da República, o problema da contínua valorização cambial de nossa moeda já dava muitos sinais de preocupação. Assim, os responsáveis pela área econômica se viram constrangidos a anunciar a adoção de tributos para o capital estrangeiro, que para cá se dirigisse com fins meramente especulativos.

Foi estabelecida a incidência de Imposto de Renda (IR) - até então isento - e foi introduzido o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as aplicações supostamente de natureza especulativa, sem vínculo com qualquer operação produtiva e sem prazo para voltar ao seu porto de origem. No entanto, uma das dificuldades é que tais medidas iam contra tudo aquilo que os preceitos estabelecidos pelo próprio neoliberalismo haviam preconizado até então. E os agentes encarregados de preparar as decisões normativas, até anteontem, consideravam tais alternativas como uma verdadeira heresia contra o funcionamento do suposto “livre mercado”. Esses indivíduos reagiam aqui exatamente como o fizeram Alan Greenspan e tantos outros ocupantes de postos-chave na área econômica nos Estados Unidos, à época em que os primeiros críticos sugeriam o estabelecimento de medidas de regulação para os produtos financeiros inovadores e especulativos, do tipo “derivativos” e similares. Em nome do espírito liberal, nada foi feito por lá. A crise que veio logo a seguir, em 2008, evidenciou a irresponsabilidade de tal conivência passiva com a especulação!

Em nossas terras, o resultado foi, prá variar, o surgimento de um grande medo por parte dos responsáveis pelo governo em adotar tais medidas. Aquele conhecido temor em contrariar os interesses do capital financeiro, comportamento esse que tem imobilizado há décadas toda e qualquer ação pública que viesse a romper com essa lógica e passasse a privilegiar o setor produtivo e os agentes nacionais. As conseqüências foram pífias. Apesar do anúncio em grande pompa, os operadores do mercado financeiro praticamente ignoraram a medida e continuaram seu trabalho tranqüilos e felizes. Afinal, tratava-se de um IOF de apenas 2% para quem aplicasse na Bolsa de Valores e de 6% para quem aplicasse em outros títulos do mercado financeiro. O fluxo de ingressos estrangeiros continuou na mesma toada.

Assim, as entradas de capital especulativo seguiram seu ritmo sem nenhum constrangimento. E isso deu-se por várias razões. A mais importante delas, sem sombra de dúvida, refere-se ao abissal diferencial da taxa de juros oferecida pelo nosso generoso Banco Central, em comparação às demais autoridades econômicas do mundo. Como a nossa SELIC continua sendo catastroficamente mais elevada do que todas as outras taxas do mundo, os operadores do mercado financeiro incluíram a reduzida alíquota sugerida em seus cálculos e perceberam que a rentabilidade continuava bem mais elevada do que alhures. “No problem!”, é óbvio. E vamo-que-vamo! Além de continuarem a inundar nossas praças com recursos externos e abocanhar os vultosos ganhos financeiros, ainda aproveitavam a deixa para tirar uma casquinha pela grande imprensa e desqualificar as tímidas propostas de regulação. Afinal, diziam, estaria provado que não funciona mesmo!

Mas não se diga que foi por falta de alerta. O fato é que o governo deveria ter, desde o início, adotado alíquotas mais altas para tais impostos, para que no cálculo do retorno financeiro, o operador especulativo pensasse bem antes de enviar o recurso para cá. Isso porque é necessário que se diga com todas as letras: esse tipo de aplicação não é bem vinda! Esse tipo de recurso externo não nos aporta nenhum tipo de benefício, antes pelo contrário. Ele entra na esfera especulativa, pressiona a taxa de câmbio em um movimento de valorização do nosso real e suga recursos orçamentários destinados a pagar juros pelo serviço da dívida pública.

Geração de emprego aqui dentro? Geração de investimento produtivo interno para aumentar o nosso Produto Interno? Nada, nem de longe. Assim, não devemos nos preocupar se eles se interessaem mais por outros ganhos alhures. Boa sorte nos próximos cassinos, my boys! Aqui, queremos investimento direto, empreendimentos visíveis, intervenções que contribuam para o desenvolvimento social e econômico de nosso País.

E um dos aspectos mais graves é que o especulador introduz um perigoso elemento de instabilidade econômico-financeira. Sim, exatamente pela recusa de nossas autoridades em estabelecer algum tipo de controle sobre as entradas e saídas desse tipo de fluxo de capital. É bastante conhecido aquilo que o “economês” chama de “efeito manada” no movimento de capitais, em especial o especulativo. Em algumas circunstâncias de incerteza, bastam algumas informações e ações coordenadas do tipo “salve-se quem puder” para que a economia do país considerado fique absolutamente refém desse tipo de descontrole. Os capitais saem como entraram – e, às vezes, até mais rapidamente – provocando toda sorte de dano no equilíbrio macroeconômico.

Essa é uma das principais razões para que se adotem medidas, além da tributação acima mencionada, de controle administrativo da entrada e saída dos recursos externos. Os capitais que desejarem vir para cá deverão manifestar a pré-disposição de permanecer um tempo mínimo nas praças financeiras brasileiras. E a remuneração será proporcional ao tempo da aplicação, como acontece em qualquer país. Ou seja, a prazos menores deverá corresponder remuneração mais baixa. Para prazos mais longos, as taxas poderão ser mais elevadas. Regras essas, aliás, que vigem em qualquer mercado financeiro dos próprios países industrializados.

Por outro lado, isso significa também que devemos dosar bem as comemorações de alta de nossa cotação pelas agências internacionais de “rating”. Ao invés de elevar a SELIC, como gosta de fazer o BC, esses momentos deveram sim é servir para reduzi-la! Afinal, se o Brasil está sendo bem visto, que o seja pela sua perspectiva de retorno futuro e não pela taxa de juros de curtíssimo prazo. Ou alguém tem alguma ilusão de que realmente as aplicações em títulos do governo norte-americano sejam menos seguras do que as do governo brasileiro? Talvez fosse aconselhável refletir um pouco melhor, antes de bater de forma tão ufanista no peito...

Afinal, trata-se de agências privadas e com elevado grau de promiscuidade com as instituições que operam no mercado financeiro. As mesmas Standard & Poors, Merril Lynch, Goldman & Sachs e tantas outras que, até às vésperas da eclosão da crise de 2008, conferiam solidez e davam as notas mais elevadas para os bancos, seguradoras e demais instituições que passaram a quebrar em seqüência no mercado financeiro.

Para o Brasil, o caminho que apresenta menos risco é, portanto, o da implementação de mecanismos de controle de capitais. Por um lado, elevando as alíquotas do IOF e do IR, de maneira a tornar as ações especulativas menos atraentes. Por outro lado, por meio da adoção de controle de prazos de permanência para tais recursos. E tudo isso, obviamente, acompanhado de medidas que impeçam a fraude, tal como já foi detectado pelos próprios operadores no mercado financeiro. O sujeito cria uma empresa laranja para supostamente fazer investimentos produtivos no Brasil. Traz recursos como se fosse para esse fim, obtém todos os benefícios de tal operação e depois sai tranqüilamente tendo atuado apenas na área da especulação financeira, como se nada tivesse acontecido. O Banco Central e demais órgãos públicos têm todos os meios de evitar esse tipo de ação criminosa.

O que parece faltar é a coragem política de fazer valer a vontade nacional e a compreensão de que, para tanto, será necessário algum tipo de enfrentamento com os interesses do capital financeiro. Seja por contrariar os agentes operando pelo resto mundo, ou aqueles que atuam internamente no País e estão muito satisfeitos com a política monetária praticada até agora. Afinal, com a mudança que a maioria deseja, seus rendimentos deverão cair substancialmente e a farra será menos atrativa. Todo o restante do País, porém, será bastante agradecido!

*Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Brasil: DIVISÃO DO PARÁ - A VANTAGEM DE TAPAJÓS




Embora pesquisas sejam imprecisas e pouco confiáveis, parece haver sensação de que é legítima a causa dos que defendem novo Estado, com capital em Santarém

Lúcio Flávio Pinto na Agência AditalOutras Palavras

Se a pesquisa Vox Populi estiver correta, a redivisão do Estado do Pará ainda é um tema em aberto. Apenas 42% são contrários à divisão territorial para a criação de dois novos Estados, de Carajás e Tapajós, enquanto 37% dizem que votarão a favor dessa mudança no plebiscito de 11 de dezembro. Como a margem de erro da pesquisa é de 2,8% para cima ou para baixo, na hipótese mais pessimista para os que querem deixar tudo como está, os emancipacionistas ganhariam a votação.

Mas 22% dos entrevistados pelo Vox Populi disseram que ainda não têm opinião formada. Essa grande margem de indecisos abre perspectivas para o trabalho de convencimento através do marketing e outras formas de influenciar a opinião pública pelos próximos cinco meses.

Se dependesse apenas da capital, não haveria qualquer dúvida: o Pará continuaria com seus 1,2 milhão de quilômetros atuais, como a segunda maior unidade federativa brasileira. Em Belém, 67% do eleitorado seriam contrários à redivisão. O que indicaria outra característica importante da situação atual: o interior poderia decidir a sorte do plebiscito.

Os números causaram surpresas. Exigem outra pesquisa para checagem. O jornalista Paulo Bemerguy se referiu no seu blog a uma pesquisa do Ibope encomendada pelo governo, com resultados mais próximos do que é a presunção geral, inclusive entre os que levantam as bandeiras dos dois novos Estados: de que a rejeição é maior do que a registrada pelo Vox Populi. Mas Bemerguy não pôde apresentar resultados concretos da sondagem do Ibope, guardada pelos que a encomendaram.

Não se sabe também se é possível acessar a íntegra do trabalho do Vox Populi. A edição de O Liberal do dia 3, que divulgou a pesquisa, por encomenda do jornal, não diz que ela foi registrada no TRE (Tribunal Regional Eleitoral), conforme a exigência legal para sua divulgação. Certo ceticismo quanto à fidelidade da aferição tem seu fundamento em outro resultado das entrevistas realizadas pelo Vox Populi entre 18 e 22 de junho, junto a 1.200 pessoas, em Belém e 58 municípios do interior, dos 143 que o Pará possui (a relação dos municípios também não foi divulgada, assim como o peso relativo de cada um).

De acordo com Vox Populi, 45% dos leitores de jornal no Pará lêem O Liberal, enquanto apenas 28% preferem O Liberal e 10% fazem sua opção pelo Amazônia, o segundo jornal diário dos Maioranas. Os dados do IVC (Instituto Verificador de Circulação) dizem o contrário: que o líder do mercado é o Diário do Pará. O IVC é uma fonte muito mais confiável e aceita sobre circulação real de jornais do que o Vox Populi ou qualquer outro instituto de pesquisa. Logo, o resultado não merece crédito, por estar em contradição radical com as auditagens do IVC. O grupo Liberal se desligou do instituto depois que suas fraudes nos dados sobre circulação foram constatadas. Hoje, os jornais da empresa não têm verificação regular de sua circulação.

A pesquisa sobre a redivisão pode ter sofrido algum tipo de manipulação, como parece provável ter acontecido na apuração da circulação dos jornais e na medição do índice de credibilidade das três publicações diárias que circulam em Belém? É possível. Admitindo-se, contudo, que neste particular a pesquisa retrate a realidade (embora causando surpresa aos observadores da questão), pode-se intuir que a emancipação do Tapajós parece mais viável do que a de Carajás.

Infelizmente, por um erro metodológico clamoroso, o Vox Populi submeteu aos entrevistados uma questão genérica e imprecisa. Perguntou se, em caso de plebiscito, o eleitor era favorável ou contra “a divisão do Pará em três estados”. A cédula eleitoral, entretanto, individualizará as opções por Carajás e Tapajós. O eleitor votará duas vezes, não sendo obrigado, se for favorável a uma nova configuração territorial do Pará, a atrelar Tapajós a Carajás.

Esse detalhe importantíssimo talvez explique por que, de imediato, os defensores do Tapajós anunciaram que não iriam recorrer da decisão do Tribunal Superior Eleitoral de consultar toda a população do Pará e não apenas a que reside nas duas regiões propostas para emancipação. Os tapajônicos devem ter percebido que há uma simpatia maior por sua causa do que pela de Carajás, tanto em Belém como nas áreas que remanesceriam da redivisão como paraenses.

Essa parte do Pará tem mais afinidades com o Tapajós do que com Carajás. Não só porque nela estão instaladas muitas famílias oriundas do Baixo-Amazonas, que continuam fiéis à bandeira do novo Estado, como porque a causa, defendida há mais de um século, parece mais justa e natural, com fundamento mais forte na posição geográfica de Santarém, que já foi a terceira maior cidade da Amazônia, imprensada a meio caminho entre Belém e Manaus.

O Tapajós é constituído majoritariamente por paraenses de gerações ou imigrantes que se enraizaram na região, enquanto em Carajás a dominância é de imigrantes de outros Estados, sobretudo do vizinho (mas rival) Maranhão, com uma tendência (real ou atribuída) de se apossar de recursos naturais que seriam usurpados do Pará, justamente quando começam a render mais aos nativos.

É de se prever que se os defensores de Carajás prosseguirem na luta judicial contra o plebiscito em todo Pará, a campanha emancipacionista, que vinha sendo conduzida em conjunto, perca essa unidade. É provável que Tapajós comece a se diferenciar e se distanciar de Carajás. Assim procedendo na perspectiva de que, se o plebiscito trouxer mudanças, dele saiam dois Estados e não três.

Leia também:

ONU entrega ajuda em região controlada por rebeldes e atingida pela seca na Somália




LUSA

Nairobi, 17 jul (Lusa) - A ONU fez esta semana uma primeira entrega de ajuda alimentar e medicamentos a uma zona sob controlo rebelde na Somália, onde se vive uma situação de fome devido à seca, anunciou hoje a organização.

Cinco toneladas de ajuda foram transportadas de avião a 13 de julho para a região de Baidoa, no centro da Somália, depois de os rebeldes terem autorizado a ação das agências humanitárias, indicou Iman Morooka, porta-voz da UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) na Somália.

A operação foi "bem sucedida e trata-se de uma primeira etapa para fornecer por via aérea a ajuda necessária na Somália. Esta foi a primeira iniciativa do género em dois anos", afirmou a mesma porta-voz.

Os 'shebab' (rebeldes islamitas) "deram o seu acordo e autorizaram o acesso sem problemas. Tudo correu bem", explicou.

São Tomé: Bê-à-bá da democracia em escola primária, com contagem de votos em voz alta




Eduardo Lobão (texto) e José Coelho (foto), enviados da Agência Lusa

São Tomé, 17 jul (Lusa) - Do lado da rua, a cada leitura do boletim de voto, alguém grita o nome do candidato e outro alguém junta mais um risquinho num caderno: estamos na Escola Primária Atanásio Gomes, no bairro de Ponte Graça, na capital são-tomense.

Estamos numa escola mas não é dia de aulas: é dia de aprendizagem do exercício da democracia, com a leitura do resultado da votação dos 372 eleitores inscritos na assembleia de voto 14 A, do círculo eleitoral de Água Grande.

É que hoje foi dia de eleições presidenciais em São Tomé e Príncipe, e oito homens e duas mulheres concorreram à sucessão do presidente cessante Fradique de Menezes, impedido de se candidatar a um terceiro mandato de cinco anos.

Voltamos à sala de aula.

O presidente da assembleia de voto desdobra o boletim de voto e diz qual o candidato que recebeu a confiança do eleitor ou se o boletim foi anulado ou está em branco.

Sentados nas carteiras, em vez de alunos, estão os delegados das candidaturas.

A cada nome lido em voz alta também do lado de fora da sala, virado para cerca de uma dezena de eleitores, alguém repete e o voto é inscrito num caderno.

Se alguém perde a conta e pergunta em voz alta qual foi a indicação vinda do interior, logo lhe é ordenado que se cale: "Deixa ouvir. No final vês", respondem-lhe.
Voltamos à sala de aula.

A urna ainda está gorda de boletins. Ainda falta um pouco antes de se saber quem venceu em Ponte Graça.

Embora ainda faltem uns meses para se voltar a ouvir de novo o bê-à-bá na Atanásio Gomes - os alunos regressam às aulas na primeira semana de outubro -, mas o tempo das eleições, esse já passou.

EL.

São Tomé - Presidenciais: DELFIM NEVES ALERTA PARA “POSSIBILIDADE DE FRAUDE”




Diário de Notícias - Lusa

São Tomé, 17 jul (Lusa) -- O candidato às presidenciais de hoje em São Tomé e Príncipe, Delfim Neves, alertou hoje, depois de votar, para a "possibilidade de fraude" no escrutínio.

Depois de dizer que aceitaria "qualquer resultado que seja justo, desde que o processo seja transparente e com lisura", Delfim Neves disse que "tudo pode acontecer".

"Na vida tudo pode acontecer. Conhecendo bem o nosso país, eu começo a temer alguma possibilidade de fraude, de compra de consciência. Apenas isso", frisou.

*Foto em Lusa

SOMÁLIA, PLANETA TERRA




Luís F. C. Nagao – Outras Palavras

Diante da pior crise humanitária do século 21, “comunidade internacional” permanece passiva. Globalização ficará restrita às finanças e comércio

Um bilhão e seiscentos milhões de dólares é, aproximadamente, o que o orçamento fiscal dos Estados Unidos destina, a cada 24 horas, a gastos militares. Também chega a 1,6 bilhão de dólares o que Estado brasileiro oferece, todas as semana, aos mercados financeiros, na forma de juros. Por fim, 1,6 bilhão de dólares é o que a ONU reivindica, numa única prestação, para acabar com o drama humanitário na Somália – onde 12 milhões de pessoas sofrem com a seca; veem-se obrigadas a deixar suas terras; vivem, vegetam ou morrem em campos de refugiados superlotados e desumanos. Mas os somalis, ao contrário da indústria de armamentos norte-americana ou do sistema financeiro brasileiro, não fazem lobby, nem têm voz na mídia. Por isso, o padrão de globalização sob o qual vivemos nega-lhes os recursos que não faltam nem ao complexo industrial-militar norte-americano, nem aos banqueiros do Brasil.

Distante dos jornais, a tragédia da Somália foi prevista, desde o final do ano passado, pela HelpAge e outras organizações internacionais. Sua causa aparente é a seca. Há três anos, chove muito pouco no chamado “chifre da África” – a região equatorial localizada no extremo leste do continente, às margens do Mar Vermelho e do Oceano Índico, a um passo da Península Arábica. Etiópia, Djibouti e Eritreia também sofrem com a seca – mas a combalida Somália, onde desde 1991 alternam-se guerras civis e colapso completo do Estado, é a mais atingida.

Seus pouco menos de 10 milhões de habitantes, tradicionalmente nômades e islâmicos em maioria, começaram a mudar para as áreas urbanas apenas no século 20. Organizam-se em clãs patriarcais no país. Cultivam bananas, cana e milho. São pastores, criadores de camelos e pescadores.

Com a seca, o gado está morrendo e muitas famílias estão perdendo tudo. A falta de renda e alta mundial dos preços da comida as deixam sem alternativas. Desesperadas, as famílias são obrigadas a fugir. Os 12 milhões que necessitam de ajuda incluem somalis e seus vizinhos. As taxas de subnutrição chegam a 30% em algumas áreas. Uma em cada três crianças sofre do mal.

Os refugiados que permanecem no país buscam comida e dinheiro. Dirigem-se aos campos de refugiados da capital, Mogadíscio. Muitos rumam ao Quênia e Etiópia. Diariamente, 3 mil somalianos deixam seu país. Procuram Dolo Ado (Etiópia), onde há 110 mil somalianos, e a cidade de Dadaab, no Quênia. Lá, já há três campos: Hagadera, Ifo e Dagahaley. Reúnem 380 mil pessoas – quatro vezes mais do que comportariam.

A precariedade é completa. Os recém-chegados ficam nos arredores e podem ter que esperar até 40 dias para receber os primeiros alimentos. A água é escassa: 3 a 5 litros diários por pessoa, contra um consumo de 150, na Europa. A assistência básica não é garantida pelas ONGs. Há graves casos de má nutrição, diarréias e infecções respiratórias são constantes. As mortes ocorrem em geral por hipotermia e hipoglicemia. Numa noite chegou a haver 40 óbitos.

Do 1,6 bilhão de dólares necessário, segundo as Nações Unidas, para enfrentar o drama, menos da metade foi reunida. Por meio da Usaid, os EUA doarão apenas 19 mil toneladas de comida, migalha equivalente a US$ 21 milhões. O governo brasileiro doou três vezes mais, mas ainda assim poquíssimo. Em 6 de julho, a Comissão Europeia enviou US$ 8 milhões para fundos de emergência.

A pior seca é a de ideias. A mídia, que se interessa crescentemente pelas imagens dos refugiados, não indaga por que se morre de fome no século 21? Se a seca estava prevista, por que ninguém deflagrou uma campanha mundial de apoio aos somalis?

Também em relação às tragédias, parece haver dois pesos e duas medidas. Fukushima, no Japão, teve enorme visibilidade e despertou rapidamente campanhas internacionais. Muito mais graves, os desastre humanitários africanos permanecem esquecidos. É como se implicitamente fosse aceito que essa é a natureza da África.

MAIS:
Vale visitar a série de imagens do New York Times sobre a crise somali.

O SUBMUNDO DO JORNALISMO




ELIAKIM ARAÚJO* – DIRETO DA REDAÇÃO

O escândalo dos grampos telefônicos do jornal londrino News of the World desnuda o submundo do jornalismo sujo e antiético praticado por grandes conglomerados midiáticos e suas ligações com políticos e funcionários dos órgãos de segurança.
   
Desta vez, pegaram Rupert Murdoch (foto), o imperador do reino das comunicações. Dono de empresas jornalísticas tão poderosas que governantes, politicos, esportistas e celebridades rendem (ou rendiam)  homenagens a ele, não por suas virtudes  morais, mas pelo temor de que ele usasse a força de seus jornais e TVs para chantagear e divulgar informações pessoais de suas vítimas.  Como fez com o ex-primeiro-ministro britânico Gordon Brown, cujo filho sofre de fibrose cística, uma informação que a família mantinha em segredo para protegê-lo da curiosidade pública, e que foi covardemente divulgada pelo jornal de Murdoch, graças a uma escuta clandestina.

Os repórteres do tablóide sensacionalista News of the World iam às últimas consequências para conseguirem seu objetivo. Compravam detetives oficiais e particulares, tinham cúmplices dentro da Scotlana Yard, que aliás fica muito mal no episódio porque há muitos anos dormem nas gavetas da repartição denúncias de ilegalidades praticadas pelo jornal de Murdoch, que nunca foram seriamente investigadas.

O escândalo só estourou há alguns dias porque o elitista jornal britânico The Guardian, denunciou a história da menina Milly Dowler, sequestrada e assassinada em 2002, cujo correio de voz em seu celular foi grampeado por um investigador a serviço do jornal de Murdoch, na busca por gravações que pudessem chocar os leitores. Como a caixa postal do celular de Milly estava lotada, deletaram gravações antigas, prejudicando assim as investigações policiais.

A estratégia suja e antiética de conseguir notícias exclusivas pode ferir gravemente a estabilidade do grupo empresarial do magnata  Rupert Murdoch.  Aos 80 anos, o velhinho está em plena forma física.  Os que o conhecem dizem que ele adora esse tipo de jornalismo, que espeta, incomoda e humilha suas vítimas e fazem com que ele seja mais temido. 

Na Grã-Bretanha, agora, ele está mais sujo que pau de galinheiro. Parece que chegou a hora da caça se voltar contra o caçador.  O Parlamento britânico já criou um comitê de investigação que está convocando jornalistas e executivos do jornal News of the World para prestarem depoimento.   Dois dos principais executivos das empresas de Murdoch pediram demissão, uma nítida tentativa de oferecer a cabeça de um ou dois em troca do abafamento da crise.

Empresarialmente, o escândalo foi um desastre para Murdoch. Além de perder o News of the World, o lucrativo tablóide dominical que vivia do sensacionalismo barato das escutas telefônicas, o governo britânico  aprovou a decisão do Parlamento de bloquear uma importante negociação de Murdoch. Por 12 bilhões de dólares, ele assumiria o controle total  da principal emissora por satelite da Grã-Bretanha, a BSkyB, que possui 10 milhões de assinantes.

Mas o inferno astral do velho Murdoch (80 anos) está apenas começando. Há fundadas suspeitas de que o jornalismo sujo praticado por suas empresas em Londres tenha contaminado suas mídias nos Estado Unidos.  Já se sabe que os celulares de familiares de vítimas dos atentados de 11 de setembro de 2001 foram violados. E alguns parlamentares querem saber se  os jornais e a TV de Murdoch nos EUA usavam os mesmos recursos ilícitos para conseguirem informações inéditas ou secretas que pudessem usar contra seus adversários politicos.

O senador Jay Rockfeller, democrata de West Virginia, pediu rigorosa investigação em todas as empresas de Murdoch nos EUA, onde ele é dono do Wall Street Journal, do New York Post  e da poderosa FoxNews, canal de TV assumidamente direitista, republicano e crítico contundente do Partido Democrata e do presidente Obama.  O escândalo dos grampos telefônicos está nas manchetes dos jornais do mundo inteiro, mas a Foxnews  não dá uma linha sobre o episódio.

A conclusão que podemos tirar de tanta baixeza praticada em nome do jornalismo é que devemos estar atentos aos grupos midiáticos brasileiros. Quanto maiores, mais poderosos. Quanto mais poderosos, mais temidos pelos governantes. A concentração de grandes empresas de mídia nas mãos de poucas e suspeitas personalidades coloca em risco a saúde do bom jornalismo.  É isso que devemos denunciar e é contra isso que devemos lutar.

*Ancorou o primeiro canal de notícias em língua portuguesa, a CBS Brasil. Foi âncora dos jornais da Globo, Manchete e do SBT e na Rádio JB foi Coordenador e titular de "O Jornal do Brasil Informa". Mora em Pembroke Pines, perto de Miami. Em parceria com Leila Cordeiro, possui uma produtora de vídeos jornalísticos e institucionais.

Educação: UMA LUTA POR DEMOCRATIZAÇÃO E JUSTIÇA SOCIAL




Jorge Gonzalorena Döll – Rebelión – Carta Maior

O Chile de hoje está longe de ser o país exitoso que nos vendem diariamente. Trata-se, isso sim, de uma sociedade profundamente cindida entre uma reduzida minoria que vive na opulência e uma grande maioria que sobrevive a duras penas com salários baixos ou mesmo miseráveis, permanentemente assediada por um clima de insegurança trabalhista, cheia de dívidas, sem uma adequada cobertura de saúde, em um estado de vulnerabilidade econômica, social e jurídica. O artigo é de Jorge Gonzalorena Döll.

A crise do sistema educacional, que exteriorizou com grande força por meio das demandas e mobilizações estudantis dos últimos meses, é só uma expressão particular de um problema muito mais global e profundo: a extrema desigualdade social atualmente imperante no Chile, da qual se beneficiam impunemente os poderes econômicos nacionais e estrangeiros que controlam e saqueiam o país, e a falta de efetiva representatividade do sistema político vigente.

Como sabemos, a abismal desigualdade social na qual vivemos corresponde a um estado de coisas que, depois da supressão da institucionalidade democrática previamente existente, foi implacavelmente imposto com métodos terroristas sobre o conjunto da população, e que se prolongou depois com a ativa e cínica cumplicidade das cúpulas políticas que, posando de “progressista”, mas avalizando a institucionalidade pseudodemocrática instaurada em 1990, governou o país nas últimas duas décadas.

O Chile de hoje está longe de ser o país exitoso que nos vendem diariamente. Trata-se, isso sim, de uma sociedade profundamente cindida entre uma reduzida minoria que vive na opulência e uma grande maioria que sobrevive a duras penas com salários baixos ou mesmo miseráveis, permanentemente assediada por um clima de insegurança trabalhista, cheia de dívidas, sem uma adequada cobertura de saúde, em um estado de vulnerabilidade econômica, social e jurídica.

Uma sociedade que se encontra, além disso, crescentemente desintegrada pelas realidades práticas que lhe foram impostas, que só abrigam e incentivam a implementação de projetos particulares, e pela repetição de um discurso de um exacerbado individualismo que, complementado com o articulado e persistente trabalho de desinformação e infantilização dos meios televisivos, menospreza e desgasta todo sentido de responsabilidade social.

É esse contexto social que explica a atual crise do sistema educativo, que só opera como um reprodutor da desigualdade. Se, nas últimas décadas, a educação privada ganhou terreno às custas da educação pública, dando origem a um sistema fortemente segregado, isso não ocorreu por supostos méritos da primeira, mas sim porque, deliberadamente, por meio da políticas educacionais implementadas em todos os níveis, impediu-se a segunda de assumir o papel que lhe corresponde.

Por sua parte, o impulso outorgado pelas políticas educativas a esta orientação privatizadora não respondeu a preocupações de caráter propriamente acadêmico. Respondeu, ao contrário, ao desejo de enriquecimento dos grupos socialmente dominantes que buscaram assim alcançar três grandes objetivos: 1) Atomizar a demanda social, debilitando eventuais focos de resistência nos espaços públicos; 2) Abrir novos espaços de negócios; 3) Reduzir substancialmente e tornar fortemente regressiva a carga tributária.

Na verdade, este último é o objetivo principal, do qual se beneficia amplamente o conjunto da classe dominante ao transformar o sistema tributário em um poderoso mecanismo reprodutor da desigualdade. O Chile segue sendo atualmente um dos países que ostentam uma das distribuições de renda mais desiguais em escala mundial. Essa desigualdade se torna ainda maior depois de descontados os impostos. Em outras palavras, os pobres pagam proporcionalmente mais impostos que os ricos no Chile.

Isso explica pelo fato de que três quartas partes da arrecadação tributária corresponde a impostos indiretos, que gravam com uma mesma taxa o consumo das famílias pobres e o das famílias ricas, e somente uma quarta parte correspondem a impostos diretos, que tributam a renda ou o patrimônio das famílias. Além disso, as famílias ricas consomem somente uma parte de sua renda e dispõem de um sem número de mecanismos legais e artimanhas de “engenharia tributária” para rebaixar ou sonegar impostos.

Por outro lado, ao contrário do que alguns sustentam, a carga tributária no Chile é comparativamente baixa, correspondendo a pouco menos de 20% do PIB. Na maior parte dos países europeus, essa carga oscila entre 35% e 50% do PIB. Essa diferença se explica principalmente pela baixa tributação dos setores de renda mais alta e das empresas que no Chile só pagam 17% sobre os seus rendimentos, mas cuja tributação real é muito real e, em muitos casos, inexistente.

A fraseologia neoliberal dos grupos dominantes sobre “o caráter subsidiário do Estado”, sobre a “focalização do gasto social”, a “capacitação individual”, o necessário “autofinanciamento” dos serviços públicos, etc., não é de modo algum desinteressada, mas se orienta para prover, precisamente, a justificação ideológica de políticas que permitam eximir-se de ter que garantir o financiamento de projetos de interesse coletivo centrados na realização do que se pode denominar como o bem comum da sociedade.

Daí sua demonização persistente do papel do Estado, dos projetos coletivos e da própria noção de justiça social que poderia inspirá-los. Daí também sua invocação entusiasmada do pensamento ultra reacionário de um Hayek, cujo darwinismo social o leva a sustentar sem o menor escrúpulo que a ideia de justiça social não tem atualmente “nenhum significado”, que é só uma “fórmula vazia”, um “atavismo” herdado instintivamente das épocas remotas na qual o ser humano vivia em pequenas hordas.

O que a privatização do gasto em educação significa é muito fácil de compreender. Uma família pobre não está em condições de pagar por um bom serviço educativo. Mas ocorre que são, precisamente, seus filhos que, no momento de ingressar no sistema escolar, mais o necessitam, uma vez que, em geral, são portadores de um menor “capital cultural”. Portanto, ao oferecer um serviço empobrecido, a educação pública jamais poderá tornar possível o ideal ético da “igualdade de oportunidades” que dela se espera.

Requer-se então dispor dos recursos necessários para melhorar substancialmente a qualidade da educação pública em todos os seus níveis, recursos que, no marco do atual sistema social, só podem ser obtidos pelos poderes públicos impondo uma contribuição forçada e permanente aos que ganham mais, ou seja, mediante o estabelecimento de um sistema tributário de caráter progressivo. E o mesmo vale para o financiamento de outras partidas do gasto social como ocorre, por exemplo, com a saúde e a habitação.

Mas, justamente por isso, a abismal desigualdade social atualmente imperante é também incompatível com a existência de mecanismos de geração e tomada de decisões de caráter efetivamente democrático. Uma livre expressão da vontade soberana da nação acabaria rapidamente com ela. É por isso que os privilégios de que gozam os poderes econômicos se encontram tão fortemente blindados por um sistema político institucional que foi desenhado ex profeso para burlar e manter na linha a vontade popular.

O certo é que a toda a institucionalidade vigente adoece de um enorme déficit de legitimidade e que, por isso mesmo, nos encontramos atualmente em um impasse entre, por um lado, o regime plutocrático que se escuda nessa institucionalidade e na classe política que se aproveita dela e, por outro, a grande força desencadeada pelo descontentamento e mobilização popular. A luta por uma transformação profundar do sistema educacional revela-se assim como uma grande luta pela justiça social e a democratização do país.

Tradução: Katarina Peixoto

O GUETO DE BOLONHA




ARNALDO NISKIER* - ÁFRICA 21

"Dos 1022 judeus enviados da Itália ao campo de concentração de Auschwitz, somente 17 sobreviveram e regressaram aos seus lares, após o fim da guerra".

Na Itália, quando procurava o caminho para visitar a Universidade de Bolonha, provavelmente a mais antiga do mundo (de 1088), surgiu à minha frente a placa desafiadora: “Museu Hebraico”. Não resisti à tentação e virei à esquerda, como indicava a seta, pra realizar uma comovente visita ao passado daquela região.

Ali existiu a Sinagoga do Gueto de Bolonha. Em 1593, os judeus foram expulsos, deixando para trás experiências vividas desde 1353. Em 1482 vieram à luz publicações como o Livro dos Salmos e Os Princípios da Torá, de larga utilização na comunidade. Há lembranças das atividades exercidas pelos rabinos Samuel Archivolti, Azariá de Rossi, Yakov Mantino e Obadia Sforno. As luzes culturais do Povo de Israel se estendiam às cidades de Ferrara, Modena e Parma.

A ideia do gueto foi retomada após a Lei Racial de 1938, em pleno regime fascista. A Itália assinala a existência de 10 guetos e a história registra a deportação de 83 judeus bolonheses para campos de concentração, na II Guerra Mundial, apesar da resistência da população local, não favorável a essa violência, que incluiu o rabino Alberto Avraham Orvieto. No grupo havia médicos e intelectuais que despertavam a cobiça de outros povos, como era o caso da Inglaterra, ávida pela conquista de cérebros e profissionais privilegiados.

Dos 1022 judeus enviados da Itália ao campo de concentração de Auschwitz, somente 17 sobreviveram e regressaram aos seus lares, após o fim da guerra, como se conta, de forma admirável, no livro “A trégua’”, escrito por Primo Levi, um desses sobreviventes (a tradução para a língua portuguesa foi feita pelo acadêmico Marco Lucchesi).

Voltemos ao Museu Hebraico, muito bem dotado de relíquias de toda natureza, como a Torá em diferentes versões, moedas de época, instrumentos, roupas típicas etc. Chamou nossa atenção a enorme lápide em que se encontram os nomes dos que foram deportados das cidades de Bolonha, Ferrara, Modena, Reggio, Corregio e Parma. Anotamos alguns sobrenomes: Arbib, Cividali, Mortara, Pinto, Rocca, Ventura, Ravena, Tedeschi, Padova, Levi, Melli, Zamorani etc.

Deve-se considerar ainda a assimilação havida, com receio das perseguições. Mas isso não impediu a existência da sinagoga, também conhecida como “a escola de todos”. Ali se desenvolviam atividades de difusão do monoteísmo e a Bíblia tornou-se fundamental elemento de instrução de todos os seus freqüentadores, alimentados por uma forte presença da literatura rabínica, na cidade que por si só, em virtude da Universidade pioneira no mundo, era conhecida como “a douta” (La Dotta). A sinagoga foi bombardeada em 1943 , consequência lamentável da Guerra.

Como se viu, no Museu Hebraico, a identidade em geral pôde ser mantida graças a quatro áreas de interesse: as identidades religiosa, linguística, cultural e política. Os judeus, apesar das conquistas científicas, jamais abriram mão da tradição. A língua hebraica, de uso superior a 3 mil anos, foi elemento cultural da maior importância, permitindo a manutenção da homogeneidade do povo do livro, como se viu em Bolonha.

*Arnaldo Niskier é doutor em Educação, membro da Academia Brasileira de Letras e presidente do CIEE/RJ

MERCADOS LUSÓFONOS SÃO PRIORIDADE DE COOPERAÇÃO DE PORTUGAL





Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação português disse à Rádio ONU que colaboração com ex-colónias traz dividendos para ambas as partes.

Nova York - O novo governo de Portugal deverá continuar a investir nas relações históricas com os outros sete países lusófonos, especialmente na área comercial. A informação foi dada à Rádio ONU, pelo secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Luís Brites Pereira.

Pós-doutorado em Economia e professor licenciado da Universidade Nova de Lisboa, Brites Pereira ajudará a desenhar a estratégia de cooperação internacional de Portugal durante o novo governo.

Na última quarta-feira, o governante discursou no Conselho de Segurança sobre as futuras relações de Portugal com o mais novo país do mundo, o Sudão Sul, logo após a independência da nação africana.

Luís Brites Pereira disse à Rádio ONU que a economia portuguesa está à procura de novos mercados e considerou a parceria com os países lusófonos, feita na mesma língua, como importante para o sucesso da estratégia.

"Nós precisamos exportar mais, precisamos encontrar novos mercados, e seguramente algumas das oportunidades de negócios que vamos ter, vão ser em países de língua portuguesa. Mas essa não é a única preocupação que temos. Em relação aos países em desenvolvimento de língua portuguesa, nós procuramos conjugar as oportunidades de negócio com aquilo que são as necessidades de desenvolvimento. Por isso, o ponto de partida é sempre um diálogo. Sem esse conhecimento não se cria a confiança necessária para poder identificar oportunidades que possam ser partilhadas por ambas as partes, com benefícios também repartidos entre ambas as partes”, afirmou.

Portugal é membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, CPLP. O novo ministro português dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas, inicia no fim deste mês um périplo que o irá levar a Angola e Moçambique. A primeira etapa da sua primeira viagem oficial desde que assumiu o posto será o Brasil.

São Tomé - Presidenciais: PR Fradique de Menezes preferia que não houvesse segunda volta




i Online

O Presidente cessante de São Tomé e Príncipe, Fradique de Menezes, disse hoje depois de votar nas eleições presidenciais, que estão a decorrer, que "todos os são-tomenses gostariam que tudo estivesse resolvido" neste dia.

"Todos os cidadãos são-tomenses gostariam que tudo estivesse resolvido hoje", frisou, depois de salientar que votou como cidadão e não como Presidente da República.

Destacando o prazer com que exerceu o seu "direito de cidadania", Fradique de Menezes, cujo segundo mandato presidencial de cinco anos termina em setembro, disse esperar que a escolha do sucessor seja conhecida nas próximas horas.

EUA, INGLATERRA E AUSTRÁLIA - OS PIRATAS DO SÉCULO XXI





O REGIME DE MATRIZ NEOCOLONIAL E CASTRADOR DA AUSTRÁLIA

Por nada e por tudo não devemos confiar na aparente boa vontade, decência, boa vizinhança e na falsa honestidade dos governos do regime australiano. Como piratas dos mares e oceanos dos tempos das naus patrocinadas pelo reino de Inglaterra, tantos séculos depois, os governos australianos continuam com a mesma mentalidade de assaltar e roubar as soberanias e os bens das nações que “navegam” em seu redor e até em países bem mais distantes mas a quem a anglofonia declara guerras hediondas pelo saque de bens naturais sob os mais variados falsos pretextos. O certo é que ocupam esses países, o certo é que fomentam a desestabilização, o certo é que assassinam civis sob a alegada capa de serem terroristas, o certo é que colhem benefícios enormes sob o falso pretexto de levarem a paz e a democratização. Assim acontece no Iraque, no Afeganistão, nos principais países detentores de enormes jazidas de petróleo ou daquilo que lhes interesse saquear, piratear. Esse é o quadro a que se assiste há séculos no território vizinho de Timor-Leste, antes colónia de Portugal e atualmente independente.

Para os governos da Austrália as palavras cinismo, abordagem, assalto e chacina, dos tempos da pirataria, mantêm-se atuais. Outra coisa não têm feito relativamente a Timor-Leste bem como a muitos dos países que ladeiam a ilha continente “australis” – território dantesco, multifacetado, riquíssimo, bravio, lindo e com imenso por explorar no melhor e mais decente significado do termo daquela palavra, até mesmo com um povo multirracial e que tem bastante de generoso. Como potência da Australásia até parece que os que integram os governos do país e de grandes impérios empresariais continuam a navegar ao sabor do saque, da pirataria, da chacina de naus menores que afinal são pertença reconhecida de outros povos que só querem exercer o seu direito de independência e de propriedade e que não os abordem sob más intenções mas sim com amizade, honestidade, respeito e transparência de cooperação.

Quis a natureza compensar os timorenses com jazidas de petróleo de valor considerável. Ao longo de séculos registaram-se imensas abordagens de piratas em busca das riquezas naturais da pequena meia-ilha. Naus holandesas, inglesas e portuguesas, foram as que mais acostaram e se apoderaram dos bens timorenses ao longo dos séculos. Por mais de quatrocentos anos Portugal conseguiu a posse “ultramarina” do território que é hoje Timor-Leste, até que os EUA, a Austrália e a Indonésia – esta última sob forte influência de um ditador assassino e sem escrúpulos – se apoderaram de todo o território e da vida e morte dos timorenses. O objetivo foi o petróleo do Mar de Timor, mais do que razões geoestratégicas e anticomunistas. Esses pretextos eram os alegados para ocupar, vilipendiar e saquear. Falsos pretextos que deram lugar na atualidade a razões antiterroristas e de implantar a liberdade e democracia. Sendo que o objetivo é o mesmo de há séculos: saquear. Vimos isso mesmo no Iraque, no Afeganistão, no Irão, na Líbia, etc. E vimos isso também em Timor-Leste, ilha mais próxima da Austrália naquela continuidade que é a nação Indonésia, também na agenda e na gula dos saqueadores anglófonos e dos saqueadores da pátria dos cifrões, até para mais por ser de religião muçulmana. A vontade não falta e certamente que o futuro virá a mostrar a Indonésia ocupada sob o pretexto do antiterrorismo como antes pelo alegado anticomunismo, numa febre anglófona pelo petróleo e outras riquezas. Não para já… Mas vontade não falta. É a ansiada abordagem da pirataria às riquezas naturais da Indonésia com Timor-Leste tão ali a jeito e também a servir de excepcional ponte para um imenso arquipélago de milhentas ilhas.

Os governos australianos têm procurado por todos os meios e sob vários pretextos dominar e ocupar Timor-Leste, antes e depois da independência. Em 1975 usaram o ditador Suharto os seus generais assassinos. Em 2006 usaram os seus serviços de inteligência e os da CIA para fomentarem a divisão do novel país entre loromonos e lorosaes – timorenses de oeste e de leste. Tiveram por aliados os bispos e outros clericais da igreja romana timorense, Xanana Gusmão, saqueadores timorenses corruptos e integracionista que ainda hoje prevalecem no governo AMP e nas suas ilhargas, graças a um golpe de estado que derrubou um governo legítimo reconhecido globalmente.

Quis a gula dos governos australianos de Howard, depois de Kevin Rudd e agora de Júlia Gillard desagradar a Xanana Gusmão, por o julgarem um fantoche nas cumplicidades e por tanto quererem apossar-se de tudo que para eles representava saque e consequente lucro. Apesar de aparentemente e na ONU reconhecerem a independência de Timor-Leste, os governos australianos mantiveram e mantêm as suas enormes ambições de continuarem a roubar aquilo que pertence aos timorenses seguindo um modelo adaptado à época em que aliados à Indonésia de Suharto saquearam as riquezas naturais timorenses. Isso tem sido por demais evidente. Têm procurado por todos os meios manterem as suas forças de ocupação, os seus militares, no país. Primeiro ocupando em conluio com Gusmão e Horta, em 2006, e depois usando variadas estratégias, incluindo um projeto da permanência de um centro de refugiados em território leste-timorense – que foi negado e bem. O futuro mostrará aquilo que preconizam usar por estratégia para se manterem a ocupar o país. Também a castração do desenvolvimento timorense tem sido contemplado na estratégia dos neocolonialistas agora chefiados por Júlia Gillard e Kevin Rudd através da face da Woodside e da exploração do petróleo e gás timorense provindo do Greater Sunrise. Aos governos australianos interessa agirem por todos os meios possíveis e impossíveis de forma a não permitir o desenvolvimento timorense no que respeita a serem donos do seu próprio destino, nem como país produtor de petróleo e gás natural. Porque isso fomentará especialização, empregos e tantas outras componentes que contribuirão para o desenvolvimento de Timor e melhor nível de vida do seu povo. Fomentará mais e melhor independência, melhor formação e educação. Mais saúde, melhores habitações e infraestruturas, etc. Isso se os dirigentes eleitos e nas suas ilhargas não enveredarem pela corrupção e roubo continuadamente – como agora acontece.

Pelos vistos os governos australianos mostraram tanto a sua gula e maldade, a sua falsidade, a sua traição, que Xanana Gusmão e até, talvez, o próprio Ramos Horta, tiveram de saber e demonstrar defender os reais interesses timorenses nesse capítulo e manter uma “guerra fria” contra as pretensões dos seus arquitetos, mentores e aliados anteriores no golpe de 2006. Fazendo finca-pé sobre o desembocar do gasoduto e exploração do Greater Sunrise em território terrestre timorense, na Costa Sul do país. Em vez de Darwin, na Austrália.

Foi por isso que vimos neste fim-de-semana passado a visita de Kevin Rudd, agora ministro dos negócios estrangeiros da Austrália, do governo alegadamente trabalhista de Gillard, deslocar-se a Timor-Leste em cerimónia de “peace and love”, num verdadeiro, hipócrita e enorme “beija-mão” ao país que querem continuar a dominar e explorar por todos os meios possíveis e imaginários. A visita de Rudd não tem outro significado. O que se espera é que Gusmão, Horta, as elites timorenses, o próximo presidente da República e próximo governo saídos das eleições em 2012 mantenham a defesa da soberania do país e dos reais interesses que os governos australianos sempre atacaram apoiando invasões assassinas e golpes de estado com o mesmo conteúdo, fomentando o atraso e a miséria que depois dizem combater com “dádivas cooperativas e humanitárias” suportadas pelos milhões de dólares que por décadas criminosamente têm saqueado dos bens naturais timorenses no Mar de Timor, comportando-se como piratas do século XXI, em Timor-Leste como noutras partes do mundo.

Nota: Apesar de não incluídos neste texto, porque no caso seria a despropósito, França e Alemanha – para além de outras pequenas e médias potências militares e económicas – não devem ser ignoradas naquilo que representam atualmente na corrida ao saque nos países produtores de hidrocarbonetos, petróleo, gás natural e outros minerais valiosos doados pela natureza e pertença daqueles que os da pátria do cifrão desestabilizam, ocupam e usam criminosamente através dos modos mais torpes que a humanidade possa avaliar.

*Carlos Tadeu é arquitecto paisagista, ambientalista. Tem por “hobbies” interesses em história, geografia, viagens longas e anotações que ainda não partilhou. Começou há alguns meses a colaborar no Página Global.

Eleições: SEGUNDA VOLTA À VISTA NAS PRESIDENCIAIS DE SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE




DEUTSCHE WELLE

Serão as eleições mais disputadas de sempre no arquipélago, com dez candidatos a chefe de Estado. Num ponto todos estão de acordo: a estabilidade política é fundamental, pois sem ela não haverá crescimento económico.

Neste domingo (17/07) realizam-se eleições presidenciais em São Tomé e Príncipe, e tudo indica que venha a ser necessária uma segunda volta que, a confirmar-se, deverá ter lugar três semanas depois. Embora as hipóteses de sucesso não estejam distribuídas de forma igual pelos dez candidatos ao Palácio Cor de Rosa o resultado final é imprevisível.

Para o analista político Gerhard Seibert, do Centro de Estudos Africanos do Instituto de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE),  o entusiasmo suscitado por este sufrágio “é difícil de explicar”.

Na sua óptica existem quatro candidatos com grande probabilidade de passar à segunda volta. “O ex-presidente, Manuel Pinto da Costa, tem hipóteses de chegar a segunda volta, assim como Maria das Neves ambos das fileiras do MLSTP/PSD e também o Delfim Neves que tem o apoio do MDFL/PL, partido do Presidente da República Cessante e do PCD, partido do qual o candidato é secretário-geral”, disse Seibert.

Evaristo Carvalho é o quarto nome apontado para a segunda volta.  “Ele é apoiado pelo ADI, que está agora no governo. Não acho que seja um político que tenha estado visível nos últimos anos nem que seja um homem carismático. Com algumas dúvidas ele também pode ser um dos que cheguem a segunda volta”.

A palavra chave é estabilidade

Num país onde a instabilidade política tem sido recorrente nos últimos anos com sucessivas quedas de governos – desde 1991 os governos duraram em média dois anos – garantir a estabilidade política tem sido a promessa de todos os candidatos. Sem estabilidade não é possível o crescimento económico.

O último relatório do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) é claro na descrição do alcance da pobreza em São Tomé e Príncipe: 54 por cento dos cerca de 190 mil habitantes do arquipélago são pobres e as perspectivas não são animadoras. 

O documento do BAD identificou os estrangulamentos: “o crescimento económico, centrado em actividades pouco diversificadas, não conseguiu criar oportunidades de emprego para os camponeses pobres e para os jovens residentes nas zonas urbanas”. 

Os trabalhos do novo Presidente

O futuro chefe de Estado de São Tomé enfrentará uma tarefa difícil:  terá focalizar a sua atenção no reforço da credibilidade externa, atrair investimento estrangeiro, assegurar práticas de boa governação, diversificar a estrutura económica para além dos sectores da produção de cacau e petróleo e normalizar as relações institucionais entre as principais instituições políticas do país (a Presidência, o  Governo e a Assembleia Nacional). Na última década São Tomé teve nove Governos e assistiu a duas tentativas de golpe de Estado (em 2003 e 2009).
  
Autor: Edlena Barros/Helena Ferro de Gouveia - Edição: António Rocha

Alemanha – Angola: ESPECIALISTAS CONDENAM EXPORTAÇÃO DE ARMAS PARA ANGOLA




DEUTSCHE WELLE

O tema marcou a visita de Angela Merkel a África: a proposta alemã de vender barcos patrulha à marinha angolana. Mas, coloca-se a questão sobre se negócios com armas podem ser considerados uma ajuda ao desenvolvimento.

Por enquanto não há contratos assinados, mas caso o negócio se venha a concretizar, ele poderá ascender a um valor de até 100 milhões de euros.

Para o especialista em armamento, Marc von Boemcken, do Centro Internacional de Conversão, BICC, em Bona, esse é um problema, porque, em comparação com os países vizinhos, Angola “é um país altamente militarizado”, e que “investe apenas uma ínfima parte do seu orçamento na formação e na saúde”.

Para von Boemcken, Luanda devia reduzir as despesas militares e aumentar os orçamentos sociais. “Ao fecharmos negócios de armas com Angola, não estamos a apoiar esse desenvolvimento, antes pelo contrário", disse.

Modernizar o exército

Nas suas consultas em Luanda, a chanceler, Angela Merkel, disse que modernizar o exército angolano é um objetivo político. A chefe do governo salientou ser do interesse da Alemanha que os exércitos africanos estejam em condições de solucionar sozinhos os conflitos do continente.

Mas o diretor científico do Instituto da Política de Segurança, em Hamburgo, Michael Brzoska, avisa que é preciso ter cuidado: "Vejo com maior apreensão a formação dos soldados angolanos do que a entrega de barcos de patrulha. Claro que é desejável que os africanos resolvam os seus próprios conflitos. Mas desejaria que fossem especificamente formados para missões de paz em centros como o de Kofi Annan, no Gana. Se o fizermos em Angola, há sempre o perigo destes soldados serem instrumentalizados para fins de política interna". 

Militarização da disputa com países vizinhos?

Enquanto este especialista não vê inconvenientes em entregar os barcos de patrulha a Luanda, que considera ter um interesse legítimo em tornar as suas fronteiras mais seguras, Marc von Boemcken, do BICC, rejeita essa argumentação:

"É preciso não esquecer que Angola está envolvida em dois conflitos territoriais marítimos, com a República Democrática do Congo e com o Congo-Brazzaville”, refere. “A disputa gira em torno das reservas de petróleo ‘off-shore’. O fornecimento de barcos de patrulha a Angola arrisca-se a desencadear uma dinâmica de armamento que pode culminar na militarização do conflito. Mas o objetivo devia ser uma solução pacífica no âmbito das Nações Unidas".

Este especialista defende que a Alemanha não deve exportar armas para qualquer país que viole os direitos do homem. E para von Boemcken, Angola é precisamente um desses países, porque é governado de forma autocrática e repressiva pelo Presidente, José Eduardo dos Santos.

Autoras: Sandra Petersmann / Cristina Krippahl - Edição: Guilherme Correia da Silva / António Rocha

"Angola Merkel" título do Tageszeitung sobre a visita da chanceler à África





Angela Merkel visitou três países africanos em quatro dias: o Quénia, Angola e a Nigéria. Um périplo africano que inspira várias reflexões à imprensa alemã.

Nas colunas do Frankfurter Allgmeine Zeitung, Hans Meier-Ewert, diretor da "Afrika-Verein", associação para a África, defendeu um maior envolvimento das empresas alemãs no continente africano.

Ele saudou a visita de Angela Merkel às três potências regionais de África: o Quênia, Angola e a Nigéria. "A África", destacou Meier-Ewert, "é um continente dinâmico que teve entre 2001 e 2008 um crescimento de 6% e atingirá novamente um nível semelhante no futuro", disse.

Mas, na Alemanha, a imagem de África é sempre dominada por guerras, crises, doenças e catástrofes. "Esta imagem não tem muito a ver com a realidade na maioria dos países africanos", concluiu o diretor do "Afrika-Verein".

Escolha da Nigéria e de Angola, produtores de petróleo, não foi por acaso

O que se pode ler noutros jornais é nitidamente menos entusiasta, como nota, por seu turno, o Frankfurter Rundschau... e não é o único.

Para o jornal, "a escolha da Nigéria e de Angola, os dois principais produtores de petróleo em África, não foi por acaso". Em seguida o jornal acrescenta: "a África assume uma importância cada vez maior no aprovisionamento da Alemanha em energia e matérias primas".

Segundo o Süddeutsche Zeitung, "o problema é que a Alemanha não se envolveu, até hoje, de forma concreta, para que as populações dos países africanos também fossem beneficiadas com as receitas do petróleo".

"Merkel e os grandes do petróleo", titulou o Süddeutsche Zeitung, ao sublinhar que a Nigéria e Angola ilustram, cada um à sua maneira "esta maldição dos recursos" muitas vezes questionada em África.

O jornal evoca a violenta guerra pelo petróleo que atinge o delta do Níger. E nota ainda que "muitos outros setores económicos foram literalmente afogados na Nigéria, porque é muito mais confortável ganhar milhões de petrodólares, do que investir a longo prazo noutras áreas".

Em resumo, para o Süddeutsche Zeitung esta viagem de Angela Merkel foi mais um sinal confuso, na medida em que Angola, como a Nigéria, pratica o contrário dos objetivos da política africana da Alemanha, ou seja, promover a proteção dos recursos, a proteção do meio ambiente e o desenvolvimento económico sustentável.

"Elites ricas e cidadãos pobres", escreveu, na mesma ordem de idéia, o Tagesspiegel de Berlim, ao sublinhar que "o défice democrático em Angola é tão grande como as suas reservas de petróleo".

Barcos de patrulha alemães para Angola?

Entretanto, a visita de Angela Merkel, a Angola desencadeou aqui na Alemanha uma grande polémica.

"Angola Merkel", como escreveu o Tageszeitung, ofereceu na quarta feira (13.07) ao presidente José Eduardo dos Santos de Angola, a possibilidade de comprar barcos de patrulha alemães, uma iniciativa que desencadeou várias críticas no seio da oposição. "É uma falta de visão" escreveu o Süddeutsche Zeitung para concluir que "se trata de uma provocação".

"Os esforços da Alemanha para conquistar mercados em África assumem contornos originais", escreveu numa outra edição o Tageszeitung ao noticiar a proposta feita pela chanceler Angela Merkel de vender à marinha de guerra angolana barcos de patrulha alemães.

"O nosso objetivo", disse Merkel, é que conflitos regionais possam também ser pacificados por tropas regionais", tendo citado como exemplo a Somália e o Sudão.

O jornal acrescenta que "para além do facto de na verdade esta idéia não ter funcionado nesses dois países, em caso algum será aplicado no que concerne a Angola".

Angola possui um dos maiores e mais experientes exércitos do continente africano e "por várias vezes realizou intervenções nos dois países vizinhos: a República Democrática do Congo e o Congo-Brazaville. E Angola está também em conflito com esses dois países para a delimitação das águas territoriais".

O jornal recorda que "lá, onde estão as maiores reservas de petróleo off-shore, uma faixa costeira de 20 quilómetros, pertence ao Congo Democrático e separa o território angolano do exclave angolano de Cabinda. Por seu lado, o Congo-Brazaville reclama há anos um aumento da superfície das suas águas territoriais".

 "Nesse contexto", sublinha o quotidiano, a venda de barcos de patrulha à marinha angolana é um projeto ultra-sensível".

Num artigo do quotidiano económico Handelsblatt, o chefe da publicação do semanário Die Zeit, Josef Joffe, lembrou que a "Alemanha, defensora intransigente da paz" é o terceiro exportador mundial de armas e "não importa quem dirige o governo, o SPD ou a CDU da senhora Merkel".

E o artigo faz referencia às vendas de armamento a Singapura, aos Emiratos Árabes Unidos, à Arábia Saudita, ao Qatar.....

Aproveitamos para lembrar que a polémica começou no início deste mês de julho com o anúncio pela imprensa alemã de uma iminente venda de 200 carros de combate Leopard 2 à Arábia Saudita.

73% dos alemães são contra, segundo uma sondagem do instituto Forsa publicada na semana passada pelo semanário Stern.

Autor: António Rocha - Edição: Cristina Krippahl 

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