quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

"O Irão já dispõe quase de uma arma nuclear que é bloquear o estreito de Ormuz"



Nuno Aguiar - Dinheiro Vivo

Miguel Monjardino, analista de política internacional, descodifica a partida de xadrez numa das maiores artérias petrolíferas do mundo

O embargo europeu ao petróleo iraniano encostou Teerão à parede, empurrando-o para soluções mais agressivas. Caso se confirmem as novas sanções da União Europeia, o Irão ameaça bloquear o Estreito de Ormuz, via de passagem de mais de um terço do tráfego marítimo de petróleo. Miguel Monjardino, professor de do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, explica a dimensão do impacto que uma tentativa de bloqueio teria para o preço do petróleo, bem como a lógica por trás das acções de Teerão, Bruxelas e Washington.

Qual é a importância estratégica do Estreito de Ormuz?

É uma espécie de artéria energética mundial. A aorta. É por aí que passa uma parte muito grande do petróleo que mantém as sociedades a funcionarem como funcionam. O mundo ocidental está muito preocupado com o desenvolvimento do programa nuclear do Irão, mas o Irão já dispõe quase de uma "arma nuclear", que é bloquear o estreito. Embora me pareça que seria uma espécie de suicídio económico.

Porquê?

O Irão não refina o seu próprio petróleo. Exporta, para depois importar. E o petróleo representa uma fatia muito importante da sua receita. Numa altura em que o regime iraniano está profundamente dividido e a região está em convulsão, um cenário desse género seria muito prejudicial.

O impacto no preço do petróleo seria imediato?

A mera ameaça séria de o fazer faria disparar os preços. Seria péssimo para a Europa e para Portugal. É a última coisa que precisamos.

Qual é a lógica por trás da estratégica iraniana?

O cálculo iraniano é que prejudicaria mais o ocidente e que o aumento dos preços obrigaria os Estados Unidos a ceder. A lógica norte-americana é exactamente a contrária. Que Teerão tem mais a perder.

O Irão seria capaz de executar um bloqueio eficaz do estreito?

Não me parece que tenha a capacidade militar para o fazer. Já o tentaram nos anos 90. O que não quer dizer que não possam tentar uma estratégia assimétrica, minando o estreito e utilizando lanchas para ataques mais ou menos suicidas. Não seria um bloqueio, mas provocaria muitas dificuldades.

As eleições nos Estados Unidos - e a popularidade de alguma retórica bélica -podem ajudar a precipitar um choque?

Absolutamente. Existem ciclos eleitorais em curso em ambos os lados. No Irão há eleições para o Parlamento em Março e Presidenciais em 2013. Os adversários internos de Ahmadinejad vão pressioná-lo para ser mais duro. No caso de Barack Obama, a pressão é dupla, além dos republicanos, tem de se preocupar em sossegar os seus aliados na região. Mas não me parece que a grande estratégia norte-americana passe por um conflito com o Irão, embora exista uma pressão grande para tomar uma atitude mais pro-activa.

No final, quem irá piscar os olhos? Assistiremos a uma tentativa de bloqueio?

O bloqueio avançará se forem cumpridas duas condições: o Irão achar que tem os meios para o assegurar e se a dureza das sanções fizer com que não tenham nada a perder. É que, apesar de um embargo petrolífero ter um impacto limitado (um financeiro é sempre mais eficaz), o Irão gostaria certamente de o evitar.

Portanto, nenhum dos lados está interessado em levar as ameaças até ao fim?

Se olharmos apenas para a retórica, ambos os lados caminham para um choque, mas ficaria muito surpreendido se nos bastidores não estejam a ser exploradas hipóteses de resolução. Além disso, existem outras vias que não conseguimos observar. Cientistas iranianos têm sido assassinados misteriosamente nas ruas de Teerão e têm surgido vírus informáticos muito sofisticados para sabotar o programa nuclear iraniano. A guerra no mundo das sombras é real.

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