Correio do Brasil, com BBC - do Piauí
Lançado em junho de 2011, o programa Brasil Sem Miséria já localizou quase 490 mil famílias com renda per capita abaixo de R$ 70. Mas o número ainda é uma parcela pequena das 16,2 milhões de pessoas que, segundo o Censo 2010, vivem em nível de pobreza extrema.
O plano do governo da presidenta Dilma Rousseff prevê ações em diversas frentes além da transferência de renda para beneficiar pessoas que vivem com menos de R$ 70 por mês, buscando aumentar oferta de emprego, a capacitação e o acesso a serviços públicos como saúde, educação e saneamento.
Mas o primeiro grande desafio é chegar a essas famílias que vivem em extrema pobreza no país, um trabalho artesanal que vem sendo realizado por equipes volantes que precisam ir a lugares muitas vezes isolados, cujos moradores nem sempre procuram assistência.
– É preciso realizar a busca ativa para determinadas populações, porque muitos grupos simplesmente não vão atrás do cadastro, como as populações quilombolas e ribeirinhas– diz a assistente social Claudina Barbosa Lima, gerente de transferência de renda da Secretaria de Assistência Social (Sasc) do Piauí.
Uma das primeiras metas do plano é mapear, até o fim de 2013, 800 mil famílias que vivem com este patamar de renda, das quais mais da metade já foram localizadas. Fazer o cadastro para que elas passem a contar com Bolsa Família é a primeira providência do plano, afirma o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Rômulo Paes.
Mas o plano abrange outras 126 ações além do programa de transferência de renda, explica Paes.
Plano customizado
– É preciso que essas pessoas tenham a oportunidade de vivenciar o bônus da emergência econômica no Brasil– afirma Paes à BBC Brasil. “Para, isso o estado faz uma opção de focar nas pessoas que estão na base da pirâmide e de apresentar um conjunto de alternativas customizadas para suas vidas, de acordo com os ambientes onde vivem.”
De acordo com Paes, os programas listados no escopo do Brasil Sem Miséria - alguns preexistentes, outros criados para o plano – serão adotados de acordo com as necessidades de cada região.
Em áreas rurais, por exemplo, podem ser aplicados programas de assessoramento técnico agrícola, fomento para a agricultura familiar, incentivos para famílias que promovam a conservação ambiental (Bolsa Verde) e combate ao trabalho infantil; em áreas urbanas, o foco são ações de assistência social, diz Paes.
Segundo o secretário-executivo do MDS, o sucesso do Brasil Sem Miséria depende da parceria com estados e municípios, a quem cabe o trabalho junto às populações localizadas.
– O governo federal depende de parceiros mais próximos da população beneficiária, então é importante que estados e municípios sejam partícipes. O bom funcionamento depende disso– diz Paes.
Longo prazo
Mas não há uma fórmula matemática para precisar o tempo que o plano vai levar para produzir efeitos. Ele é mais difícil de quantificar do que o Bolsa Família, que foi lançado em outubro de 2003 e em três anos já tinha chegado a 11 milhões de pessoas.
– Em nosso caso, estamos partindo de vários programas. A expectativa é que até o fim deste ano eles (os programas) estejam funcionando de maneira integrada em varias regiões do país. Mas obviamente temos maior capacidade de articulação desses servicos nas áreas urbanas (do que nas rurais)– afirma.
A aplicação local das ações do Brasil Sem Miséria se dá pela por parcerias com órgãos locais e por pactos firmados entre o governo federal e os estados.
No Piauí, por exemplo, foi lançado no início deste mês o programa Mais Viver. De acordo com o coordenador, Cezar Fortes, trata-se de uma versão local do Brasil Sem Miséria para articular as ações do governo federal com atores locais e complementá-las com outras iniciativas regionais.
De acordo com a Sasc do Piauí, que tem pouco mais de 3 milhões de habitantes, 660 mil pessoas vivem abaixo da linha de pobreza (a faixa de renda de até R$ 70).
Fortes afirma que o problema não é tanto localizar novas famílias e ampliar o número de contemplados pela transferência de renda. Segundo ele, o estado já chegou ao seu “teto” no Bolsa Família, com 444 mil famílias recebendo o benefício.
A necessidade, agora, é diversificar as ações para aquelas com menor renda e refinar o cadastro para ter certeza que as pessoas que mais precisam estão sendo beneficiadas.
– Há pessoas que mesmo recebendo o Bolsa Família continuam na linha de extrema miséria– afirma. “O valor médio do Bolsa Família no Piauí é de R$ 120. Em metade dos casos, não é o suficiente para tirar as pessoas da situação de extrema pobreza.”
Assunção do Piauí
É o que se vê em Assunção do Piauí, cidade que tem a menor renda per capita no estado (R$ 137) e onde 46% da população está na faixa do Brasil Sem Miséria, recebendo até R$ 70 por mês.
Não há opções de emprego na cidade, e a tradição de trabalhar na roça, cultivando feijão, tem dado pouco dinheiro à população, que fica à mercê das chuvas esparsas do semiárido e vem sofrendo com uma sucessão de colheitas ruins.
Nas casas visitadas pela BBC Brasil, a única renda fixa é o Bolsa Família, não raro dividido por muitas bocas. Da população de 7.500 habitantes, 1.446 famílias recebem o Bolsa Família. Outras estão na fila de espera porque cidade já chegou à cota estabelecida pelo MDS.
Mas a situação está melhor do que três anos atrás, afirma a assistente social Ana Alaídes Soares Câmara, do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) da cidade. Ponta de lança das ações sociais voltadas para a população, o Cras foi implantado em 2009 e regularizou o acesso ao Bolsa Família.
Antes disso, o cadastro para o benefício era irregular, e os moradores eram contempladas ou não de acordo com seu partido político, diz Ana Alaídes. Na época, ela diz que existia um Cras “fictício” que a antiga prefeitura fingia estar funcionando.
– O Ministério (do Desenvolvimento Social) já repassava dinheiro para o Cras, mas ele nunca tinha sido implantado. Quando a gestora ficava sabendo que ia ter visita do Sasc, mandava pintar a casa de um dia para o outro para fingir que estava funcionando– conta.
Os moradores de Assunção do Piauí dizem que a vida melhorou desde que têm o “cartão”, como se referem aos recursos que recebem pelo Bolsa Família. Mas ainda não fazem menção ao Brasil Sem Miséria, cujos benefícios ainda não conhecem.
Segundo Cezar Fortes, as primeiras ações a serem realizadas na cidade são a construção de cisternas para abastecer famílias com pouca oferta de água, a ser executada pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa); e um programa de alfabetização para jovens e adultos que será implantado nos 30 municípios piauienses com maior índice de analfabetismo, realizado pela Secretaria Estadual de Educação em parceria com as universidades federal e estadual do Piauí.
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