quinta-feira, 8 de março de 2012

IGUALDADE DOS ESTADOS




João Batista Herkenhoff – Direto da Redação

Diga-se sem meias palavras: há no Brasil, por parte de alguns, a tentativa de superpor grandes Estados à face de Estados menores. Seja denunciado esse equívoco, não com a intenção de ampliar as cisões, mas com o desejo de contribuir para que os rumos sejam retificados.

Dentro dessa visão míope, só existe competência, criatividade e inteligência, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Até mesmo Estados poderosos como Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco são afastados do “grupo dos seletos”.

Quanto a Estados como o Espírito Santo, nem se fale. São simplesmente excluídos do mapa.

No início da República, instalou-se a chamada “política café com leite”, na escolha dos presidentes da República. Um presidente era paulista (café), outro presidente era mineiro (leite).

A política do “café com leite” foi derrubada pela Revolução de 1930. Seguiu-se a ditadura de Getúlio Vargas (gaúcho). Com a reconstitucionalização do país, em 1946, a Presidência da República foi ocupada por cidadãos das mais diversas unidades federativas, mas a predominância dos grandes Estados continuou.

A percepção deturpada, que conduz a essa situação, atua em diversas áreas. Na Medicina, só haveria grandes profissionais no circuito Rio – São Paulo, embora haja “brechas” dentro dessa primazia. Na Educação, as grandes universidades são as cariocas e paulistas, com pequenas exceções. Na Literatura, ninguém entra na “ceia dos cardeais” sem o beneplácito das editoras que exibam as siglas SP ou RJ. Na Justiça, só faz jurisprudência, destinada a ser bússola, aquela produzida pelos tribunais de São Paulo e do Rio, abrindo-se exceção, neste campo, para os tribunais federais sediados em Brasília. O Rio Grande do Sul conquistou espaço, ruidosamente, através dos alternativistas.

Registre-se que há resistências, cada vez maiores, a essa discriminação, inclusive há resistência dentro das unidades federativas destacadas.

Em razão dessa frequente falta de cuidado no debruçar-se diante dos pequenos, é que vibramos de orgulho e alegria quando um capixaba, em qualquer área da atividade humana, desponta no estrelato nacional, ou quando uma criação legitimamente nossa, como os pios de caça de Maurílio Coelho, despertam admiração e encantamento.

Os pios são produzidos com delicadeza e arte, imitando com perfeição o pio das mais diversas aves. Destinavam-se, primitivamente, à caça, pois que, naquela época, as caças eram abundantes e não havia espécies ameaçadas de extinção. Como agora esse perigo de extinção é muito grande, não se deve fomentar essa atividade. Os pios, pela sua musicalidade, destinam-se hoje a constituir objeto de deleite para o espírito, descanso nesta vida atribulada, momento de interiorização e de paz. A fábrica de pios, na Ilha da Luz, em Cachoeiro, continua sendo levada avante por netos e bisnetos de Maurílio Coelho. Minha irmã mais velha, Lucília, era nora do criador da fábrica de pios, casada que foi com Jader Coelho, hoje falecido.

Mas se o realce do que se faz em nossas plagas estimula o ego, o desconhecimento nos entristece muito.

Em 2006 foi dado um grande destaque, nos mais diversos veículos de comunicação, ao diagnóstico que se fez da Justiça brasileira, inclusive com a tentativa de radiografar a cabeça dos magistrados. Este diagnóstico foi apresentado como absolutamente pioneiro, o que não é verdade.

Tive a oportunidade de publicar em 1977, pela Editora Resenha Universitária, um livro hoje esgotado, mas presente no acervo de algumas bibliotecas: “A Função Judiciária no Interior”.

Mandei um exemplar para a VEJA, sem interferência de qualquer pessoa, sem conhecer jornalista algum da revista. A obra, para minha surpresa, recebeu duas páginas de comentário, na edição de 30 de março de 1977, com chamada de capa. Disse textualmente a VEJA:

“Qual será o perfil do juiz brasileiro da primeira instância, cerca de 2.000 homens sem rosto que, de certa forma, estão no centro dos problemas do Judiciário? O tema, até agora, tem vivido num deserto estatístico e sociológico. Mas algumas respostas podem estar começando a emergir, como as que aparecem em “A Função Judiciária no Interior”, dissertação de Mestrado apresentada à PUC/RJ pelo juiz João Baptista Herkenhoff, de Vitória, ES.”

* João Baptista Herkenhoff, magistrado aposentado, é professor da Faculdade Estácio de Sá de Vila Velha (ES), palestrante e escritor. Autor do livro: Filosofia do Direito (GZ Editora, Rio de Janeiro).

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