quarta-feira, 7 de março de 2012

RAPIDINHAS DO MARTINHO – 69. CORRELAÇÃO DE FORÇAS



Martinho Júnior, Luanda

A correlação de forças entre os que advogam pela globalização sujeita a uma hegemonia uni-polar e os que são favoráveis a um relacionamento aberto à multi-polarização pôde agora ser observada durante as discussões, quer no Conselho de Segurança, quer na Assembleia Geral da ONU, sobre a Síria, como pôde também ser observada em fenómenos sócio-políticos correntes, como as eleições na própria Rússia.

De facto, depois da Líbia, era de esperar que uma parte das nações da Terra começassem a ter uma outra noção dos contenciosos historicamente fluentes, que põem a nu uma factura: a que diz respeito ao rescaldo que deu sequência ao desmantelar da União Soviética, ao fim do bloco socialista no leste da Europa e à fragilização do movimento de libertação em África.

Nunca o capitalismo neo liberal teria sido possível, com seu arsenal de conceitos elitistas em socorro duma aristocracia financeira exacerbada pelos lucros à escala do universo, se continuasse a existir um campo socialista forte e coeso e, no caso africano, se África desse outra sequência ao movimento de libertação que foi decisivo na luta contra o colonialismo, o “apartheid” e algumas das suas sequelas.

Mesmo com o esgotamento de recursos em guerras que acarretaram orçamentos elevadíssimos, as potências mentoras dessas políticas, com os anglo-saxões à cabeça, não deixam de procurar reforçar o percurso da hegemonia uni polar, enveredando agora por processos menos onerosos para as suas finanças, mas extremamente prejudiciais às nações alvo.

As nações alvo, sofrendo os impactos das ingerências em suas instituições sócio-políticas, estão condenadas além do mais à desagregação!

Nas nações alvo, é toda a sua sociedade que é atingida por ingerências que visam alterar de forma mais ou menos abrupta os regimes, não dando espaço às potencialidades de sua adequação, de forma a, por via de agentes com o rótulo de “democráticos”, estimularem os interesses de sua inteira conveniência, recorrendo concomitantemente a aliados que tudo têm feito para obstar ao aprofundamento da democracia nos seus próprios espaços nacionais, como as monarquias arábicas.

Essas ingerências põem sem dúvida em causa a soberania das vulnerabilizadas nações alvo, autênticas “república banana”, onde as “moscas” se vão revezando no poder, acelerando-se as tendências para a sua desagregação.

A Líbia é um exemplo último, um exemplo flagrante e a fragmentação que se desenha para o seu contexto nacional corresponde aos desígnios da hegemonia unipolar: quanto mais divididos andarem os líbios, quanto mais anarquia por lá houver, quanto mais tempo eles demorarem a estabilizar, melhor para os monopólios ocidentais do petróleo e do gás!

A parte oriental do país, a Cirenaica, onde se encontram os poços de petróleo mais produtivos e as principais instalações do petróleo, foi declarada “região autónoma” e, segundo alguns analistas, esse pode ser o primeiro passo para a declaração de independência. (1)

A desagregação da Líbia é um dos cenários que tinha previsto, um cenário que aliás está pendente sobre África ao longo do corrente século. (2)

O caso da Síria é complexo mas muito similar, num território muito mais densamente povoado que o da Líbia e sem desertos enormes, o que quer dizer: o que ocorrer na Síria, terá influência e implicações em cadeia noutros países da região, terá sucessivos “efeitos dominó”, conforme os conceitos norte americanos do tempo de Chester Crocker…

Uma alteração sócio-política abrupta na Síria terá um efeito em cadeia que acarretará um conjunto de alterações importantes em países como a Turquia, o Líbano, o Iraque, o Irão e até mesmo Israel (o mapa da região poderá ser redesenhado, surgindo novas entidades nacionais).

O despertar para este tipo de situações é sentido na Rússia, na China, como nos países que compõem a ALBA, na América Latina e também em alguns africanos, também por causa dos seus contextos nacionais e regionais.

As políticas indexadas à hegemonia uni polar tiveram em relação à Síria 137 votos a favor, 12 contra e 17 abstenções, mas as questões que estão sobre a mesa atingem a maior parte das nações da Terra, Rússia e China incluídas, as “repúblicas banana” do século XXI. (3)

Notas:
- (1) – Leste da Líbia foi declarado região autónoma – http://portuguese.ruvr.ru/2012_03_06/67727259/ ; Líbia está à beira do colapso – http://portuguese.ruvr.ru/2012_03_06/67704517/
- (2) – Rapidinhas do Martinho – 36 – Salvar a paz em África – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/08/rapidinhas-do-martinho-36.html
- (3) – General Assembly Adopts Resolution Strongly Condemning ‘Widespread and Systematic’ – http://www.un.org/News/Press/docs//2012/ga11207.doc.htm

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