André Catueira, da Agência Lusa
Chimoio, 15 abr (Lusa) - Alberto Gunhe, 34 anos, apoia-se em muletas para se deslocar e emociona-se quando recorda o acidente com uma mina de guerra em Chicanga, interior de Gondola, centro de Moçambique, que o deixou com a cara deformada e sem a perna direita.
"Éramos três ao tentar abrir uma panela (mina) que havíamos achado na machamba (horta) para extrair um líquido no interior. Quando me levantei para buscar uma pedra para ajudar a abri-la, aquilo explodiu. Fui o único sobrevivente, mesmo assim sofri" conta à Lusa Alberto Gunhe, enquanto apalpa uma bochecha, que já não sente.
Estatísticas do Instituto Nacional de Desminagem (IND) indicam que 11 pessoas morreram em 2011, na região centro de Moçambique, após acionarem engenhos, na tentativa de extrair mercúrio, substância de alto valor económico, que supostamente está contida nas minas. Outras 25 pessoas contraíram ferimentos em 13 acidentes registados.
"Mais uma vez, apelamos a toda população avisando que os engenhos explosivos (minas) não têm mercúrio. Só trazem morte e sofrimento no seio das famílias e da comunidade em geral", disse à Lusa Felex Daud, delegado regional centro do IND, lamentado o facto de persistirem situações de acidentes causados por minas, plantadas na guerra civil entre 1976 e 1992.
O mercúrio é geralmente usado por garimpeiros na captura de ouro na província de Manica, situação que tem contribuído para a poluição de numerosos rios e a contaminação da tilapia, a espécie do peixe mais consumido na província, colocando em risco a saúde humana.
No ano passado a polícia moçambicana deteve dois indivíduos em Chimoio, Manica, centro do país, na posse de quatro granadas que iam ser vendidas por 200 mil meticais (5.405 euros) para extração de mercúrio, para alimentar o garimpo. Os dois homens foram condenados a dois anos de cadeia cada pelo tribunal local.
"Com mercúrio, a captura de ouro durante a lavagem é muito maior. O líquido ajuda a concentrar o ouro e, assim, temos poucas perdas no processamento e o rendimento é maior. Não sei de onde as trazem, mas muitas pessoas vêm-nos vender mercúrio que é muito procurado aqui nas minas (no garimpo)", disse à Lusa Vasco Djimo, garimpeiro.
Entretanto as autoridades de desminagem apelam para a maior consciência da população, sobre o perigo das minas, estando em cursos trabalhos de sensibilização em várias comunidades do país, para se evitarem novas mortes na sequência da explosão destes engenhos.
"O Instituto Nacional de Desminagem e seus parceiros têm estado a levar à cabo palestras sobre o perigo de minas, de modo a prevenir acidentes, no seio das comunidades, mas é com muita tristeza que chega ao nosso conhecimento que a população ainda tem sido acidentada por engenhos explosivos", explicou Felex Daud, por ocasião do dia internacional de sensibilização sobre o perigo de minas, celebrado na semana passada.
Na província de Manica cerca de três milhões de metros quadrados de terras estão ainda por desminar. Trabalhos já feitos permitiram a libertação de cerca dois milhões de metros quadrados de terras que, outrora, estavam cheios de minas.
A área por desminar corresponde a 37 campos de minas existentes naquela parcela do país, onde se espera a entrada em funcionamento, brevemente, de mais uma campanha de desminagem, a qual vai se juntar à The Hallo Trust, apoiada pelo governo nipónico.
Em declarações à Lusa, Felex Daud assinalou avanços nos trabalhos de desminagem em Manica, particularmente em locais onde estão implantadas infraestruturas sociais e económicas de grande vulto, na cintura da barragem de Chicamba, central elétrica de Mavúzi e ao longo da linha férrea Machipanda-Beira.
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