sábado, 26 de maio de 2012

Portugal: AS PRESSÕES


Carlos Magno Ercorastejante (por Relvas)

João Marcelino – Diário de Notícias, opinião

1. Tanto o chamado "caso das secretas" (ou o "caso Jorge Silva Carvalho") como o de Miguel Relvas-Público mostram uma coisa: os governos mudam, os ministros também, mas há algo que permanece - a ideia de que "controlando" a informação, conhecendo os protagonistas, podendo fazer umas "pressões", o mundo gira na direção pretendida.

Miguel Relvas sucede a José Sócrates, como este herdou o testemunho de Rui Gomes da Silva, que, por sua vez, estava em linha com Morais Sarmento. Ou seja, há sempre alguém a caminho do poder que acredita que o sucesso da governação está umbilicalmente ligado à capacidade de influenciar os media ou saber segredos em primeira mão.

Esta realidade deve-se tanto à sede de poder como, igualmente, à impreparação política e pessoal dos protagonistas decisores. Durante anos, longos anos, eles procuram abrir caminho para chegar ao poder. Nesse período, cada notícia, cada informação, é uma bênção. E cada jornalista, cada "espião", um arauto do radioso futuro que os espera.

Não há inocentes neste jogo.

O político procura formar o seu exército - e, neste, os traficantes, infelizmente alguns com carteira profissional de jornalista, que estão para a informação como o veneno para a vida, vão vendendo a sua importância, assinalando-lhe os "perigos", demonstrando em cada momento como o mundo seria pior se não fosse o seu avisado conselho e a sua venerável vigilância, até nas redações.

No fim, um dia depois dos votos, acabam todos reunidos. O político requisita adjuntos e assessores e o desastre, produto da miopia, começa a dar-se.

2. O caso concreto entre Miguel Relvas e o Público não configura uma pressão. Com isso, os jornalistas, os verdadeiros jornalistas, sabem perfeitamente lidar. Todos os dias elas existem. Vêm de figuras públicas e de pessoas anónimas - mais destas, até - de repente promovidas a foco de notícias. Cada um vende a sua verdade, indignação, ou promove o esclarecimento que julga adequado. Neste jogo há muita "notícia" que morre pelo caminho, como também há, às vezes, rumores aparentemente inverosímeis que chegam a factos.

Os jornalistas ouvem de um lado e do outro e devem ser substantivos nas notícias que fazem e nos assuntos que escolhem, ou não, publicar.

É ridículo ouvir um jornalista queixar-se de ser pressionado, porque isso é, não sempre mas normalmente, um atestado de impreparação. As "pressões" não escolhem jornalistas. Elas estão no dia a dia de governantes, decisores sociais e económicos, treinadores de futebol, cozinheiros, empreendedores, advogados e juízes. Todos os cidadãos, no exercício da sua atividade e à vez, são condicionados ou tentam condicionar.

3. O caso de Miguel Relvas versus Público só é importante porque talvez vá para além da pressão, sempre mais ou menos legítima, e nos leva a discutir a possibilidade de uma ameaça ou de uma tentada coação. Isso, sim, é grave, cai na alçada da lei e politicamente coloca uma questão delicada ao primeiro--ministro.

A acusação do Público a Miguel Relvas é duplamente grave porque nos remete ainda, mesmo que subliminarmente, para o "caso Jorge Silva Carvalho". Ou seja, para a possibilidade de um governante ter, eventualmente, facilidade em obter dados da vida pessoal de um qualquer cidadão e os poder utilizar para condicionar um profissional no exercício da sua atividade.

Ser jornalista neste caso é absolutamente irrelevante.

Ser ministro neste caso é de todo preocupante.

O presidente da ERC, Carlos Magno, gostou imenso da gravata que o ministro Miguel Relvas levou à audição. Disse-o, ficou gravado. E esse facto, tão simples como elucidativo, é uma pressão que fica a pairar sobre as conclusões deste processo.

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