Mário Augusto Jakobskind* – Direto da Redação
No encerramento da Conferência da ONU de Sustentabilidade e Desenvolvimento, a Rio + 20, ocorreu também um retrocesso político de graves consequências no Paraguai com o golpe parlamentar que derrubou o Presidente constitucional Fernando Lugo, assumindo o vice Federico Franco, do Partido Liberal.
Não era de hoje que a elite paraguaia se sentia incomodada com Lugo no governo. O tempo passou e aproveitaram a oportunidade de um grave incidente que pode ter sido armado pelos próprios ruralistas para desencadear a ofensiva que culminou com a derrubada de Lugo. Um retrocesso ao estilo Honduras, cujo governo de Franco não deve ser reconhecido, porque a derrubada de Lugo foi totalmente ilegal.
O Prêmio Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel comentou que o golpe de estado no Paraguai estava sendo preparado há tempos e faz parte da poítica continental imposta pelos EUA contra governos democráticos, com a cumplicidade dos poderes econômicos e políticos e ainda mais a traição do vice-presidente Federico Franco.
O golpe teve apoio também dos brasiguaios, os brasileiros donos de terras no Paraguai e segundo Martin Almada, o descobridor dos arquivos da Operação Condor, um dos principais integrantes do setor é um tal deTranquilo Favero, brasileiro, natural de Santa Catarina, que fez fortuna graças a doação de terras proporcionadas pelo falecido ditador Alfredo Stroessner, que assim retribuiu o apoio do empresário.
Não é à toa que Merval Pereira apoiou o golpe no Paraguai e o comparou com o democrático impeachment de Collor em 1992. Um equívoco, na ocasião o então presidente teve todo o tempo do mundo para se defender e a opinião pública estava contra ele. Já Lugo conta com o apoio popular e nem tempo adequado lhe foi dado pelos congressistas para ele se defender.
Merval, como sempre a serviço da direita, jamais tocaria na questão da mídia de mercado, linha auxiliar da oligarquia paraguaia para desfechar o golpe de estado parlamentar. O jornal ABC Color teve papel destacado nos acontecimentos. Possivelmente similares paraguaios de Merval Pereira foram acionados.
Ainda estamos nos rescaldos da Rio + 20. A Cúpula dos Povos, além da série de debates, exposições e tomadas de posição produziu um fato político relevante aqui no Rio de Janeiro. Depois da passeata dos 100 mil de 1968 a cidade na semana passada foi palco de uma outra que reuniu cerca de 70 mil pessoas.
Quanto à reunião das Nações Unidas realizada no Rio Centro, a pergunta que não quer calar remete à pergunta: "e agora?". Qual o avanço verificado?
A semana que passou produziu também uma grande contradição. Enquanto na reunião do G-20, realizada no México, foi aprovado um pacote de cerca de 70 bilhões de euros para o FMI, na verdade para salvar os bancos, na Rio + 20 os países ricos não aceitaram dar pelo menos 30 bilhões para um fundo de preservação do meio ambiente.
Cabe mais uma pergunta: o Planeta continuará convivendo com os violadores do meio ambiente que se escondem na retórica de defensores da ecologia desde craincinha?
Eike Batista, por exemplo, deu palestra no projeto Humanidade no Forte Copacabana defendendo o meio ambiente, enquanto Israel Klabin escreveu artigo no caderno especial de O Globo sobre a Rio + 20. Quer dizer: mais uma vez os predadores do meio ambiente se colocam exatamente ao contrário do que são.
A presença do Presidente do Irã Mahmoud Ahmadinejad no Rio de Janeiro vale um capítulo a parte. Provocou polêmicas das mais variadas.
Ao contrário do que é apresentado diariamente pela midia de mercado, Ahmadinejad mostrou um discurso conciliador, sem deixar de lado os princípios, reafirmando que o seu país não quer ter bomba atômica. O islamismo não permite, segundo Ahmadinejad
No encontro que teve com intelectuais, políticos e alguns formadores de opinião, onde ouviu mais do que falou, o presidente iraniano enfatizou a importância da Justiça para o mundo e reafirmou suas críticas a uma ordem mundial injusta que precisa ser modificada.
Na entrevista coletiva , Ahmadinejad destacou, entre outras coisas, a hipocrisia dos Estados Unidos que tinha seis acordos nucleares na época do Xá Pahlevi, quando o Irã vivia uma ditadura, e os suspendeu logo após o triunfo da revolução E agora pressiona o Irã, segundo Ahmadinejad, exatamente para evitar o desenvolvimento da energia nuclear para fins pacíficos.
Mas a presença de Ahmnadinejad na Rio + 20, como não poderia deixar de ser, provocou polêmicas e manipulação da informação.
O maior exemplo nesse sentido ficou mais uma vez com O Globo. No suplemento especial sobre o Rio + 20, da quinta-feira (21), na página 4, a única matéria não assinada era sobre Ahmadinejad ("Ahmadinejad discursa contra a desigualdade") editada de forma totalmente manipulada.
No final da matéria, o jornal dos Marinhos informava que "um forte esquema de segurança impede a circulação de repórteres e curiosos". Referia-se o "informe" ao hotel Royal Tulip, em São Conrado.
Os que circularam por lá naqueles dias puderam confirmar que a notícia divulgada não correspondia a realidade. Foi colocada com o objetivo de reforçar a imagem negativa do presidente iraniano.
Os jornalistas independentes que participaram da entrevista coletiva com Ahmadinejad chegaram a comentar como no local estava sendo discreta a segurança do dirigente iraniano que está na bola sete.
Teve jornalista que chegou ao local de carro e nem teve problema para estacionar no pátio do hotel, o que geralmente não é comum nos locais onde circulam autoridades, sobretudo chefes de Estado ou de Governo.
Fica o registro que pode servir de subsídio para os interessados em analisar como os jornais cobriram a intensa movimentação ocorrida no Rio de Janeiro nestes dias.
* É correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE
4 comentários:
Fernando Lugo foi destituído da presidência do Paraguai graças a um processo de impeachment que contou com um maciço apoio dos deputados e senadores, seguindo todos os trâmites constitucionais daquele país.
As leis não foram minimamente atropeladas, embora se possa lamentar o fato de o hoje ex-presidente não ter podido exercer convenientemente o seu direito de defesa. Podemos evidentemente considerar que um amplo exercício do direito de defesa deveria ter sido assegurado. Daí não se segue, contudo, que a Constituição não tenha sido seguida, pois o rito de impeachment daquele país é, efetivamente, sumário.
Podemos discordar da Constituição paraguaia por razões A ou B. No entanto, é a lei vigente. Logo, não se pode considerar golpe o que foi um procedimento constitucional. Tal apelação só serve aos adversários da democracia no Paraguai, sobretudo os centrados nos governos esquerdistas, bolivarianos, que – esses sim – não se cansam de atropelar as leis dos seus países, com um claro propósito liberticida. Falta um mínimo de coerência para que suas vozes sejam ouvidas; falta-lhes, na verdade, vergonha.
Considere-se, ainda, que o impeachment de Fernando Lugo foi referendado pela Suprema Corte, reiterando que todos os trâmites constitucionais foram seguidos. Ademais, não houve nenhum movimento "popular" de resistência em defesa do ex-presidente que, resignado, acatou a decisão da Câmara dos Deputados e do Senado.
O próprio presidente saiu sem resistência do Palácio, obedecendo à decisão do Poder Legislativo. Não foi forçado militarmente a fazer isso. Se dias depois ele começou a falar em "resistência" (sem respaldo popular, diga-se de passagem) é porque foi insuflado por governos como os da Venezuela, Bolívia , Equador e, em menor medida, do Brasil. Uruguai e Chile já começam a se demarcar dessa posição, apregoando por punições que não tenham maior alcance econômico.
O Brasil parece enveredar por esse caminho, embora o seu passado "bolivariano" nas relações internacionais com a América Latina não ofereça nenhuma garantia. Isto é, Fernando Lugo não tem apoio interno e a tentativa de conferir-lhe sustentação vem de governos que, em boa parte, não têm compromisso nenhum com a democracia.
A Argentina de Cristina Kirchner é um governo de característica liberticida, voltando-se sistematicamente contra a liberdade de imprensa e procurando controlar os meios de comunicação em geral. Procura calar qualquer voz independente da sociedade civil que não siga os seus objetivos.
Ademais, na tradição de corte fascista-peronista, utiliza-se de máfias sindicais para criar um suposto movimento popular contra os jornais e meios de comunicação. São os piquetes "sindicais", que não hesitam no uso da violência. Os que têm o projeto de estabelecer o "monopólio" do poder, criam o argumento do "oligopólio" da mídia. Seria risível se não fosse terrivelmente verdadeiro. Eis porque a presidente Kirchner é das mais duras críticas do processo de impeachment de Lugo.
Hugo Chávez, o "democrata", é um feroz defensor de Lugo. Tem, aliás, todas as características de um liberticida que procura implementar um regime totalitário em seu país. Os irmãos Castro são seus admiradores vivos; Stálin, de sua tumba, segue seus passos com denodo e admiração.
Dentre outras "qualidades" totalitárias, destacam-se: a) sua perseguição implacável aos meios de comunicação, obrigando algumas empresas a fechar, tendo como objetivo cercar a liberdade de imprensa; b) subordinação completa do Judiciário aos seus desígnios, tendo deixado de ser propriamente um poder; c) nas últimas eleições, mudou as circunscrições eleitorais por ato monocrático, alterando a representação, de modo que o seu propósito de poder estivesse mais bem assegurado; d) retirou prerrogativas de governos estaduais que se posicionaram contra ele, em um ato de evidente arbitrariedade; e) o Poder Legislativo lhe é completamente subordinado, apenas seguindo as suas orientações: f) concentra em si mesmo os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, abolindo uma distinção básica dos Estados democráticos. São os regimes totalitários, que concentram dessa maneira o Poder.
Em todas essas suas arbitrariedades, qual foi a manifestação do governo brasileiro e do Mercosul em defesa das liberdades e da democracia? Nenhuma.
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