Giorgio Trucchi, Tegucigalpa – Opera Mundi – foto Giorgio Trucchi/Opera Mundi
Xiomara Castro é casada com o presidente deposto Manuel Zelaya e concorrerá pela coalizão oposicionista Libre
Depois do dia 28 de junho de 2009, quando militares invadiram sua casa a tiros e levaram embora seu marido, o então presidente Manuel Zelaya, Xiomara Castro teve que suportar ameaças, perseguições e o medo de ser presa. Escondeu-se com sua família para não ser descoberta, mas nunca se exilou. Um mês após o golpe, hospedada em um pequeno hotel do vilarejo de El Paraíso, a poucos quilômetros da fronteira com a Nicarágua, a primeira-dama tenta ser eleita presidente.
Ela lembra do sentimento de impotência que experimentou ao enfrentar o regime de Roberto Micheletti. Mas a ex-primeira-dama garante que está pronta para resistir e exigir seus direitos. “Ninguém pode evitar que continuemos lutando e ninguém pode negar que esse esforço possa servir de exemplo para todas as pessoas que sentem seus direitos violentados”, dizia na ocasião.
Três anos depois, Xiomara Castro é a candidata consensual do Partido Libre (Liberdade e Refundação), braço político-eleitoral do FNRP (Frente Nacional de Resistência Popular) e fundado por Manuel Zelaya em 2011. Em entrevista exclusiva ao Opera Mundi, a ex-primeira-dama disse estar preparada para enfrentar este novo desafio e espera contar com o carinho e o apoio do povo hondurenho.
A candidata presidencial alega não sentir rancor algum pelo o que já passou. Mas, pelo contrário, garante que, se assumir a Presidência de Honduras, convocará todos os setores do país para fomentar um verdadeiro diálogo e conquistar a reconciliação por meio de uma Assembleia Nacional Constituinte.
Opera Mundi: Já se passaram três anos. Como está o povo hondurenho?
Xiomara Castro: No dia em que ocorreu o golpe de Estado, pensaram que só haveria três dias de protestos e que Honduras voltaria à normalidade, como sempre ocorreu no passado. Pensaram que o povo hondurenho continuaria submisso em sua indiferença, em sua apatia. Mas se enganaram, porque, mesmo após três anos de golpe, o povo segue de pé, pedindo o retorno da ordem constitucional, o respeito aos direitos humanos, e exigindo justiça pelos mártires que derramaram seu sangue pelo delito de defender a democracia em nosso país. Foram três anos de crise política, econômica e social, mas o povo já está consciente de que chegou o momento de reverter o golpe de Estado. Honduras não vai mais exportar estratégias para que outros países da América Latina continuem sofrendo com golpes de Estado.
OM: A senhora se refere à situação do Paraguai?
XC: Evidente. Em Honduras vamos conquistar o poder. O povo vai retornar ao poder e vamos refundar nossa pátria mudando esse sistema que não dá respostas e oprime aos que mais sofrem no país. Vamos mudar porque queremos um sistema justo, igualitário, onde todos e todas tenham oportunidades. Vamos provar, com nosso exemplo, com o povo em luta e com esse sangue derramado, que somos capazes de mudar a história dos países e que é possível nunca mais ocorrer um golpe de Estado na América Latina.
OM: Qual é sua opinião sobre os objetivos do Congresso de Honduras ao introduzir na Constituição a figura jurídica do “juízo político”?
XC: Deveria ter sido discutido, mas vou mais além. Creio que deveríamos considerar a introdução da “morte cruzada” e do “referendo revocatório”, isto é, que não sejam os deputados os responsáveis por decidir o futuro do país, mas sim todo o povo. É necessária a participação do povo em todas as decisões tomadas e isso faz parte das propostas que vamos levar adiante.
OM: Em algum momento você imaginou que, três anos após o golpe, iria ser candidata à Presidência de Honduras?
XC: Nunca imaginei. Nunca pensei que fôssemos avançar tanto e nem que o povo iria perceber a necessidade de mudar radicalmente as coisas de nosso país. Aqueles eram dias de violência e terror e eu via um povo valente enfrentando as armas, lutando contra o poder que de fato estava se instalando no país. Eu me juntei às pessoas. Crescemos em consciência e percebemos que Honduras nunca mais seria a mesma.
OM: A senhora pensa que os setores que planejaram e executaram o golpe e que, dessa forma, estão à frente das instituições de Honduras, vão permitir mudanças?
XC: Eu acredito que o povo defenderá as urnas e confio no desejo expresso pelos eleitores. Vai ser muito difícil implementar uma fraude neste processo eleitoral que vivenciaremos. Confio também nos países amigos, que vão vigiar a transparência desse processo.
OM: A FNRP e o Libre mantêm a posição de que a luta para o poder deve ser pacífica?
XC: Só conhecemos este caminho para o poder. Nós nos opomos ao uso de armas e da força bruta e demonstramos isso durante estes três anos de luta firme, mas pacífica. Os outros são os que usam da violência; nós somos os que tivemos mortos, que sofremos perseguições e violações dos direitos humanos. Nunca levantamos a mão contra algum irmão ou irmã que não possui as mesmas opiniões que as nossas.
OM: Quais vão ser as primeiras medidas que você irá tomar caso seja eleita presidente do país?
XC: O objetivo primordial da aliança Libre será refundar o país e chegar a um verdadeiro pacto social que reconcilie a sociedade hondurenha. No mesmo dia da posse, vamos nos sentar com todos os setores e vamos convocar uma Assembleia Nacional Constituinte, para iniciar com passos firmes este novo processo e, assim, lançar bases sólidas para a democracia.
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