Fernanda Câncio – Diário de Notícias, opinião
A equipa que veio proceder à quinta avaliação da troika chegou a 28 de agosto. Dois dias depois, Passos chamou Seguro a São Bento para uma reunião urgente. A 3 de setembro, segunda, retoma as reuniões semanais com o Presidente. Na sexta 7, dirige-se ao País, não para, como se esperava, anunciar medidas adicionais para "compensar" a derrapagem do défice de 2012, mas para comunicar o que apresentou como "consequência" da declaração de inconstitucionalidade da suspensão dos subsídios de Natal e de férias de funcionários públicos e pensionistas. Mantendo o corte dos dois subsídios a pensionistas e um aos funcionários públicos, e acrescentando a estas medidas já declaradas ilegais pelo Tribunal Constitucional a subida da taxa social única para trabalhadores do privado e do público e a diminuição da mesma para empregadores.
Sobre a matéria do anúncio, já tudo foi dito, por gente de todos os quadrantes políticos e jurídicos. Não restam pois dúvidas sobre a irresponsabilidade lunática, cruel e delinquente de Passos e Gaspar, coadjuvados pela luminária Borges e pelos troikanos. Mas que dizer da atitude do parceiro de coligação, cujo líder, à chegada a Portugal, a 11, declarou "ir convocar a comissão política e conselho nacional do CDS para saber a opinião do partido e dirigentes sobre estas medidas"? Das duas uma: ou Portas não foi ouvido, como ministro, sobre as medidas, ou foi. Em qualquer das hipóteses, a sua atitude resulta no mesmo: a coligação acabou. Não é admissível que reserve publicamente a sua opinião sobre uma decisão do governo de que faz (?) parte.
Mas há mais. Se Passos chamou Seguro logo no dia 30, não será porque tinha algo de muito importante para lhe comunicar? E é admissível que, a 3, quando reúne com Cavaco, nada lhe tenha adiantado sobre as medidas que anunciará dias depois? O Presidente estava obrigado, pelos seus deveres de zelar pelo funcionamento normal das instituições democráticas e pelo respeito à Constituição, a alertar Passos para o clamoroso desrespeito pelo TC e aconse- lhá-lo a repensar - até porque detém o poder de pedir a fiscalização preventiva da inconstitucionalidade. Mas, sabemos, Passos fez o anúncio.
O Presidente mantém (até ao momento em que escrevo) silêncio absoluto, em contraste patente com as suas declarações aguerridas sobre o OE 2012. Os cavaquistas do PSD, porém, com o alter ego Ferreira Leite à cabeça, saíram a terreiro apelando à sublevação geral - incluindo, pasme--se, do grupo parlamentar escolhido por Passos. Querem que chumbe o Orçamento. Ou seja, mandar o Governo abaixo. E, como em março de 2011, nem falta a "manif".
É justiça poética, dir-se-á. Para Passos e Portas, sem dúvida: os gulosos que derrubaram o Governo PS tornando inevitável o resgate veem--se traídos pelo seu cúmplice de ocasião. Cavaco, o apolítico, viu mais uma oportunidade de mexer os cordelinhos e fazer xeque-mate. E desta vez, se possível, sem ter de arriscar sequer abrir a boca.
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