sábado, 20 de outubro de 2012

A QUEM SERVE O CAOS NA EUROPA?

 


Fernando Santos – Jornal de Notícias, opinião
 
A Europa tem-se agitado em sucessivas cimeiras marcadas por promessas e mãos-cheias de nada. Agonizante, não obstante viver entre um círculo mais amplo (o da desUnião) e outro ainda pior e claustrofóbico (o da Zona Euro), o Velho Continente está em vias de deitar borda fora algumas das principais conquistas civilizacionais de que é farol - o Estado Social, por exemplo. À mercê de diretórios políticos montados sem a legitimação do voto popular, os pratos da balança do exercício estratégico parecem simples de se reconhecerem: de um lado pesa um certo romantismo dos povos economicamente mais débeis e do outro a avidez imperialista de rosto germânico para o esmagamento.
 
O dedo na ferida sobre as razões e o fito para o estado comatoso da atual Europa assinou-o há pouquíssimos dias Joseph Stiglitz, Prémio Nobel da Economia em 2001. Assessor económico de Bill Clinton entre 1995 e 1997 e distinguido pela Academia "por criar os fundamentos da teoria dos mercados por informações assimétricas", Joseph Stiglitz considerou, em entrevista ao jornal financeiro "Haldesblatt", que "o euro e as políticas destinadas a salvar o euro dividem os europeus. Trata-se de divisões entre estados, mas também no interior destes, onde os movimentos extremistas e nacionalistas se tornam cada vez mais fortes. E isto não é bom para a paz".
 
Ora aí está um foco de clarividência avisada. A depauperada condição económico-financeira de uma parte dos países integrantes da Zona Euro, sobretudo os do Sul, tende a gerar convulsões sociais cujas consequências será avisado travar quanto antes. De critério pouco ou nada explicado, o recente Prémio Nobel atribuído à União Europeia fundamenta-se, sobretudo, nas décadas de pacificação entretanto registadas.
 
Ao ter trocado o processo de união política pelos ditames abastados das exigências da Alemanha para satisfazer padrões mínimos do estado de necessidade financeira de uma parte da Zona Euro - Grécia, Irlanda, Portugal, amanhã Espanha, Itália, França... - a Europa está num processo de degradação que não adivinha, de facto, nada de bom.
 
A cimeira de líderes (pomposa definição...) europeus deu nota nas últimas horas de como se continua a cavar um caminho cada vez mais estreito para não apunhalar de vez os fundamentos da criação da União Europeia. Ao preconizar outra vez o poder de veto da Comissão Europeia sobre os orçamentos nacionais que excedam os 3% de défice e os 60% de dívida pública, a chanceler alemã mostra como está obcecada na opressão de vários povos europeus. Angela Merkel quer a Europa de cócoras perante os seus desígnios e faz de conta que não percebe estar a agitar um barril de pólvora. Assim como assim, está por provar que o poderio económico-financeiro se substitua à força das armas na subjugação dos povos.
 

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