Se acordo for
fechado, países sul-americanos deverão investir menos em armas e o comércio de
cocaína deverá ser reduzido, dizem especialistas. As duas partes começam em
Oslo a discutir a paz pela quarta vez em 30 anos.
A quarta tentativa
de um acordo de paz entre o governo da Colômbia e o comando das Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia (Farc) começa oficialmente nesta quinta-feira
(18/10) em Oslo, na Noruega. As negociações devem se estender até o meio do ano
que vem e serão concluídas na capital cubana, Havana.
Caso um acordo seja
fechado, especialistas concordam que a paz não terá apenas um importante
significado para a Colômbia, mas também para toda a região. Segundo Hubert
Gehring, diretor da Fundação Konrad Adenauer na Colômbia, o acordo deverá
fortalecer a América Latina não só no campo econômico, mas também no campo
político.
Também deverá haver
um processo de integração maior entre a Colômbia e seus países vizinhos, pois a
perseguição a membros das Farc culminou na invasão de territórios vizinhos. Além
disso, o governo colombiano, que investe muito no Exército do país para
combater as Farc, deve diminuir os repasses e, assim, economizar dinheiro. E
outros países sul-americanos, até então preocupados com a situação na Colômbia,
deverão fazer o mesmo.
"Esse diálogo
com as Farc vai ser benéfico porque esses países vão poder canalizar
investimentos que iam para iniciativas militares para obras, desenvolvimento e
saúde. Questões ambientais e sociais vão ser privilegiadas", avalia
Argemiro Procópio, professor de Relações Internacionais da Universidade de
Brasília (UnB).
Comércio de drogas
Hoje a Colômbia é o
terceiro maior produtor de cocaína pura na América do Sul, atrás do Peru e da
Bolívia. A previsão é de que, mesmo com o fim das Farc, o país continue como
grande exportador da droga. "Talvez haja menos crimes violentos no
processo", afirma Procópio.
Já Gehring está
convencido de que, se houver cooperação entre os países, o narcotráfico poderá
ser diminuído substancialmente. Porém, o comércio de drogas não deve
desaparecer rapidamente, já que alguns soldados das Farc devem atuar em outras
organizações criminosas.
León Valencia,
diretor-executivo da ONG colombiana Corporación Nuevo Arco Iris, também afirma
que, se houver um acordo de paz com as Farc, o tráfico de drogas poderá até ser
reduzido, mas não deverá acabar.
"O que se
retira é a bandeira política, quer dizer, a relação entre a política e o
tráfico de drogas. Mas, sem dúvida, o comércio das drogas não vai terminar. O
crime organizado internacional vai continuar impulsionando tanto o cultivo
quanto o processamento da cocaína", frisa.
Tentativas
fracassadas
Esta é a quarta
tentativa oficial de negociações com a guerrilha em 30 anos. A anterior havia
ocorrido há exatos dez anos, quando o governo colombiano ordenou a suspensão
das conversas por considerar que a guerrilha tinha aproveitado a
desmilitarização de uma parte do território para se reforçar. Desta vez, o
presidente colombiano excluiu a possibilidade de um cessar-fogo antes de se
chegar a um acordo final.
Pelo fato de a
agenda de discussões ser muito extensa – e conter temas de grande repercussão –
é difícil prever se será divulgado um acordo de paz até julho de 2013, data
prevista para o fim das conversações.
"Se as
negociações vão dar certo, ninguém sabe. Mas eu acredito que as condições e as
perspectivas desta vez são melhores do que nunca", conclui Gehring.
Cinco décadas de
conflitos
Fundadas em 1964
durante uma revolta popular, as Farc são a maior e mais antiga guerrilha da
América do Sul. Com o passar dos anos, porém, a guerrilha foi deixando para
trás as antigas motivações políticas que levaram à sua criação.
Suas ações estão
intimamente ligadas ao narcotráfico e incluem sequestros e outros crimes
violentos. Segundo estimativas, os quase 50 anos de conflitos custaram a vida
de mais de 200 mil pessoas.
"Temos muita
esperança de que (as negociações) terminem num acordo de paz. O Estado se deu
conta de que é impossível acabar a curto prazo com as guerrilhas pela via
militar", disse Valencia.
Para especialistas,
esse é o momento ideal para o diálogo, já que as Farc estão se enfraquecendo. O
movimento, que segundo estimativas já reuniu cerca de 15 mil guerrilheiros,
hoje tem pouco mais de 7 mil.
"Apesar da
fraqueza e da incapacidade de chegar ao poder pela via militar, a guerrilha tem
participado da agenda política nacional e internacional nos últimos 20 anos. Por
isso o Estado precisa sair desse conflito marginal, que impacta a política de
uma maneira impressionante", frisa Valencia.
Modelo esgotado
Com o apoio dos
Estados Unidos, o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe (que ficou no poder de
2002 a 2010) iniciou uma guerra sangrenta contra os rebeldes, incluindo
violações aos direitos humanos.
O atual presidente
colombiano, Juan Manuel Santos, ex-ministro da defesa de Uribe, manteve a
política de embate com a guerrilha. Porém, ao contrário de seu antecessor,
Santos vem se mostrando mais aberto ao diálogo.
"Acho que as
Farc chegaram à conclusão de que esse modelo está um pouco esgotado, sobretudo
porque eles têm um momento privilegiado na América Latina, ou seja, um governo
colombiano que tem disposição ao diálogo", afirma Procópio.
Mas o caminho para
a paz é ainda muito longo. Nos próximos dez meses, o governo colombiano e a
guerrilha discutirão uma agenda composta por cinco temas centrais: reforma
agrária, garantia do exercício político dos antigos guerrilheiros, fim do
conflito armado, narcotráfico e, por último, o direito das vítimas dos ataques
entre a guerrilha e o governo colombiano.
Autor: Fernando
Caulyt - Revisão: Mariana Santos
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