Ana Sá Lopes – i online,
opinião
O simbólico veto do
Presidente deixa antever o grau de agonia do governo
O Orçamento do
Estado que vai ser hoje entregue pelo governo já foi chumbado pelo Presidente
da República.
É um facto que o
Presidente português tem uma fórmula estranha de produzir os seus juízos
políticos – resguarda-se nas instâncias simbólicas tradicionais (vide discurso
do 5 de Outubro) e é profundamente cáustico em fóruns alternativos. Mas o post
no Facebook, colocado no fim-de-semana a cavalo nas recentes declarações do FMI
sobre os malefícios da austeridade, é um veto por antecipação. O Presidente
está contra a estratégia do governo perante Bruxelas, contra o Orçamento e
contra a negociação das metas do défice que este fez com a troika. Ficámos a
saber que, depois do PS, também o Presidente já não faz parte do “consenso
nacional” à volta da aplicação do memorando.
É um facto que
Cavaco Silva diz que a culpa é das instâncias internacionais (e também é) e
afirma “esperar” que os avisos da senhora Lagarde e do senhor Blanchard cheguem
“aos ouvidos dos políticos europeus dos chamados países credores e de outras
organizações internacionais”. Mas o Presidente afirma, “em linguagem simples”
que “nas presentes circunstâncias, não é correcto exigir a um país sujeito a um
processo de ajustamento orçamental que cumpra a todo o custo um objectivo de défice
público fixado em termos nominais”. Ou seja, morreremos todos – e é o supremo
magistrado da nação a dizê-lo – se o governo puser em prática o Orçamento que
vai hoje entregar no parlamento.
A declaração de
Cavaco Silva vem mostrar o profundo isolamento de Passos Coelho na liderança de
um governo fracturado – e não é apenas a fractura exposta da coligação que mina
a coesão governamental. O eleitorado do PSD já não se revê no governo, Passos
tem contra si a maior parte dos barões e dos antigos líderes e a estrondosa
derrota nos Açores pela qual se responsabilizou foi uma amostra optimista do
que espera Passos Coelho e o PSD na próxima vez que for a votos.
Estamos a assistir
aos últimos dias de um ciclo político, de uma coligação ferida de morte, de um
governo com a credibilidade interna totalmente minada e cuja capacidade de
regeneração – através de uma remodelação, por exemplo – já parece impossível. O
simbólico veto do Presidente, por antecipação e via Facebook, à linha do
Orçamento deixa antever o grau de agonia de um governo confrontado com uma
missão impossível em democracia: destruir o seu povo sem que alguém o trave.
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