João Marcelino –
Diário de Notícias, opinião
1 Multiplicam-se as
vozes que no CDS e no PSD exigem ao Governo que abandone a pose de aluno bem
comportado e parta para uma interação mais dinâmica com os credores
internacionais, na linha do que tem sido sugerido tanto pelo líder do PS, como
por vários senadores da vida pública portuguesa que se têm pronunciado nas
últimas semanas.
É urgente que isso
se faça, de facto. As palavras de Lagarde sobre a inflexibilidade das metas
nominais são um bom ponto de partida para uma atividade diplomática que ampare
os resultados do programa de ajustamento português que inevitavelmente hão de
surgir no futuro.
Sejamos claros: se
nenhum milagre acontecer, daqui a um ano, delapidado o consenso social e
político, este Orçamento do Estado, que vai sair da Assembleia da República por
entre gritos e protestos populares, terá destruído vários mitos.
O primeiro (dos
mitos) diz respeito à autoridade técnica de Vítor Gaspar, que já falhou o
défice deste ano (no final terá ficado, como mínimo, dois pontos acima dos 4,5%
inicialmente previstos...) e está na rota para outro buraco. Não se conhece
quem acredite que o PIB nacional só vá contrair um ponto em 2013. Se o fisco se
apresta para esganar os contribuintes da classe média para baixo, como poderá a
economia não contrair pelo menos tanto quanto este ano? Agarrando nas recentes
retificações do FMI quanto à proporcionalidade do efeito recessivo das medidas
que diminuem a despesa pública... é fazer as contas. A partir daí imaginem-se
as consequências no défice (por contração das receitas e aumento da despesa) e
no incremento da dívida.
O segundo mito tem
a ver com o virtuosismo deste caminho de austeridade. Se ele, na vida real, não
produz os efeitos imaginados nos gabinetes e nos centros de estudo, se faz
sofrer as pessoas sem qualquer benefício, então para quê insistir? Porque não
adaptá-lo no tempo, na dimensão e, sobretudo, nos juros leoninos que ele rende
(nove mil milhões por ano) aos benfeitores que nos pagam as faturas?
O terceiro mito tem
a ver com a crença de que, nesta história, tem de ser sobretudo a reforma do
Estado a puxar pela economia. "Sim, mas." Se não se equilibrar esta
equação, ou seja, se não se incrementar a economia de forma a ela poder amparar
os sacrifícios exigidos em cada etapa, a situação portuguesa vai ser, durante
muitos anos, comparável à de um automóvel que acelera na lama: afunda-se mas
não avança e suja toda a gente que esteja em volta. Neste caso são (quase)
todos os portugueses.
2 É aqui que entra
a necessidade da diplomacia, na qual o ministro dos Negócios Estrangeiros,
Paulo Portas, também tem andado desaparecido. É preciso que Portugal fale, e a
várias vozes, em todas as oportunidades. Que explique aos parceiros europeus o
que está a fazer e os faça compreender que a vontade pode não ser suficiente
para que a consolidação orçamental se faça no tempo desejado e desejável.
Portugal tem de combater a ideia, genericamente aceite pela opinião pública da
Europa do Norte (e que em parte fizemos por merecer), de que não quer fazer os
esforços adequados à alteração do seu modo de vida. Em vez de gastar o tempo
com as sibilinas indiretas ao PP, que só meia dúzia de pessoas do "melhor
Povo do mundo" entendem, Vítor Gaspar pode utilizar a formação que segundo
ele o País lhe proporcionou, e o crédito internacional que julga que tem, dando
a cara por um ajustamento credível.
Claro que os
resultados destas iniciativas e intervenções não serão imediatos. Nada
acontecerá de bom para as nossas necessidades, infelizmente, no curto prazo.
Merkel tem eleições em outubro e percebe-se o peso destas no arrastar das
decisões comunitárias. Mas há fóruns que devem ser aproveitados.
Esta diplomacia
justifica-se tanto pela necessidade externa como interna.
É preciso que os
portugueses voltem a ver os governantes como pessoas que se batem pelo País e
não apenas como feitores que executam, capatazes que cumprem. Diplomacia não é
só Vítor Gaspar agachar-se para falar com o seu homólogo alemão. Tem de ser
muito mais do que isso e quanto mais depressa melhor porque este Orçamento do
Estado só por milagre abaterá o défice na medida prevista. E se forem
necessárias mais medidas o Governo não resistirá à necessidade das pessoas,
sujeitas à "dor" de que fala, e prevê, Abebe Selassie, o rosto do FMI
para Portugal. Há riscos, sim. E o Governo também não está imune a eles, pese a
maioria no Parlamento.
Depois da TSU e do
IMI, o Governo anunciou um corte de 10% no subsídio de desemprego mínimo e em
outras despesas sociais. Recuou, depois, e em toda a linha, em menos de 24
horas. Pedro Mota Soares acha que tudo se deveu ao "diálogo social"
mas a ideia é de que no Governo as medidas se preparam depressa e com muito
improviso. E o PP, neste caso, até não pode fingir que a culpa é do parceiro de
coligação...
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