Nuno Ramos de
Almeida – i online, opinião
O documento que vai
ser votado no parlamento a 31 de Outubro não vale o papel em que é escrito.
Ganharia mais facilmente prémio da literatura fantástica que o da Economia
O Orçamento do
Estado de 2013 é um exercício de injustiça, mentira e inutilidade que serve
para esmifrar sempre os mesmos. Quando lemos a página 49 do documento do
governo Gaspar tropeçamos num quadro em que se mostram os sectores em que
incidem as chamadas medidas de consolidação orçamental. Fazendo as contas,
reparamos que as empresas contribuem com 214 milhões de euros, o Estado com 750
milhões e os reformados e assalariados com mais de 3800 milhões de euros. Uma
gritante injustiça, mesmo sem contar que os cortes das despesas sociais e do
Estado significam que vai ser exigido um esforço ainda maior àqueles que
trabalham. A saúde, a habitação, os transportes, a educação e a energia vão ser
ainda mais caros.
Não é novidade
nenhuma que em Portugal quem paga a crise são os mais pobres: um estudo
elaborado a pedido de instituições da União Europeia sobre a incidência do
esforço de austeridade em seis dos países mais afectados pela crise (Grécia,
Estónia, Irlanda, Reino Unido, Espanha e Portugal), entre 2009 e 2011, concluía
que Portugal é o único em que as medidas de austeridade exigiram aos pobres um
esforço financeiro superior ao que exigiam aos ricos.
Mas o Orçamento do
Estado não é só injusto, é também mentiroso. O documento do executivo aponta
objectivos que sabe à partida serem impossíveis de atingir: quando todos os
especialistas e instituições internacionais afirmam que o PIB vai contrair
entre 2% e 5%, o governo jura pelas alminhas que a recuperação começa para o
ano e o PIB vai contrair apenas 1%. No ano passado o governo previu que as
receitas do IVA subiriam 11,6%; no final verificou-se que caíram 2,6%. Para
este ano, os émulos de Passos Coelho garantem, pelos olhinhos dos ministros que
a terra há-de comer, que as receitas do IVA vão crescer 2,2%... Estamos em
pleno domínio do país do faz-de-conta.
O pior de tudo é
ser um documento inútil porque não vai garantir aquilo que se propõe e vai
piorar tudo o resto. Não consegue sanear as finanças públicas e a miséria e o
desemprego vão atingir níveis recorde.
A nossa dívida
pública está a atingir 120% do PIB – muito pior que no início da chamada ajuda
da troika. Para atingirmos os critérios exigidos para a adopção da moeda única,
os 60% do PIB, seria necessário que nos próximos 20 anos tivéssemos um saldo
positivo das nossas contas na ordem de 5 mil milhões de euros anuais. Nem a
Europa nos dá 20 anos, nem isso é viável com um país que está a contrair do
ponto de vista económico e em que os encargos da dívida são cada vez maiores.
Aliás, vamos pagar mais de 33 mil milhões de juros pelos 78 mil milhões que a troika
nos emprestou. O mesmo dinheiro que o FMI e as instituições da Europa emprestam
aos bancos a 1% custa aos portugueses “ajudados” quase cinco vezes mais.
A 31 de Outubro o
parlamento vai votar este documento. A 12 de Novembro desloca-se a Portugal a
chanceler Merkel para saudar a habitual obediência dos nossos governantes e
exigir o nosso silêncio. Está na altura de mostrar àqueles que nos querem impor
a miséria que temos o direito à palavra e a decidir a nossa vida.
Editor-executivo,
escreve à terça-feira
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