Tiago
"constrói" em Angola o porto de abrigo para enfrentar a crise
24 de Novembro de
2012, 08:46
Eduardo Lobão, da
agência Lusa
Luanda, 24 nov
(Lusa) - Engenheiro civil de formação, Tiago Guedes chegou em abril passado a
Luanda para fugir da crise económica em Portugal e a experiência, até agora bem
sucedida, permite-lhe dizer que está a "construir" em África o seu
porto de abrigo.
Embora esta
primeira experiência profissional fora de Portugal esteja a correr bem, Tiago
lamenta ter sido "obrigado" a emigrar, porque a empresa em que
trabalhava em Portugal entrou em insolvência e a estagnação no mercado de
trabalho abriu-lhe as portas da emigração.
"Emigrei para
combater o que se adivinha, e já saí tarde. Tive uma oportunidade há dois anos,
mas perante a estagnação do mercado de trabalho, mal tive uma oportunidade,
optei por sair", explica.
Tiago Guedes diz
ter saído de Portugal numa "perspetiva de curto prazo, de dois anos",
mas reconhece agora não saber quando vai regressar, porque, antecipa,
"Portugal vai continuar a sangrar".
"Há problemas
muito graves relacionados com a crise em Portugal e falta dinâmica na economia
e qualidade no sistema judicial. Depois temos a crise de natalidade. Eu, por
exemplo, tenho 32 anos e não penso ter filhos neste momento", confessa,
considerando que a saída contínua de jovens recém-formados é resultado da crise
e acentua-a.
Os jovens como ele,
formados e "muito bem treinados" dadas as caraterísticas positivas
das universidades portuguesas, encaixam-se bem noutros mercados, considera.
"Somos pessoas
muito flexíveis, desenrascados e com uma componente de produção e eficácia
muito boa, que permite encaixar em diferentes mercados, permitindo que pessoas
com boas qualificações vão para fora e não voltem. Adaptam-se", defende.
Com o aumento do
desemprego, sobretudo entre os escalões etários mais jovens e o receio de que
mais empresas fechem portas em Portugal, acumulando-se os salários em atraso,
Tiago Guedes não antevê alternativas à emigração.
"O desespero
está instalado. As pessoas têm receio que as suas empresas possam fechar. Por
exemplo, a empresa em que trabalhava em Portugal pediu insolvência. Eu tinha
ordenados em atraso e vi-me com contas por pagar. (Emigrar) custou-me ao
início, mas adaptei-me. Ganhei umas coisas e perdi outras, mas sobretudo ganhei
mais tempo para mim", assinala.
Apesar da
distância, Tiago Guedes continua a acompanhar a realidade portuguesa, vendo
diariamente os serviços de notícias que lhe chegam pela televisão de cabo e as
saudades que se acumulam vai agora atenuá-las no Natal, porque não prescinde de
rever os familiares mais chegados e os amigos.
A adaptação de
Tiago Guedes a Angola, país onde ainda vive o sogro, foi facilitada porque
logrou fazer-se acompanhar da mulher, consultora com experiência de viagens de
trabalho de curta duração ao continente africano.
O vencimento que
aufere também foi determinante, reflexo de uma economia que classifica como
"efervescente".
"É uma
economia efervescente, sente-se que há muito dinheiro e muito trabalho. E a
nível pessoal uma pessoa tem que se ajustar, porque se ficar bloqueada no medo,
custa muito", reconhece.
Quanto ao futuro de
Angola, Tiago, pelas conversas com o sogro e colegas de trabalho mais velhos,
diz aperceber-se de que se trata de um país "que tem tudo para ser uma
potência".
"As coisas
estão a melhorar, há cada vez mais redes, há ainda o problema do saneamento
básico e do abastecimento elétrico e água, mas que vão sendo resolvidos com o
desenrolar dos anos e com o muito dinheiro que há", destaca.
Sete meses depois,
como trabalhador emigrado, Tiago Guedes faz um balanço positivo e até já
convenceu um amigo, da mesma área profissional, a mudar-se para Angola.
"Já dei esse
conselho a um ex-colega de trabalho. A empresa em que trabalhava estava a
fechar, como a minha, e ele veio. As pessoas têm de fazer pela vida, seja para
aqui, Brasil ou um país de leste", conclui.
EL // VM.
Crise em Portugal é
oportunidade para "novas competências" -- Associação Industrial de
Angola
24 de Novembro de
2012, 08:46
Nisa Mendes, da
agência Lusa
Luanda, 24 nov
(Lusa) - A crise económica em Portugal constitui uma oportunidade de Angola
ganhar "novas competências", através de quadros e operários
especializados portugueses, disse à Lusa o presidente da Associação Industrial
de Angola (AIA).
"O mal de uns
deve ser o bem de outros. E é neste princípio de vasos comunicantes que
Portugal também acabará por tirar algumas vantagens, na medida em que são
pessoas que vêm para Angola, que terão os seus rendimentos, que são transferíveis
(...) e obviamente que isso dará conforto e estabilidade às famílias
portuguesas", referiu José Severino.
Angola é o país
escolhido por cerca de 80 por cento dos portugueses que emigram legalmente para
fora da Europa para fugir da crise e à procura de melhores condições de vida,
referiu recentemente o secretário de Estado das Comunidades português, José
Cesário.
Para José Severino,
não existem áreas específicas para aproveitamento de mão-de-obra estrangeira,
embora o Governo entenda que neste momento "produzir é vital, é
prioritário", lembrando que a produção não é feita apenas nas fábricas,
"tem áreas periféricas".
"Por exemplo,
a nossa contabilidade enferma de insuficiência. Portugal tem contabilistas em
excesso e sem contabilidade não há empresas eficientes, portanto seria um
segmento que deveríamos explorar de uma forma dirigida", realçou.
"O país tem
que dar saltos qualitativos, céleres, seguros através da transferência de
conhecimentos", defendeu José Severino, notando que Angola enfrenta
enormes dificuldades com as novas tecnologias.
"Nós vimos as
dificuldades que temos com os nossos sistemas, a própria manutenção industrial
tem um défice terrível, Portugal tem um superavit de técnicos de
manutenção", comentou, lembrando ainda que na área da agricultura devem
ser igualmente aproveitados os conhecimentos de Portugal para o desenvolvimento
da agroindústria.
Quanto à atual lei
de imigração angolana, o presidente da AIA considera-a desajustada para o
momento que o país vive.
"Acho que a
nossa lei de imigração devia ser reajustada (...), porque num determinado
pressuposto diz que um técnico não pode ficar no país mais de três anos. Acho
isso uma contradição, (...) (porque) quando a gente devia tirar o máximo
rendimento dela estamos a mandá-la embora. Acho que há aqui um
contrassenso", justificou, adiantando que a AIA tem agendada uma reunião
com o Serviço de Migração de Estrangeiros (SME) para apresentar o seu ponto de
vista.
A mesma opinião,
quanto à importância de mão-de-obra estrangeira no desenvolvimento angolano é
partilhada pelo secretário executivo da Central Geral de Sindicatos
Independentes e Livres de Angola (CGSILA), Francisco Jacinto.
"Gostaríamos
nós que, não tendo Angola este quadro ainda suficiente para suprir todas as
necessidades que o país hoje impõe, sobretudo na área industrial ou mesmo na
agrícola, que Portugal ou outros países nos auxiliassem", disse.
Segundo Francisco
Jacinto, Angola não pode ser vista como "um país de socorro" para a
crise europeia. "Teríamos que receber portugueses, brasileiros, espanhóis,
mas qualificados de acordo com as necessidades ".
Entretanto,
Francisco Jacinto diz que nem sempre tem sido essa a realidade, porque chegam
àquela central sindical várias reclamações, dando conta que muita mão-de-obra
estrangeira que se encontra em Angola não é qualificada.
"Digamos que
não tem havido um certo controlo por parte do Governo angolano relativamente a
esta questão, ainda se registam aqui no nosso país as fragilidades
administrativas e então as pessoas vêm para cá com visto de turistas e acabam
por arranjar emprego", salientou.
"As
reclamações que recebemos de todas as empresas é que vêm para aqui os nossos
amigos portugueses, que não têm qualificação nenhuma, para trabalharem nas
prateleiras dos supermercados, para serem chefes de recolha de lixo numa
empresa, e não estamos a falar só de portugueses, também de chineses, que mesmo
nas suas obras vêm para serem motoristas quando na verdade temos aqui milhões
de motoristas", lamentou.
As áreas do
comércio e da construção civil são as mais citadas no que diz respeito às
reclamações.
NME // VM.
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