Der Tagesspiegel, Berlim – Presseurop – imagem Belortaja
Quer vendam
cimento, televisores, eletricidade ou café, os grandes grupos preferem entrar
em acordos entre si para inflacionar os preços – modelo de atuação conhecido
por “cartel” – do que correrem os riscos de entrarem em concorrência. E
apesar de essa prática ser ilegal, raramente são incomodados. Excertos.
Os respeitáveis
empresários encontravam-se quase sempre nos congressos da federação dos
profissionais de eletrónica, em Frankfurt. Faziam apresentações sobre novos
mercados, novas tecnologias e outras novidades no setor dos transformadores de
potência, dispositivos constituídos por grandes ímãs e bobinas, essenciais para
qualquer fornecedor de eletricidade. Mas após o encerramento do programa
oficial do congresso, tudo se tornava realmente mais emocionante, durante
encontros informais ou excursões de grupo.
Aí, os
diretores-gerais e os responsáveis de vendas encontravam-se em pequenos grupos,
dizem os investigadores, para “trocas de informações centradas em projetos
específicos", cujos frutos eram especialmente lucrativos. Concluíam
acordos, garantindo aos pseudoconcorrentes lucros adicionais na casa das
dezenas de milhões de euros. Os envolvidos acertavam detalhes de partilha dos
contratos e, sobretudo, os preços a praticar.
Os funcionários do
Gabinete Federal de Luta contra os Cartéis, em Bona, descobriram que, durante
pelo menos cinco anos, o Grupo Siemens, a empresa Starkstrom-Gerätebau de
Regensburg, a francesa Alstom e o gigante suíço de eletricidade ABB partilharam
o mercado alemão de transformadores, anulando toda a concorrência, em prejuízo
dos consumidores, forçados a pagar muito mais do que se os fornecedores
disputassem os preços entre si. A investigação durou quatro anos, terminando,
em setembro passado, com um conjunto de sanções financeiras. No total, as
quatro empresas e os dirigentes envolvidos tiveram que pagar €24,3 milhões de
multa ao Tesouro Federal alemão. Mas mais nada. Ninguém teve de responder em tribunal. Nenhum
protagonista foi citado nominalmente. Fora umas notícias breves, a Comunicação
Social não se alargou sobre o caso.
Falta de combatividade
na luta contra cartéis
É quase sempre o
que acontece quando os cartéis são apanhados na Europa. Todos os anos, as
autoridades para a concorrência investigam centenas de empresas que violam a
proibição de formação de cartéis. Café, detergentes, cimento e produtos
químicos, ecrãs planos e leitores de DVD, janelas e cablagens elétricas para a
indústria automóvel, até carros de bombeiros e camarões-tigre, a lista de
setores envolvidos é quase infinita.
Na realidade, o
custo do flagelo dos acordos entre grandes empresas é muito maior do que
geralmente se julga. Com base na sua experiência, as autoridades para a
concorrência concluíram que os cartéis aumentam em média 25% aos preços dos
produtos; assim, em quatro anos, recolhem o equivalente ao seu volume de
negócios anual. Obviamente, é impossível saber as quantias exatas. Afinal,
estes acordos são "filhos das trevas", como diz Jürgen Franz Sacker,
antigo juiz de cartéis e atualmente um dos principais especialistas em Direito
da Concorrência, a lecionar na Universidade Livre de Berlim.
No entanto, uma
equipa de nove economistas de três institutos de investigação europeus, a
trabalhar desde 2007 num estudo encomendado pela Comissão Europeia, concluiu
que as perdas imputáveis a acordos europeus ascendem a mais de €260 mil milhões
por ano. Ou seja, 2,3% do PIB anual na União Europeia ou duas vezes o orçamento
anual da Comissão Europeia.
A consciência do
impacto devastador deste tipo de acordos não é de hoje. Um dos mais reputados
teóricos da economia alemã, Walter Eucker, considerava a concentração do poder
económico nas mãos de sindicatos e cartéis como a fonte de todos os males da
economia de antes da guerra. Preconizava, portanto, que o Estado endurecesse a
sua posição e obrigasse a que houvesse concorrência, para baixar os preços.
Recomendações que não deram grandes resultados na vida real. Realmente, o
Bundestag votou, em 1957, a primeira lei sobre restrições à concorrência, antes
mesmo da introdução de uma legislação europeia “antitrust”, por via dos tratados
comunitários. Mas, durante muitos anos, a luta contra os cartéis tem sido
pautada por falta de combatividade e, ainda hoje, a sua eficácia é posta em
dúvida.
Surto de
condenações
Os dados sobre
reincidência não contribuem em nada para aplacar a desconfiança. Economistas
norte-americanos estudaram 283 casos de “trusts” internacionais. As conclusões
são assombrosas. Só o grupo químico alemão BASF terá participado em 26 cartéis,
entre 1990 e 2005. Quanto à petrolífera francesa Total, foi processada 18 vezes
e a [química] alemã Degussa 13.
Não podemos culpar
os investigadores de falta de zelo. Desde o início de 2010, a Comissão Europeia
esteve a trabalhar em 15 casos de grandes dimensões, em que 112 empresas foram
condenadas a pagar multas num total de quase quatro mil milhões de euros. Ou
seja, quatro vezes mais, no espaço de três anos, que durante toda a década de
1990.
As causas deste
surto de condenações não se prendem, contudo, com um empenho redobrado das
autoridades competentes, mas mais com a introdução de regulamentação generosa
relativamente às testemunhas-chave. Desde 2004, as empresas e dirigentes que
denunciem um acordo de cartel e produzam as provas necessárias à Comissão
Europeia não incorrem em qualquer penalidade, ainda que tenham sido eles
próprios no passado os principais beneficiários desses acordos.
Acrescente-se a
isso que as sanções financeiras foram limitadas a um máximo de 10% do volume de
negócios. Uma gotinha de água, como evidencia o caso do cartel das cimenteiras
alemãs, revelado em 2002. De acordo com os cálculos da autoridade da
concorrência, terão espoliado os clientes em quase dois mil milhões de euros.
No entanto, as empresas em causa acabaram por pagar €400 milhões de multa.
Benevolência não é
igual para todos
Apesar de causarem
danos consideráveis, os “trusts” pagam multas dignas de violações das regras de
trânsito. As suas ações são vistas como meras infrações. Resultado: nenhum dos
autores é pessoalmente responsabilizado perante a justiça. Na maior parte das
vezes, a opinião pública nem fica sequer a saber os seus nomes.
Já o mesmo não
acontece nos Estados Unidos da América. Aí, a participação num cartel pode, há
muito, dar uma longa pena de prisão. Em 2004, a pena máxima foi estendida para
dez anos de prisão efetiva. Irlanda e Grã-Bretanha seguiram o modelo
norte-americano. A República Federal Alemã, por seu turno, nem quer ouvir falar
nisso. O secretário de Estado Adjunto da Economia, Philipp Rösler, declarou que
o seu ministro considerava o regime de sanções em vigor "adaptado" e
tinha “reservas em relação à criminalização em matéria de cartéis pelo direito
europeu".
Se a persistência
da Alemanha em sancionar a ação de cartéis como simples pecadilhos levanta
questões, na opinião de muitos advogados essa benevolência não é igual para
todos. Os acordos em concursos públicos, chamados "licitações
concertadas", são efetivamente punidos com dureza.
UE-Comissão
Europeia
Sanção recorde
contra o cartel dos ecrãs
Dia 5 de dezembro,
“a Comissão Europeia decretou uma coima recorde de €1,47 milhões a sete
empresas que acordaram a fixação de preços dos tubos catódicos para televisores
e ecrãs de computador durante cerca de dez anos”, desde finais de 1990, refere Le Figaro. O diário parisiense lembra que a
Comissão Europeia fez buscas a essas empresas no final de 2007 e sublinha que
se tratou “da maior coima cumulativa decretada pela Comissão Europeia em
relação a um caso de cartel”.
As empresas
sancionadas são a LG Electronics, a Philips, a Samsung, a Panasonic, a MTPD
(atual filial da Panasonic), a Toshiba e a Technicolor. [...] A Chunghwa
Picture Tubes, tailandesa, que revelou a existência desta aliança, não sofreu
qualquer sanção.
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