Rita Tavares – Jornal i
Se até ao fim do
dia de hoje nada se ouvir de Belém, é porque o Orçamento entra em vigor a 1 de
Janeiro. Termina o prazo para envio prévio para o Constitucional
A partir de hoje, o
dilema do Presidente da República reduz-se a três caminhos: promulga o
Orçamento do Estado para 2013; dá luz verde à proposta mas pede a fiscalização
sucessiva da constitucionalidade; veta o Orçamento do Estado. Há hipóteses mais
plausíveis que outras, de acordo com a linha de acção habitual de Cavaco Silva,
mas há uma solução que ficará de lado já hoje, dia em que termina o prazo para
o Presidente enviar o Orçamento para o Tribunal Constitucional antes de decidir
se o promulga. Ou seja, a lei entra em vigor a 1 de Janeiro.
Claro que o dia
(este último) é longo e em Belém ninguém assegura que o facto de haver urgência
nesta matéria levasse o Presidente a não deixar esgotar estes oito dias de
prazo, enviando logo o documento para o Tribunal Constitucional. Aliás, ainda
há dois dias, Cavaco insistiu que “a lei é muito complexa, tem cerca de 250
artigos, o governo levou vários meses a preparar o Orçamento, a Assembleia mais
de um mês a discuti-lo”.
Sobre a sua
decisão, o Presidente da República deu desde logo uma garantia: terá por base
“pareceres jurídicos aprofundados”. Cavaco não disse mais, nem mesmo sobre a
notícia do “Expresso” do último sábado que indicava a promulgação do Orçamento
e um pedido de fiscalização sucessiva (tal como aconteceu no ano passado, mas
por iniciativa de um grupo de deputados).
Tranquilizar
Se este
for mesmo o caminho seguido, o argumento mais forte a seu favor é o da
estabilidade política interna e da confiança externa. A proposta entra em vigor
a 1 de Janeiro, com as medidas que o governo foi dramatizando como essenciais
para o país cumprir as metas acordadas com a troika para o próximo ano. De uma
assentada o Presidente tranquiliza governo, parceiros europeus, credores e
mercados em geral. O Orçamento de 2012 em duodécimos é uma alternativa que os
assusta e, em alguns pontos, é impraticável.
Aliás, a receita
orçamental teve o aval externo ainda antes do interno. Logo no início de
Outubro, o governo apresentou à Comissão Europeia as linhas gerais da proposta
que dias depois apresentaria ao parlamento e Durão Barroso “abençoou”: “Nós,
Comissão [Europeia], já demos a nossa aprovação a medidas alternativas que
foram apresentadas pelo governo.” Alternativas, porque entretanto Passos Coelho
teve de deixar cair o aumento generalizado previsto para a Taxa Social Única,
uma ideia defendida em Bruxelas. Mas mais do que as medidas em si, a Comissão
quis ver garantido um cocktail de propostas que assegurasse o cumprimentos dos
objectivos do Programa de Assistência Financeira. E esta urgência em garantir
metas pressiona mais Belém do que todas as preocupações constitucionais
internas.
Não romper
O
Presidente tem tido especial prudência quanto a estreias, preferindo não romper
com o que se passou em mandatos anteriores, e até hoje nenhum chefe de Estado
vetou o Orçamento ou pediu a fiscalização sucessiva da sua constitucionalidade.
Há um ano já existia a ameaça de pedidos de fiscalização sucessiva e ainda
assim Cavaco Silva promulgou o documento nos últimos dias do ano, antes do fim
do prazo para se pronunciar. E poucos dias antes da entrega do Orçamento do
Estado na Assembleia da República o Presidente até tinha dito que havia
“violação de um princípio básico de equidade fiscal” com os cortes dos
subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos.
Com tudo isto dito
e ainda o famoso “há limites para os sacrifícios que se podem pedir aos
cidadãos comuns”, o Orçamento passou e só se desviou a caminho do Tribunal
Constitucional depois, tendo sido declarada inconstitucional precisamente a
norma que Cavaco apontara como violação da equidade fiscal.
Risco político
É
colossal. No ano passado o Presidente acabou por se colocar fora do jogo, ao
promulgar apenas o Orçamento. Se desta vez intervier, pedindo a fiscalização
sucessiva, entra num jogo de risco. Caso exista inconstitucionalidade, o que
foi aplicado e cobrado mensalmente não voltará atrás, tal como aconteceu este
ano. O Tribunal Constitucional pronunciou-se, sobre a fiscalização sucessiva
dos cortes dos subsídios, em Junho mas decidiu que os cortes se mantinham este
ano porque “as consequências desta declaração de inconstitucionalidade,
poderiam colocar em risco o cumprimento da meta do défice público imposta nos
memorandos”. Seria mais um ano com o país a viver segundo normas
inconstitucionais, mas desta vez com a dúvida mais do que assumida publicamente
pelo “garante da Constituição” e único que podia ter travado o Orçamento a
tempo de evitar esta repetição, o Presidente da República. Os dias difíceis em
Belém estão longe do fim.
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