Fernando Dacosta –
Jornal i, opinião
Ao dar o título “A
Menina É Filha de Quem?” ao seu último romance (agora galardoado pelo Pen
Club), Rita Ferro ironizava com uma das nossas características mais possidónias:
o pretensiosismo social, ou seja, a snobeira da burguesia indígena.
Romances, comédias,
enredos, folhetins estão cheios de tão provincianíssima avidez; pertencer à
classe bem tornou-se objectivo de fatias crescentes de portugueses, a alcançar
sem olhar a meios nem ardis. Meios e ardis que, a bem dizer, se resumem à cama,
na respeitável variante do casamento, cerimónia adorada por todas as
instituições.
Ao ver-se enevoada
pela República e pela penúria, a velha aristocracia voltou-se para os
novos-ricos e para os dirigentes políticos com as suas proles de militantes,
apoiantes, cantantes, insaciáveis no abichar de tachos e arranjinhos.
À pala da
democracia, tal superstrutura (o chamado centrão) tudo domina, tudo trafica há
mais de 30 anos. Os lugares de privilégio pertencem-lhe em exclusivo: vejam-se
os apelidos (sonantes) dos escolhidos para as posições de conforto ainda
existentes, escolhidos não por competências mas por lóbis – de famílias, de
partidos, de associações discretas, de clubes secretos, de apadrinhamentos
oblíquos e iníquos.
Não são já precisas
princesas reais, bastam vedetas róseas; não são mais necessários soberanos
coroados, chegam padrinhos engalanados.
Nas suas memórias,
Raul Brandão dizia que a república portuguesa era a melhor imitação da
monarquia existente na Europa – por isso não havia necessidade de as alterar,
de as referendar (às duas), mereciam-se uma à outra.
Escreve à
quinta-feira
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