Margarida Bon de
Sousa – Jornal i
Pela terceira vez
numa semana, o FMI publica relatórios sobre o país. Desta vez, o prazo em
análise é maior e vai muito para além da troika
O que faz correr o
FMI? A última semana foi prolífera em termos de produção de textos daquela
instituição sobre Portugal. Nada menos do que três, sendo que o primeiro abriu
um musculado debate interno ao defender os cortes a eito nas prestações
sociais, em linha com a refundação do Estado que o governo de Pedro Passos
Coelho quer fazer.
O segundo insere-se
na sexta avaliação regular da troika. Desta vez, o FMI defendeu a redução de
três para duas das taxas de IVA (6%, 13% e 23%), num processo em que se sugere
a racionalização das taxas reduzidas e intermédia deste imposto, abrindo espaço
para uma redução da taxa normal actualmente fixada em 23%.
Finalmente o
terceiro, publicado na sexta-feira ao final da tarde, coloca a ênfase na tónica
da urgência do crescimento, fazendo projecções de médio e longo prazo, e
salientando que o maior ou menor crescimento da economia portuguesa dependerá
essencialmente do impacto das reformas estruturais em curso.
O documento afasta,
no entanto, algumas hipóteses: crescimentos acima dos 2,6%, na perspectiva mais
optimista, a manutenção de uma Europa a duas velocidades, com Portugal no grupo
de países menos desenvolvidos, e a continuação de um desemprego estrutural
elevado, a rondar ou mesmo a superar os dois dígitos.
Este último relatório
foi publicado num “Selected Issues Paper” do FMI (Country Report 13/19 ),
autorizado pelo Departamento Europeu do Fundo, mas salienta que os pontos de
vista não reproduzem necessariamente a opinião da direcção do Fundo. E
responsabiliza a equipa que o produziu: Manuela Goretti, Huidan Lin, Stephane
Roudet, Marcos Souto, Ivanna Vladkova Hollar, Andrea Lemgruber, Mauricio Soto e
Alvaro Piris. Esta publicação coincidiu com a divulgação da sexta revisão
regular do programa de resgate pela troika.
CRESCIMENTO DE 2%
A
equipa do FMI salienta que as próximas duas décadas vão depender,
essencialmente, do impacto das reformas estruturais no PIB. E traça quatro
cenários até 2030. O primeiro parte do princípio que haverá um crescimento
médio deste indicador da ordem dos 2% enquanto os factores de produção
crescerão a um ritmo menor, de cerca de 1%. O suficiente para criar emprego,
mas mantendo ainda o desemprego estrutural nos 10 a 11%. Este cenário prevê um
crescimento médio anual de 1,5% entre 2014 e 2017.
CRESCIMENTO DE 2,6%
A
segunda hipótese, a mais optimista, aponta para um crescimento médio anual de
2,75% e um aumento dos custos da totalidade dos factores de produção de 1,5%.
Nestas condições, o desemprego estrutural ficaria aquém dos 10% mas a
produtividade em Portugal manter-se-ia mesmo assim em cerca de 60% do nível dos
países com melhor indicador na UE (Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca,
Finlândia, França, Holanda, Suécia e Reino Unido). Ou seja, mesmo num cenário
de maximização do impacto das reformas estruturais em curso, estas não seriam
suficientes para colocar a nossa economia entre as mais produtivas da UE.
CRESCIMENTO DE 1,2%
A
terceira hipótese estudada pelos técnicos do FMI admite um crescimento de 1,2%
ao ano e um crescimento dos factores de produção de 0,5%. Neste caso, as
reformas não teriam os resultados esperados mas a economia ter-se-ia
redireccionado para as exportações. O processo de divergência com a UE
continuaria, contudo, a acentuar-se.
Finalmente, o
último cenário aponta para um crescimento médio anual de 0,6% e um crescimento
dos factores de produção de 0%, o que significaria que as reformas em curso não
teriam qualquer impacto.
COMPETITIVIDADE E
CRESCIMENTO
Um sector transaccionável mais competitivo será essencial para
colocar Portugal mais perto das boas práticas internacionais de crescimento.
Mas é importante que as reformas estruturais nos sectores não transaccionáveis
produzam incentivos para a inovação e cortes nos custos de produção. Os
técnicos do FMI salientam também que o sector público precisa de contribuir
mais para facilitar as dinâmicas de crescimento e de troca na economia. A
redução da burocracia é igualmente prioritária.
EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO
Embora
tenham havido significativos progressos nestas duas áreas, a força laboral
portuguesa ainda permanece na cauda da OCDE nestes dois itens. A emigração dos
trabalhadores mais qualificados – jovens licenciados – pode provocar um
diferencial ainda maior relativamente à força laboral dos restantes países da
UE. O fosso nesta área é ainda mais importante do que as deficiências nos
mercados laboral e de bens e serviços. Com o previsível aumento da emigração,
este problema estrutural poderá ainda agravar-se ao longo dos próximos anos.
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