Liberal (cv), opinião
Mui douto e
esclarecido Júlio Martins, excelência veneranda:
Permita-me, antes
de tudo, um esclarecimento preliminar. Esta não é uma missiva de críticas. É
antes uma manifestação de júbilo, pela sábia “linha de rumo” que tem sabido
imprimir às coisas!
Sei que vossa
excelência, no seu pesado e dourado encargo burocrático, não é um homem
qualquer. Não lê cartas, ouvi dizer, não perde tempo com certos jornais, como
afirmou recentemente, aliás com brilho, nem tampouco dá ouvidos, era o que
faltava!, aos cidadãos preocupados com a miséria da cidadania, essa espécie
cuja extinção verdadeiramente tarda…
Vossa excelência,
imagino, prefere entreter-se com as sinfonias de Wagner, e a lira dos poetas,
em vez de ouvir o clamor da plebe oprimida. Tem razão! É para isso que a
República lhe paga, não concorda?!
Mesmo assim,
escrevo estas linhas, porque vossa excelência, se doutamente não lê, nem por
isso aboliu ainda o direito à leitura. Assim, confio, sempre haverá a
possibilidade de alguém, mais afoito, lhe transmitir o conteúdo desta pobre
cartinha, que jamais merecerá, também o sei, pelo menos nalguns pontos mais
impertinentes, a concordância da vossa privilegiada inteligência.
Adiante!
Tropeçando nuns
papéis antigos, li algo sobre Descartes, e a sua “dúvida metódica”. E não é que
me deu, hoje, para duvidar e perguntar?! Perdoe-me o atrevimento!
É verdade,
excelência, que ainda vivemos numa República democrática, onde “Todos os
cidadãos são iguais perante a lei”?
Ou haverá, como na
fábula de George Orwell, uns espertinhos e nababos que são “mais iguais que os
outros”?
E o que tem feito
vossa excelência para fazer cumprir a regra de ouro? Pouco? Muito? Nada?
Nas minhas
inquietudes e dúvidas, nunca perdi, é bom que se diga, a fé nas suas sublimes
qualidades!
Fazer ou não fazer,
eis a questão! O cabo-verdiano, contudo, é maldoso. By nature…
Ora, se vossa
excelência impedir os contratos mafiosos, as manigâncias do Alto Clero no
poder, as alegres negociatas e traficâncias, enfim, essa escória que os nossos
ilustres cientistas chamam, avisadamente, de “boa governação”, a malta iria
logo dizer que V. Exa é “antipatriota”, negativo, do contra, reaccionário, o
diabo!
Bem anda, pois, em
deixar correr o marfim…
A inacção, o não
fazer, e o fingir, docemente, que se faz, é também uma forma digna de fazer e
agir, e nisso vossa excelência é mestre e catedrático. Magna Cum Laude!
O Procurador,
tenham ciência disso os néscios, não é nomeado para atrasar os “negócios” da
República, ora essa!, nem para incomodar o Governo, que, na sua justa
governança, sempre deixa espaços para a comilança, de uns e de outros…
E vossa eminência
não é parvo! De que vale barafustar se “o mundo sempre foi assim”?!
De que vale clamar,
quixotescamente, pela “Constituição” se ela não passa, afinal, de um inútil rolo
de papel?
Vossa excelência
esteja descansado, a sua Prokuratura tem sido exemplar! Magnífica.
Qual norma qual
carapuça!
O dr. Júlio Martins
há muito compreendeu que, neste mundo, “tudo muda, tudo se transforma”.
A moral deles pode
não ser a nossa moral e Maquiavel, esse gigante divinal, patrono de todos os
déspotas, é que estava certo, ao qualificar a lei como uma mera questão de
estratégia.
Sun-Tzu em vez de
São Tomás d’ Aquino. O Príncipe em vez da Declaração Universal dos Direitos do
Homem. Punir o Nuno Marques (que, num artigo de opinião, lamenta uma década de
silêncios e cumplicidades, e clama pela liberdade de crítica, que chato!) e
deixar em paz José Maria Neves, que fez mil vezes pior, cometendo até alguns
crimes, mas é, para todos os efeitos, o nosso querido Primeiro-Ministro.
Excelência: já vou
longo. Auguro-lhe as maiores felicidades neste novo ano de Cristo.
Continue a agir
como faz, que faz bem, defendendo, habilmente, o nosso Governo dos ataques
desses maldosos e incapazes, que só sabem apontar falhas quando deviam
reconhecer méritos, cerrando, como faz aliás V. Exa, fileiras à volta do
impoluto Órgão de Soberania.
Tenha mão de ferro,
dr. Júlio, com os inimigos da pátria, e todos aqueles que invocam o nome da lei
em vão, descrendo da capacidade e dedicação dos humildes governantes!
Deste seu orgulhoso
admirador,
CASIMIRO DE PINA
P.S.: Dizem, por
aí, que V. Exa é fraco com os fortes e forte com os fracos. É falso! Vossa
eminência tem perseguido, sim, o crime e a indisciplina, defendendo a honra das
instituições e dos lídimos representantes deste país. Sou testemunha dos seus
feitos. Criticar, é certo, mas com respeitinho, como nos bons velhos tempos do
também douto Salazar. Essa gente pensa que os jornais servem para expor os
governantes. Não sabem o mal que fazem ao turismo e ao investimento directo
estrangeiro!
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