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Bissau, 05 fev
(Lusa) - Líderes da comunidade islâmica da Guiné-Bissau vão pronunciar na
quarta-feira, no Parlamento do país, uma Fatwa (decreto religioso) proibindo a
prática da excisão, disse hoje à Lusa Fatumata Djau Baldé, ativista dos
Direitos Humanos.
"A Fatwa é uma
lei, um decreto islâmico que é produzido nas comunidades islâmicas. Já que na
Guiné-Bissau essa prática (a excisão) é justificada como sendo uma recomendação
do Islão, então os líderes islâmicos disseram que quem quiser praticar esse ato
pode continuar a fazê-lo mas não em nome do Islão", afirmou Fatumata Djau
Baldé.
A presidente do
Comité Nacional de Luta para o Abandono das Práticas Nefastas, um consórcio de
18 ONG (organizações não-governamentais) nacionais e estrangeiras, falava à
Lusa a propósito do Dia Internacional da Tolerância Zero quanto à mutilação
genital feminina, que se assinala na quarta-feira.
Na Guiné-Bissau,
esse dia será comemorado em diversas zonas do país, mas o ato central será no
Parlamento onde, sob a coordenação do Comité dirigido por Fatumata Baldé, vão
estar presentes cerca de 200 imãs guineenses que irão pronunciar a Fatwa.
"São os próprios
imãs que dizem que essa prática não é uma recomendação do islão, tanto que na
comemoração amanhã (quarta-feira), do Dia Internacional da Tolerância Zero aqui
na Guiné-Bissau, o ato central vai ser um encontro com cerca de 200 Imãs no
Parlamento para a adoção de um Fatwa, interditando a prática da mutilação
genital feminina nas comunidades islamizadas", precisou Djau Baldé.
A presidente do
Comité referiu que o trabalho da sua organização junto dos líderes islâmicos,
para que os próprios desaconselhem a prática da mutilação, "tem dado
frutos" nos últimos anos.
"A situação
não é aquela que nós queríamos, mas estamos num bom caminho. Há uns quatro,
cinco anos, era difícil falar do assunto excisão, hoje em dia falamos desse
tema nas mesquitas. Debatemos essa questão com os imãs a nível nacional",
disse Baldé, antiga ministra dos Negócios Estrangeiros guineense.
"Os líderes
islâmicos disseram quem quiser praticar esse ato pode continuar a faze-lo mas
não em nome do Islão, isto porque, apesar de o islão ter mencionado essa
prática (nos livros) ela não é uma recomendação do Islão", observou Djau
Baldé, realçando o valor simbólico da Fatwa.
A ser adotada, será
a primeira vez que uma Fatwa é pronunciada na Guiné-Bissau, um Estado laico mas
com uma comunidade muçulmana que representa 45 por cento da população. O
animismo (crenças tradicionais) é praticado por 50 por cento da população,
enquanto o cristianismo por apenas 5 por cento.
Em entrevista
recente à agência Lusa, em Lisboa, a ex-ministra da Justiça Carmelita Pires
alertou para "o hiato entre lei e prática" na Guiné-Bissau e para as
"resistências" da comunidade que pratica a mutilação genital feminina
no ritual do "fanado".
"Gostaria que
esta lei não fosse como muitas outras e que, do ponto de vista da sua aplicação,
não caia em saco roto, o que, infelizmente, na Guiné tem acontecido
muito", vincou Carmelita Pires.
A ex-ministra da
Justiça assinalou, por outro lado, que a aprovação, em outubro de 2011, da lei
sobre mutilação genital feminina na Guiné-Bissau é reveladora de uma mudança,
para a qual contribuiu igualmente "um trabalho muito sério das
organizações não-governamentais no terreno e dos parceiros de desenvolvimento
para os direitos das mulheres e crianças".
Estima-se que 140
milhões de mulheres tenham sido submetidas à mutilação genital feminina e que
três milhões de meninas estejam em risco anualmente. A prática, que causa
lesões físicas e psíquicas graves e permanentes, é mantida em cerca de 30
países africanos, entre os quais a Guiné-Bissau, onde se estima que metade das
mulheres sejam excisadas.
As Nações Unidas
assinalam anualmente, a 06 de fevereiro, o Dia Internacional de Tolerância Zero
à Mutilação Genital Feminina.
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