Beatriz Gamboa
Não precisamos de
abordar casos específicos, basta tomar como ponto de partida que os juízes do
tribunal de Díli se sentiram com poder bastante para condenar jornalistas
(falando-se até em prisão, que acabou em multa) por alegado crime de difamação.
A legislação pouco clara está a ajudar. A corrupção e o conluio não é exclusivo
de nenhuma classe social mas na sua grande maioria está anexada aos poderes.
Nesses poderes incluiu-se, obviamente, o poder judicial. Essa vertente aliada a
fatores tendencialmente político-partidários é um dos agentes que leva a
instituição da Justiça ao descrédito. E a Justiça timorense não é inocente
nesta vertente. Em Timor-Leste, como por todo o mundo, acontece. Nuns casos
mais, noutros menos.
A ex-ministra Lúcia
Lobato foi condenada a uns quantos anos de prisão (5) por alegado comportamento
ilegal em moldura criminal no exercício das suas funções. Está a cumprir a
pena. Ela alega estar a ser vítima de um processo político. Será. Lúcia Lobato,
dirigente do PSD, abusou de facto dos poderes do seu cargo, há muito anos que
isso era notório, mas foi julgada por quase nada. E foi condenada
exemplarmente, convenientemente. Importava esvaziar de credibilidade o partido
onde era dirigente, o PSD. Sem caírem nas malhas da Justiça do mesmo modo que
Lúcia (ela facilitou isso), também Mário Carrascalão – fundador e histórico do
PSD – foi vilipendiado por Xanana Gusmão no primeiro governo que chefiou. Mário
Carrascalão era seu vice-PM. Carrascalão atacava a corrupção daquele primeiro
governo chefiado por Xanana. Está à vista que tinha razão.
Também um outro
dirigente do PSD foi envolvido em convenientes barafundas com a Justiça apesar
de ser ministro dos Negócios Estrangeiros desse governo de Xanana Gusmão, Zacarias
da Costa. Os juízes não tiveram modo de lhe lançar as garras, justa e
naturalmente. Zacarias da Costa foi ainda completamente ridicularizado por
Xanana Gusmão em público através da presença da televisão timorense, numa acção
que mostrou evidências de ter sido programada e ordenada pelo PM Xanana Gusmão.
Tudo isto aconteceu num Conselho de Ministros convenientemente transmitido para
público assistir. O ataque aos líderes do PSD tem sido notório. O esvaziamento
pretendido foi conseguido. Lúcia Lobato contribuiu imenso para que assim
tivesse acontecido. A tal ponto que o PSD não conseguiu eleger deputados nas
eleições do ano passado. O objetivo não é Lúcia Lobato, nem este nem aquela,
porque corruptos é o que não falta, nem faltava, às ilhargas de Xanana Gusmão.
O objetivo foi a aniquilação do PSD. Aniquilação conseguida. Não foi por acaso
que a Lúcia Lobato enquanto ministra de aparente confiança de Xanana Gusmão lhe
foi dada “corda” para se enforcar. O problema não estava na corrupção nem nos
conluios, nem nos nepotismos. Se assim fosse muitos mais deveriam estar a
contas com a Justiça e a serem efetivamente condenados sem sofismas.
Não existindo o PSD
como força política representada nos órgãos democráticos, com deputados ao
menos no Parlamento Nacional os votos sobrariam para o partido de Xanana
Gusmão, o CNRT, e para o partido do seu delfim José Luís Guterres, depois de
aquele - com controle remoto - ter tentado destruir a Fretilin (2006), de que
era militante e um submarino cujo comando estava nas mãos de Xanana. Mas
Guterres acabou por ser expulso da Fretilin e fundar um novo partido. Primeiro
sem expressão e depois começando a crescer após a destruição do PSD. Nas
eleições do ano passado conseguiu lugar no Parlamento Nacional. José Luís
Guterres é o atual ministro dos Negócios Estrangeiros de Timor-Leste, a par de
Xanana Gusmão como primeiro-ministro.
Perante este
latente apodrecer dos órgãos de poder timorenses e de tribunais que de há muito
se inscrevem na servidão a interesses político-partidários, Lúcia Lobato e os
seus advogados de defesa não deviam esperar outra coisa por resultado de seu
julgamento. Em vez disso esperaram uma condenação que a deixasse em liberdade.
Provável ingenuidade que os conduziu ao estado incrédulo em que ainda se encontram.
Lúcia Lobato está reclusa na prisão de Gleno. Protesta, com alguma razão, mas
não pode esquecer-se que a própria PGR, Ana Pessoa, declarou que Lúcia,
ex-ministra de Xanana, serve de exemplo… O que, podendo ser verdade num estado
com um governo que não tivesse o controlo remoto do funcionamento da Justiça,
seria acertado e convincente. Mas não em Timor-Leste, no estado que é.
É a política. Com
esta política Xanana Gusmão está a desenhar e a contribuir para consolidar um
estado transbordante de injustiças, de ilegalidades cometidas por aqueles que
mais estão próximos dos poderes vigentes. Será esta podridão que se se mantiver
e alastrar poderá ainda vir a “engolir” Xanana e as forças que querem e podem
construir uma nação exemplar em vez de uma cópia do sistema putrefacto,
criminoso e corrupto, que rege a Indonésia e outros estados similares. Ninguém
no seu juízo perfeito poderá admitir que é o que Xanana Gusmão pretende mas é o
que está a acontecer, sendo ele o principal obreiro da eventual sua própria
destruição e da nação timorense democrática e justa com que sonhou nas
montanhas enquanto guerrilheiro, e que prometeu aos timorenses, aos amigos e ao
mundo que tanto o apoiou.
É exatamente por
desvios consolidados em poderes ocultos que a repressão aos jornalistas e a
quem possa beliscar a criminalidade instalada está a funcionar. Ser aliado dos
interesses desenhados por Xanana Gusmão na atualidade não significa que mais
tarde não sejam seus inimigos e o vençam. Por isso compete a Xanana Gusmão, como
PM, e ao Parlamento Nacional, aos seus deputados, saber proteger a liberdade de
informação com legislação inequívoca e exemplar que garanta aos jornalistas não
serem vítimas de poderes que não foram escrutinados pelos eleitores e que como
parasitas sobra-lhes vidas faustosas enquanto as populações na sua maioria mal
sobrevivem na degradante e injustificada miséria. Um jornalista pode de facto cometer
erros, como qualquer profissional, pode ser induzido em erro através de
propiciadas “rasteiras” que aproveitam a inexperiência, mas dificilmente se
encontrará um jornalista que tem a intenção de difamar este ou aquele por nada.
Só para fazer manchete.
Condenando
jornalistas pelo seu trabalho essas condenações também servem de exemplo? O que
querem é condicionar a liberdade de imprensa, nada mais. Atemorizar. Também
neste aspeto os poderes ocultos estão a vencer em Timor-Leste.
*Publicado em TIMORLOROSAE NAÇÃO – opinião e notícias do país e da região
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