Nicolau Santos –
Expresso, opinião
A reação dos
partidos políticos à intervenção de José Sócrates na RTP pautou-se pela
afirmação de que não teria dito nada de novo.
Como é óbvio, o que
pretendem é desvalorizar o regresso do ex-primeiro-ministro à ribalta. Mas
goste-se ou odeie-se Sócrates, vai ser difícil ignorá-lo pela simples razão
que, como disse José Miguel Júdice, ele é um político altamente profissional,
que está a léguas de distância de Passos Coelho ou de António José Seguro -
goste-se ou odeie-se, insisto.
O que disse José
Sócrates de novo? Quatro coisas. 1) Fez o mais violento ataque em democracia a
um Presidente da República, culpando-o diretamente pela crise política que
levou à queda do anterior Governo e à atual solução governativa. Ninguém o
tinha dito com tanta brutalidade. Ninguém tinha dito que foi ele a mão por trás
do arbusto. Ninguém tinha dito que foi ele o patrono da crise política e desta solução
governativa, com a qual está completamente comprometido.
2) Sublinhou que o
PEC IV tinha o apoio do BCE, do Conselho Europeu e da Comissão Europeia. Não
era claro para toda a gente embora a irritação de Angela Merkel com o chumbo do
PEC IV constitua uma possível confirmação. Isso não quer dizer, como é
evidente, que o PEC IV seria o buraco da agulha por onde escaparíamos sem ter
de pedir um resgate ao FMI. Mas que havia apoio da União ao PEC IV, lá isso
havia.
3) Nas parcerias
público-privadas, uma das principais acusações que lhe faziam, Sócrates lembrou
que das 22 PPP existentes só 8 lhe podem ser atribuídas. E que recebeu encargos
de 23 mil milhões com as PPP, que reduziu para 19 mil milhões quando deixou o
Governo. Os números são oficiais, estão nos Orçamentos do Estado - e contrariam
o discurso que tem sido feito sobre esta matéria.
4) No que toca ao
memorando, recusou que o que está em prática tenha sido o documento que
assinou. Disse que já houve sete mudanças e que muitas medidas - subida do IVA
para a restauração e para a energia, corte de meio subsídio de Natal logo em
2011 e confisco dos dois subsídios à função pública em 2012 - não estavam no
documento original, o que é verdade. Se se podia fugir a elas ou seguir outro
caminho, é outra discussão que o ex-primeiro-ministro defende, ao dizer ao
Governo para parar de escavar o buraco da austeridade.
Na entrevista à
RTP-1, Sócrates ajustou contas com o passado e reivindicou o direito a defender
a sua versão dos acontecimentos e a ser comentador televisivo, tanto mais que,
lembrou, quatro ex-líderes do PSD tem espaços desse tipo nas televisões.
A partir de agora,
vai ser um crítico feroz da atuação do Governo. Os seus comentários terão
também danos colaterais sobre a atual direção do PS.
José Sócrates disse
que não vem à procura de nenhum cargo. Logo veremos. Mas o que ele vem fazer é
política pura e dura. Cavaco, Passos e Seguro que se cuidem.
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