quinta-feira, 28 de março de 2013

Portugal: REFORMA, DIZEM ELES




Inês Pedrosa – Sol, opinião

A máquina do Estado é pesada e tem deficiências graves de organização. Isso toda a gente sabe; já estava escrito nos sermões do padre António Vieira, no século XVII.

Não se entende por que é que só agora este Governo que se anunciou como ‘reformista’ decidiu reduzir o número de funcionários públicos.

O programa inicial da troika, subscrito pelos partidos que hoje estão no poder, apontava claramente essa necessidade: a diminuição de custos do país devia focar-se nas despesas e não nas receitas. O Governo tem feito exactamente o contrário, com os resultados que estão à vista: o estrangulamento da economia pela mão inclemente das Finanças.

Mais uma vez, seguiu-se a tão portuguesa estratégia de adiar o difícil e necessário, fazendo o justo pagar pelo pecador. A grande massa de portugueses que nunca soube o que era viver acima das suas possibilidades, porque nem a consciência dessas possibilidades lhe era acessível, serve uma vez mais de bode expiatório ao pequeno número dos eleitos pela sorte.

Que alguns desses eleitos tenham a má-educação de perorar publicamente sobre a necessidade de aumentar a miséria alheia é apenas uma humilhação suplementar para um povo habituado a deixar-se amesquinhar por uma elite sem maneiras, como a portuguesa tem sido desde tempos imemoriais.

Nesta última avaliação, a troika zangou-se e deu um puxão de orelhas à rapaziada do guichê lusitano.

O primeiro-ministro apareceu prontamente, esta segunda-feira, a explicar que rescisão não é sinónimo de despedimento mas antes «uma opção de natureza individual» e uma oportunidade para o «empreendedorismo».

Seria cómico, se não fosse trágico. Particularmente cómico, dado que, como Passos Coelho também explicou, a primeira leva de rescisões se destina aos funcionários públicos com menos qualificações.

É sabido que a falta de competitividade nacional está directamente ligada à falta de formação dos empresários; é um facto que centenas de pequenas empresas morrem, diariamente – no entanto, imune à realidade, o primeiro-ministro aconselha os administrativos da Função Pública a tornarem-se empresários.

A própria ‘ideia’ de cortar a eito, às cegas, por categorias profissionais, manifesta uma incompetência calamitosa na arte de governar.

Em muitos sectores da Função Pública há excesso de chefes e falta de executantes. Há administrativos mais produtivos do que muitos técnicos superiores; acresce que um técnico superior dificilmente aceitará cumprir tarefas ‘inferiores’. Portugal, como todos os países complexados, tem em alta conta os sinais exteriores de poder, por ínfimos que sejam.

O Governo ficou excitado com o estudo que demonstra que os cargos mais baixos da função pública têm melhor remuneração do que os lugares idênticos nas empresas privadas, e terá pensado, sei lá, que com este critério criava mais igualdade.

Francamente, tenho dificuldade em perceber o que pensa e como pensa este Governo, admitindo que faz o esforço de pensar. É evidente que a reforma do Estado não se faz à pressa nem por camadas salariais: tem de ser analisada, caso a caso. Isto é o óbvio ululante, caramba.

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