Crítico do Banco
Central do Brasil e do que chama de “interferência” do governo de Dilma
Rousseff, o semanário britânico esquece de mencionar que o totem
anti-inflacionário que hegemonizou o pensamento econômicos desde o monetarismo
de Ronald Reagan e da recentemente falecida Margaret Thatcher, está em crise. Este totem fez
toda a política econômica girar em torno de um objetivo único: a inflação. Mas
hoje os próprios países centrais estão fracassando na obtenção desse objetivo
ou estão o abandonando de forma deliberada. A análise é de Marcelo Justo.
Marcelo Justo - Carta Maior
Londres - “Um
banco central sabe que perdeu as rédeas das expectativas inflacionárias quando
se converte em objeto de piadas”. Assim começa a nota publicada nesta
sexta-feira pelo semanário britânico “The Economist” sobre a política
inflacionária brasileira. O centro das brincadeiras é o preço do tomate. “As
redes sociais têm caricaturas de ladrões de banco fugindo com bolsas carregadas
de tomates e ganhadores da loteria banhando-se em molho de tomate”. Segundo a
revista, o serviço aduaneiro brasileiro indicou que os contrabandistas
paraguaios acrescentaram tomates argentinos ao seu estoque de drogas, cigarros
e produtos eletrônicos.
O semanário é muito crítico do Banco Central do Brasil e da “interferência” do
governo de Dilma Rousseff. “Os preços subiram cerca de 6,6%, muito acima do
objetivo oficial de 4,5%. Finalmente as zombarias obrigaram o banco a mudar de
política. No dia 17 de abril, o Banco Central subiu a taxa de juro em 0,25%”.
Segundo disseram ao semanário “analistas de mercado”, o atual índice de 7,5%
seguirá subindo até chegar a 8,5% no final do ano.
“Uma razão pela qual o Banco Central não mudou durante muito tempo as taxas de
juros foi porque pensava que a pressão sobre os preços se devia a questões
passageiras. Os economistas ortodoxos se sentem hoje reivindicados por suas
previsões de que os ajustes automáticos feitos nos salários, alugueis,
honorários profissionais e muitas outras coisas (um legado da hiperinflação do
passado) iriam ter um impacto generalizado nos preços.
A análise enviesada do semanário esquece de mencionar que o totem
anti-inflacionário que hegemonizou o pensamento econômicos desde o monetarismo
de Ronald Reagan e da recentemente falecida Margaret Thatcher, está hoje em crise. Este totem fez
toda a política econômica girar em torno de um objetivo único: a inflação. Mas
hoje os próprios países centrais estão fracassando na obtenção desse objetivo
ou estão o abandonando de forma deliberada porque o consideram
contraproducente. Vejamos.
No Reino Unido desde dezembro de 2009 não se alcança a meta inflacionária do
Banco da Inglaterra de 2% anuais. Segundo indicou dia 16 de abril o Escritório
Nacional de Estatísticas, a inflação em março foi de 2,8% e o Banco da
Inglaterra reconheceu que terá que esperar até 2016 para poder alcançar
novamente o objetivo de 2%. Dado que essa é uma promessa para o futuro que o
Banco vem fazendo desde 2009 (promessa que vai esticando anualmente os prazos),
suas projeções perderam credibilidade.
Nos Estados Unidos, a Reserva Federal deixou claro que seu objetivo primordial
no momento é baixar o desemprego (7,6% em sua última medição nesta sexta-feira)
e não a inflação (2,4%). No Japão, a política do novo governo de Shinzo Abe é
deliberadamente inflacionária. O Banco Central variou seu objetivo de uma
inflação de 1% por outro mais importante: evitar a deflação (queda de preços
que engole lucros e leva a desinvestimento e bancarrotas), corda no pescoço que
a economia japonesa carrega. Segundo o economista Hamish Mc Era, editor
associado do “The Independent”, todos os países centrais abandonaram a política
de metas inflacionárias que a “The Economist” segue idolatrando.
“As metas inflacionárias são hoje uma ferramenta que perdeu toda credibilidade.
Ninguém quer dizer, mas os fatos mostram que ela foi abandonada no Reino Unido,
nos Estados Unidos e Japão. A única exceção é o Banco Central Europeu (BCE)”,
escreveu nesta sexta Mc Rae no “The Independent”.
Nada melhor que a exceção para confirmar os efeitos nefastos da regra. A
política ultra-ortodoxa do Banco Central Europeu (dominado pela Alemanha que
vive sob a sombra traumática da hiperinflação dos anos 20 que abriu a porta ao
nazismo) fez com que se mantivessem taxas de juros altas na época prévia ao
estouro de 2008 e que, mesmo nos dois anos seguintes, insistisse em fazer da
inflação o objeto central de sua política. Se nos anos prévios à queda do
Lehman Brothers essa política bloqueou o crescimento de muitos dos 17 países
que formam a zona do euro, nos anos seguintes representou o salva-vidas de
chumbo que seguiu afundando as economias.
As taxas finalmente baixaram e hoje estão em um mínimo histórico, ainda que
acima das registradas nos EUA e no Reino Unido. Não aconteceu nada com a
inflação, mas o crescimento europeu, estagnado pela debacle financeira e pelas
dívidas fiscais que deixou, não responde. Como disse certa vez o falecido
comandante Hugo Chávez, “esse não levanta nem com Viagra”.
Tradução: Katarina Peixoto
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