Baptista-Bastos –
Diário de Notícias, opinião
Para o dr. Pedro
Passos Coelho a culpa das nossas desgraças é sempre do "outro". Ele
nada tem a ver com isso. De tal forma a desvergonha atinge o desaforo que,
pouco depois de tomar posse, pediu desculpa aos portugueses pelos erros de...
José Sócrates! Passos é virtuoso, paladino denodado do "interesse
nacional", patriota indefectível e cuidador infatigável dos mais
desafortunados. Di-lo sem escrúpulo e sem pudor, obedecendo a um breviário
ideológico que se refugia na invocação constante, para justificar a sua acção,
dos temas da modernização, da revisão geral das políticas públicas, da
competitividade da economia e da racionalização das escolhas orçamentais -
custem o que custarem.
A última do
cavalheiro foi a de, pela segunda vez, tripudiar sobre as decisões do Tribunal
Constitucional, depois de ter exercido, com um par de asseclas e a colaboração
de alguma Imprensa, descaradas pressões de sobreaviso e de ameaça. O discurso
de "desculpabilização", proferido antes de ir a Belém, solicitar os
améns do dr. Cavaco, é um texto desacreditante, por indecoroso. O dr. Cavaco,
naturalmente, deu-lhos, com transporte e unção. Porém, foi uma espécie de
fita-cola política: o Executivo já não executa nada: é um cadáver que se
contorce.
Afiançar que a
coligação tem legitimidade para governar é um ardil. O dr. Cavaco sabe, melhor
do que ninguém, porque dispõe de informação privilegiada, que a base social do
PSD-CDS já não corresponde à que elegeu o Governo, há dois anos. E que o perigo
que corremos, como nação e como povo, é iminente: a hecatombe não se compadece
com o desejo insano de um grupo tresloucado.
Toda esta farsa
perdeu um átomo de decência: não passa de uma cegada, sem graça nem elevação. E
que dizer da excruciante intervenção de António José Seguro, de resposta ao discurso
de Passos? Uma patacoada mal cerzida; e, se a compararmos com o primeiro
programa de Sócrates, na RTP, um desastre pessoal, a arrastar consigo o próprio
PS. Que alternativa à vista? Nenhuma, seriamente credível. Falta a Seguro o que
sobra a Sócrates: fibra, coragem, convicção e intrepidez. E os movimentos de
incomodidade, registados no PS, começam a transfigurar-se em repulsa.
A intervenção do
antigo primeiro-ministro suscitou uma espécie de erisipela na Direita e algumas
angústias metafísicas em sectores socialistas. Comparando-a com as conhecidas,
é mais contundente e menos hipócrita do que as de Marcelo e as do seu epígono
Marques Mendes. Quanto ao programa do dr. Sarmento, a pequenez deste ficou no
estado natural, aumentando, contudo, a índole do seu carácter ressentido e
rancoroso. Transformá-lo no contraponto de José Sócrates é um disparate pegado.
Nestes equívocos e
imbróglios, nestas fraudes e nestas barafundas Portugal vai, tristemente,
sobrevivendo.
Sem comentários:
Enviar um comentário