Henrique Monteiro –
Expresso, opinião
Qualquer remodelação que
não passasse pelo topo do Governo - e refiro-me mesmo a Passos e Gaspar -
ficaria incompleta. Claro que Miguel Poiares Maduro tem um currículo invejável,
sério, criterioso; é certo que Marques Guedes transmite uma seriedade
infinitamente superior à de Relvas, mas nem um nem outro resolvem qualquer
problema. Nem podem, por muito bom desempenho que atinjam.
E qual é o problema? Justa ou injustamente, este Governo perdeu aquele
mínimo de credibilidade necessária. Escusam-me de dizer que outros Governos
também não a tinham, porque é falso. Ou seja, olhemos para Sócrates: o Governo
era mau, era péssimo, tomou medidas que nos custam os olhos na cara. Mas tinha
seguidores indefetíveis. Uma parte significativa do país achava que Sócrates
nos salvava.
Ao contrário, bastou a Gaspar fazer um despacho numa tarde de
segunda-feira, para logo nesse dia à noite começar a faltar tudo no país -
comida nas cantinas, gasóleo nos carros, papel nas repartições. Não me
interpretem mal: eu não acredito que o efeito fosse esse, mas as vozes que se
levantaram - quase todas - assim o diziam. Ninguém concedeu, por um segundo, o
benefício da dúvida a Gaspar. E ninguém defendeu aquele despacho nem aquele
ministro. Em parte, porque os considerandos do documento são revanchistas,
inúteis; em parte porque Gaspar não tem apoios; em parte porque o Governo está
isolado de tal forma que, como escrevi há tempos usando uma frase da terra da minha
origem, já nem os cães o respeitam.
Claro que nenhum Governo no meio de uma crise assim seria popular. Mas
nenhum pode ser tão impopular. Claro que um Governo não pode governar para
agradar ao eleitorado, mas nenhum pode sobreviver se for odiado - ativa ou
passivamente - pelo eleitorado.
Este é um problema sério. Não se pode dissolver o povo nem instituições como o
Tribunal Constitucional ou o Presidente da República. E o povo - do CDS ao
Bloco de Esquerda (basta ouvi-los na televisão) não suporta este Governo. Já
não é só a esquerda, é a direita. De Bagão Félix, a Manuela Ferreira Leite, de
Pacheco Pereira a António Capucho ninguém parece continuar disponível a
acreditar em algo que este Governo faça. O próprio novo ministro Miguel Poiares
Maduro fez, segundo li hoje no 'Público', algumas sugestões de governo
diferente no seu Facebook...
Este é, pois, o problema em que Passos tem de pensar seriamente. Eu, que nem
sou dos maiores críticos do Governo, por entender que ninguém que faça reformas
pode ser amado (embora escuse de ser tão extensamente odiado), também já não
suporto ver esta caminhada constante para o abismo político e económico.
É preciso esperança, porque sem esperança não há caminho. E para renovar a
esperança é preciso que alguns saiam de cena.
Sem comentários:
Enviar um comentário