quinta-feira, 18 de abril de 2013

Portugal: UM PAÍS PARALISADO




Mário Soares – Diário de Notícias, opinião

A chamada remodelação foi um autêntico bluff. Tirando a demissão de Miguel Relvas, que finalmente saiu do Governo, embora levasse tempo a concretizar a demissão, lá teve de sair e acabou por não ir para o Parlamento, como disse pretender. Compreendendo que não poderia lá ficar. Era pior a emenda do que o soneto.

Excetuando a saída de Relvas, no Governo nada se passou de significativo. Marques Guedes foi "promovido" a ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares. Por quanto tempo, com um Governo desacreditado, desmoralizado e moribundo? Quanto ao ministro Miguel Poiares Maduro, também não me parece que tenha tempo para aquecer o lugar...

A verdade é que a remodelação não foi nada. Só serviu para paralisar o Estado. Nada funciona com este Governo. O ministro Álvaro Santos Pereira perdeu os seus cinco ministérios e parece não ter nada para fazer. Está completamente esvaziado de poderes e ninguém sabe porque continua a ser ministro. Até quando? E para quê?

Mas o mais perigoso, em relação ao Governo, é que quem manda não é o primeiro-ministro - fala de vez em quando, mas não diz nada -, mas sim o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, com uma obstinação neoliberal permanente, que tem vindo - e continua - a arruinar o País, a aumentar o desemprego e a pobreza em geral e, sobretudo, a ignorar os portugueses e a torná-los desesperados, até ao dia em que pelas palavras ou pelos factos digam: basta! Note-se que a televisão estatal da Irlanda disse, com razão, que Vítor Gaspar é o representante da troika, ignorando o que seja um Estado soberano e sem qualquer sentimento patriótico, que ignora o que quer que seja, respeitante a pessoas.

Pergunto: para quê tanta austeridade, que só nos tem arruinado - sobretudo a classe média - e cada vez pagando mais à troika e aos mercados usurários que a comandam? Para chegarmos à situação crítica em que estamos, com o País cada vez mais incapaz de pagar o que deve. Bem queria Vítor Gaspar não ser mais ministro, uma vez que os estragos estão feitos e as consequências serão cada vez piores. Aliás, Cavaco Silva não o deixou ir embora. Porquê? Porque este é o seu Governo, até mesmo dada a impopularidade e as vaias dos portugueses.

Porém, a fraqueza do Governo não depende só do ministro das Finanças, que é quem manda - como é óbvio - e do seu acólito e seguidor Passos Coelho. Depende também de outro partido da coligação, o CDS-PP, de Paulo Portas. Que apesar de dar uma no cravo e outra na ferradura, para sobreviver como líder no CDS-PP, tem necessariamente de ser crítico do Governo, de vez em quando, para não perder o seu eleitorado, que é cada vez menos.

Contudo, essa posição dupla não pode prolongar-se por muito tempo porque os portugueses não apreciam as birras e gostam que os políticos não sejam duplos: mesmo que saibam, como é o caso, que foram chantageados... Num momento em que a esmagadora maioria do Povo Português está contra o atual Governo - porque se sente roubado pelas decisões que tomou e toma em favor da troika -, o País divide-se em dois: os que são contra e se manifestam nas ruas; e os que são a favor, porque só têm a ganhar com isso. Não há moderados nem centristas: há os que são sim e contam com o despesismo do Governo para os ter na mão; e os que são não. Vaiados nas ruas, os ministros só saem à rua ou vão a qualquer lado rodeados de seguranças. Moderados ou centristas é uma espécie que se esgotou.

Note-se que o Governo, depois da decisão do Tribunal Constitucional - que fez, e muito bem, o que devia -, está mais desacreditado do que nunca. A própria troika sabe bem que contra o Povo e os trabalhadores, mais tarde ou mais cedo, não pode o Governo fazer nada, nem tem dinheiro para lhe pagar.

Daí a troika ter começado a torcer o nariz e a exigir do Governo que alargue ao Partido Socialista as suas relações, como é do seu interesse. E obrigou o Governo, que tanto humilhou e injuriou o PS durante estes dois tristes anos de austeridade, a dialogar com o PS. Daí a carta que Passos Coelho escreveu a Seguro para um diálogo impossível. Só se o PS fosse constituído por parvos ou oportunistas é que aceitava uma aliança. O que não é.

O Governo tem de fazer o que deve: ter vergonha na cara e demitir-se, uma vez que tem o Povo todo contra ele. Não é, ao contrário do que disse o Presidente da República, um Governo legítimo. Deixou de ser. Compreenda, enquanto é tempo, que não se pode governar contra a vontade persistente do Povo.

Leia também o Editorial em Diário de Notícias

Sem comentários:

Mais lidas da semana