Pedro Rainho –
Jornal i
Em Vale de
Nogueiras impera a imagem de um homem estimado. O bichinho da política, que
passou ao filho, não foi mais que um acaso passageiro na carreira de médico
Pode ter estado
quatro mandatos à frente da Assembleia Municipal de Vila Real – onde nasceu e a
terra a que rapidamente voltou, depois de cinco anos em Angola – e pode até ter
sido presidente da Comissão Política Distrital. Pouco importa: a menina dos
olhos de António Passos Coelho foi sempre a medicina. “Sou médico, não tenho
vagar para andar na política. Andei lá numa altura crítica do país e porque me
pediam muito. Sacrifiquei muito, sacrifiquei o consultório, sacrifiquei a
família, sacrifiquei tudo por causa disso”, confessa hoje o pai do actual
primeiro-ministro. Ontem, em Bruxelas, Pedro Passos Coelho disse “não comentar”
as declarações feitas na véspera pelo pai ao i, nas quais António
Passos Coelho disse ter aconselhado o chefe do governo a demitir-se: “Isto não
tem conserto. Entrega isto”.
No mês em que Gomes
da Costa lançou de Braga as bases da ditadura militar nasce, em Vale de
Nogueiras, António Passos Coelho (1926), o penúltimo de dez irmãos. Ser um dos
mais novos teve consequências. “Fui criado noutros tempos, num tempo horrível,
de Salazar. Tirei um curso de liceu de sete anos em dois anos e três meses, a
estudar aquilo 17 horas por dia, senão não era médico”. Filho de um lavrador e
de uma professora, percebeu cedo que o dinheiro não dava para tudo. Depois da
primária, teve de estudar em casa para poder acabar o 7.º.
Entrar para a
universidade trouxe-lhe o primeiro fato que vestiu na vida, mas ser médico
esteve em risco, quando António Passos Coelho, aluno na Faculdade de Medicina
da Universidade de Lisboa, teve tuberculose. “Nem sei como é que consigo
viver”, desabafou o pneumologista a um amigo de décadas, Elísio dos Santos
Silva, ao relembrar as duras operações por que passou. A doença obrigou-o a
suspender durante dois anos o curso e atirou-o para um internamento na Estância
Sanatorial do Caramulo _– experiência que plasmou em livro (Caramulo, 2006), o
local onde viria a começar a carreira profissional (1954) e onde conheceu Maria
Santos Mamede, a mulher de sempre.
Há dois anos – e
depois de 60 no activo (“foi muito ano”) – pousou em definitivo a bata e fechou
o consultório médico. “Quando via que as pessoas não tinham grandes meios nem
levava nada” pelas consultas, confidencia ao i Elísio Silva. O
pneumologista já tinha deixado a ideia no ar: “Nunca ganhei muito dinheiro,
apesar de ter muitos clientes. Nunca me vali disso. Fui sempre um socialista
barato”, conta Passos Coelho.
A experiência
traumática de António Passos Coelho no Caramulo veio juntar-se a uma colecção
de outras obras literárias. “Zélia” (que trata o tema do aborto), “Angola, amor
impossível” (“Eu achava que não me satisfazia, mas escrevi-o”), livros de
contos (o seu género de eleição) e de poesia. Na manga pode estar um livro
sobre o actual momento do país. – “estou a pensar nisso, mas não sei se terei
vida para tal, por ser velho”.
Na foto: António
Passos Coelho, pai de Pedro Passos Coelho. José Sena Goullão/Lusa
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