Mário Soares – Diário de Notícias, opinião
Vamos de mal a
pior: a caminho da desgraça absoluta, se não houver uma mudança de política. A
austeridade só serve os mercados usurários e a troika, criando cada vez mais
desempregados e o empobrecimento geral, com as exceções conhecidas dos adeptos
do Governo, porque esses vivem bem.
A nossa pátria está
a ser destruída aos poucos mas sistematicamente, como a maioria esmagadora dos
portugueses já percebeu, a começar pela fina flor do PSD e do CDS-PP, isto é,
os mais conhecidos e respeitados. Como, por exemplo: Manuela Ferreira Leite,
Pacheco Pereira, António Capucho e Rui Rio ou, do CDS-PP, Pires de Lima e Bagão
Félix, sem esquecer a maioria dos autarcas, como se viu agora com o insuspeito
Carlos Abreu Amorim, dado que não brincam quando as eleições se aproximam...
O Governo Passos
Coelho está moribundo, como toda a gente já percebeu. Paralisado, sem rei nem
roque nem qualquer estratégia coerente. Como é sabido, o poder efetivo depende
do ministro das Finanças, Vítor Gaspar, um economicista fanático, que não é
venal (ao que dizem) mas desconhece em absoluto as pessoas e o País em que
nasceu. Só sabe de contas e cifrões. Não é ministro das Finanças, quando muito
ministro do Orçamento!
Vítor Gaspar e
Passos Coelho são uma dupla que se completa e impõe. Paulo Portas, líder do
segundo partido da coligação, tem sido humilhado de várias formas. Basta dizer
que é a terceira figura do Governo e não a segunda, como seria normal. Às
vezes, parece querer impor-se, como aconteceu na semana passada. Puro bluff. O
discurso que proferiu, com exigências ligeiras, não serviu para nada. Traçou
uma linha vermelha que afinal não respeitou. Passos Coelho, meteu-o na ordem e
humilhou-o de novo, no próprio Parlamento, para que ficasse claro. Tirou-lhe o
tapete. Porque a ameaça de chantagem feita, discretamente, por Passos Coelho
paralisa Portas.
Assim é a vida, com
outras - e grandes - dificuldades com um Governo em que os ministros não se
entendem entre si. Uns são discretos e não falam; outros não, como o ministro
da Economia, que fala pelos cotovelos, mas ninguém o ouve, a começar por Gaspar
e Coelho...
Contudo, o senhor
Presidente da República reafirmou, publicamente, a legitimidade do Governo
Passos Coelho e Vítor Gaspar, depois de os ter ouvido, secretamente, num dos
momentos mais agudos da crise. Aceitou a austeridade que, como está provado,
mesmo na Europa, só leva à desgraça. Os portugueses não gostaram nada dessa
atitude e a sua popularidade, que já era muito baixa, parece ter ficado ainda
pior. É certo que as sondagens valem o que valem... Mas a que foi publicada no
Expresso de sábado último veio revelar aos portugueses que a popularidade do
Presidente se tornou negativa, abaixo de zero, menos 1,2%. O que a ser verdade
representa um recorde nunca visto antes, que tem a ver, infelizmente, com a
cólera do povo - que já o tem vaiado, como aos ministros - e que se vai
expressar, de novo, na manifestação que ocorrerá, junto ao Palácio de Belém, no
próximo dia 25.
Seria bom que o
senhor Presidente da República refletisse e fosse bem aconselhado, porque os
próximos tempos vão ser cada vez mais duros. Não se esperam do Presidente
palavras, mas sim ações. Desista da austeridade e não apoie um Governo que o
povo abomina - até os banqueiros e grandes gestores - e que segundo a última sondagem
vale 25,4% de popularidade negativa.
Agora, convocou um
Conselho de Estado para o período "pós- troika" quando se admite um
segundo resgate... Note-se que se trata de um Governo insuportável, que em nome
de uma troika qualquer está a destruir um grande povo, como o português, a nossa
democracia e põe em causa a Constituição (que o senhor Presidente jurou) e tem
vindo a desrespeitar, pela segunda vez, o Tribunal Constitucional, com projetos
de Orçamento inconstitucionais. Não seja cúmplice - ou pior, protetor - de um
tal Governo. Tenha a coragem de o demitir, que o povo - e todas as classes
sociais - agradecer-lhe-á. É Portugal e o patriotismo do nosso grande povo que
estão em causa, e com isso não se brinca.
De resto, o
Governo, em dois escassos anos, só cometeu erros sobre erros e disse disparates.
Não ouve ninguém nem dialoga sequer com os parceiros sociais, detesta os
sindicatos - seja a Inter seja a UGT - e tem em mira destruir o Estado social.
O primeiro-ministro fala, mas decide o que lhe diz Gaspar, sem consultar
ninguém e muito menos dialogar com os partidos da oposição e o seu próprio
partido. Procede como um déspota, sem prestar contas a ninguém.
Por isso, quando
celebrou os 39 anos de existência do PSD, no jantar que promoveu, contou apenas
com umas escassas dezenas de militantes presentes. Todos os antigos líderes do
PSD e os mais conhecidos dos seus militantes primaram pela ausência. Nem isso o
impressionou? Daí que não seja um democrata e que tenha em vista a destruição
da nossa democracia e, com ela, a Constituição da República. Este Governo tem
de desaparecer. É absolutamente essencial para que Portugal não caia no abismo,
que o ameaça.
Como de costume,
não se conhece ainda o Orçamento Retificativo que vai apresentar ao Tribunal
Constitucional, depois de ter sido recusado, pela segunda vez, como
anticonstitucional. Mas conhecem-se os cortes que vão ser aplicados aos
funcionários e aos pensionistas, mesmo os idosos. Há hoje mais 30 mil
funcionários públicos a despedir, que se acrescentarão aos mais de 420 mil
trabalhadores do sector privado que com este Governo já cessaram funções por
despedimento. É intolerável o roubo das pensões e uma vergonha, que tem de ser
denunciada em todos os tons. Quem pode ter consideração por gente desta,
ministros e secretários de Estado?
Pensarão eles que
vão passar impunes, porque a nossa justiça é lenta e protege os ricos, mesmo
que sejam provadamente gatunos, como todo o País sabe?
Um dia chegará -
mais cedo do que tarde - em que tudo mudará na política, nas finanças e
sobretudo na ética, para bem de Portugal e dos portugueses. Porque a Europa
está toda ela em crise e não vai deixar-se cair no abismo. Seria o primeiro
passo para um novo conflito internacional. O neoliberalismo está a
desacreditar-se e a globalização desregulada também. Oiça-se o Papa Francisco,
que denunciou o neoliberalismo, a política de austeridade e a falta de
solidariedade com os pobres. Atrás de tempo, tempo vem. Atue-se enquanto não há
violência.
Senão, não. Sempre
foi assim...
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