O primeiro presidente de Angola Agostinho Neto não foi “nem
herói nem humanitário”, disse o presidente da Fundação 27 de Maio de
Angola o General Silva Mateus.
O general falava no programa “Angola Fala Só” sobre os acontecimentos de 27 de
Maio de 1977 quando uma facção do MPLA liderada pelo Comandante Nito Alves
esteve envolvida na organização de uma manifestação popular que as autoridades
dizem ter sido na verdade uma tentativa de golpe de estado.
Silva Mateus recordou que foi o presidente Agostinho Neto quem ordenou a
perseguição aos “fraccionistas” o que resultou no fuzilamento ou
desaparecimento de dezenas de milhar de pessoas.
“Não se pode chamar de humanitário ou de herói a uma pessoa que ordena
fuzilamentos sem julgamento,” disse o general. Ele próprio esteve preso após a
alegada intentona.
O general recordou que antes do 27 de Maio de 1977 o MPLA encontrava-se
profundamente dividido, sendo uma facção liderada por Nito Alves e negou que
este e os seus apoiantes tivessem tentado levar a cabo um golpe de estado.
“Não houve tentativa nenhuma de golpe de estado, houve uma tentativa de
manifestação de que foi silenciada a tiro,” disse.
Para o general Mateus nesse dia estava programada uma manifestação popular a
favor de Nito Alves tendo sido isso que resultou nos confrontos.
Silva Mateus negou que os apoiantes de Nito Alves tivessem sido responsáveis
pelo assassinato de alguns dos membros do governo como o ministro das finanças
Saidy Mingas no dia da alegada tentativa de golpe.
Interrogado pelo ouvinte Jorge Muata que falava de Luanda sobre se o
actual presidente José Eduardo dos Santos teve algum papel nos acontecimentos
que ensanguentaram o país, Silva Mateus disse que antes dos acontecimentos de
27 de Maio e face às crescentes divisões dentro do partido, tinha sido decidido
criar uma comissão de investigação para vêr se “existia ou não fraccionismo
dentro do MPLA”.
José Eduardo dos Santos disse o general era o coordenador dessa comissão que
não chegou a conclusão nenhuma após 30 dias como requerido e após outros 30
dias “não apresentou um relatório concludente”.
Para Silva Mateus foi essa “comissão” que permitiu que o presidente Neto
e um dos seus mais próximos colaboradores, Lúcio Lara determinassem a
existência do “fraccionismo”.
O general recordou que se estava próximo da realização do congresso do
MPLA e que devido à existência de duas alas, uma delas liderada por Nito Alves,
havia que eliminar esta facção porque esta facção era “popular ou
se assim o quiserem populista”.
“A facção de Nito Alves tinha que morrer antes do congresso,” disse.
O general confirmou que Nito Alves contava com o apoio da União Soviética. As
simpatias tinham sido fortalecidas por Nito Alves que tinha representado o MPLA
num congresso do Partido Comunista da União Soviética, PCUS.
Após o 27 de Maio de 1977 estudantes angolanos que estavam a estudar nos países
europeus então sob dominação comunista tinham sido repatriados e fuzilados.
“Um estudante que estava na União Soviética ou na Roménia participou numa
tentativa de golpe de estado?” interrogou o general pra sublinhar o seu ponto
de vista que não houve qualquer tentativa de tomar o poder pela força.
Os cubanos tinham intervindo ao lado da facção do presidente Neto porque
estavam em Angola como “mercenários”, acrescentou
O general disse Nito Alves e outros seus colaboradores foram enterrados na
fortaleza de São Miguel em Luanda após terem sido fuzilados sumariamente.
A sua fundação estima que cerca de 80.000 pessoas foram mortas após o 27 de
Maio de 1977. O governo teria informado que 30.000 “desapareceram” das prisões.
O general Silva Mateus reconheceu que muitas das mortes foram causadas por
“excesso de zelo” e também por “rixas pessoais” e disse não ser importante
agora elaborar-se uma comissão da verdade, mas sim “estabelecer o diálogo e a
discussão” para se resolver as questões humanitárias associadas ao caso.
Entre estas questões mencionou a ajuda a familiares das vítimas e o
reconhecimento de que foram mortos.
O MPLA deve reconhecer que isto não é uma questão interna do partido mas sim
uma questão nacional, afirmou
O general Silva Mateus disse não acreditar no entanto que o modo de governar do
partido no poder tenha mudado.
Há apenas uma “democracia de fachada”, disse em resposta a uma pergunta
de um ouvinte sobre o desaparecimento dos activistas Alves Kamulingue e Isaías
Cassule há um ano atrás.
“O regime não mudou desde 1975,” disse o general.
“Eles têm medo do povo e é por isso que não se pode permitir manifestações, é por isso que elas são reprimidas,” disse.
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