Folha 8 – edição 1147
de 22 junho 2013
O dinheiro que cidadãos angolanos aplicam em Portugal não é investimento, serve
unicamente para enriquecer alguns portugueses, disse Paulo de Morais, vice-presidente
da Transparência e Integridade, Associação Cívica – Portugal à margem da
conferência realizada terça-feira em Luanda, promovida pelo Centro de Estudos e
Investigação Científica (CEIC), da Universidade Católica de Angola.
Tal como defendera
em artigo exclusivo publicado pelo Folha 8, Paulo de Morais diz que não há propriamente
investimento angolano em Portugal. Explica que se poderia falar de investimento
se ele fosse direcionado para novas fábricas, ou para os sectores primário,
secundário ou o terciário.
Ora, diz Paulo de
Morais, o capital angolano que chega a Portugal destina-se maioritariamente à compra
de participações em empresas que já existem, que já estão a laborar. “No fundo,
vai é aumentar as fortunas de alguns portugueses. A actividade económica
portuguesa pouco beneficia dos capitais angolanos que chegam a Portugal. Quem beneficia
são os amigos dos angolanos que estão disponíveis a alienar parte das empresas
que têm em Portugal”, acrescentou.
Paulo de Morais fez
questão de frisar que a chegada de capitais angolanos a Portugal tem acontecido
porque “há um conjunto de portugueses cúmplices dos detentores desses capitais angolanos”.
“Investimento é outra coisa. Investimento produtivo seria se capitais
provenientes fosse de onde fosse, chegassem a Portugal para criar agricultura, indústria,
pescas, metalomecânica. Nada disso está a acontecer. O que está a acontecer é a
compra de participações”, acentuou.
Instado a comentar
as afirmações recentemente feitas em Luanda pelo secretário de Estado dos
Negócios Estrangeiros português, Francisco Almeida Leite, segundo o qual o investimento
angolano em Portugal, “mais
do que bem-vindo, é desejado”, Paulo de Morais respondeu que o investimento em Portugal “deve
ser sempre desejado se duas coisas acontecerem”. Ou seja, “se for de facto investimento
que produza riqueza, crie emprego, e se for proveniente de dinheiro que seja de
facto limpo. Porque o dinheiro sujo não é um bom investimento, nem em Portugal nem
em lado nenhum do mundo”.
No artigo “Vassalagem
à corrupção”, um exclusivo que o Folha 8 publicou, Paulo de Morais disse que “o
poder oligárquico angolano invadiu a vida económica, social e até politica de
Portugal”. Nesse texto, dizia o vice-presidente da Transparência e
Integridade, “é dominante a presença angolana nas maiores empresas portuguesas.
São inúmeras as suas participações, que vão das telecomunicações através da Zon,
aos petróleos, onde marcam posição predominante na Galp; passando pela banca,
através do Millennium ou do BIC, e estendendo-se a muitos outros sectores. Angola domina
hoje, directa ou indirectamente, uma parte significativa do capital bolsista
português. O dinheiro proveniente das riquezas naturais angolanas jorra a rodos
nos grupos económicos portugueses. Mas o benefício para a economia lusa é
praticamente nulo. Os angolanos não investem em nada de produtivo, não criam
riqueza agrícola ou industrial. Limitam-se a comprar participações de capital
aos seus amigos portugueses que assim enriquecem, vendendo uma parte do tecido
económico português. Mas não há qualquer acréscimo de riqueza real, aumento de
actividade económica ou crescimento do emprego, por via da presença angolana”.
Sobre a corrupção,
Paulo de Morais escreveu que,“para além do mais, o fortalecimento das relações económicas
com Angola estimula a corrupção, pois esta contamina-se. Angola tem os piores
indicadores de corrupção do mundo lusófono. Ocupa uma das mais baixas posições mundiais
no ranking de transparência da Transparency International. Uma presença permanente
de angolanos em sectores chave da economia portuguesa virá ajudar a piorar a já de
si débil e decadente situação de Portugal, um humilhante, em termos europeus, 33.º
lugar. Não serão seguramente os angolanos e os seus negócios que ajudarão Portugal
a recuperar os níveis desejáveis de transparência”.
De um outro ponto
de vista, o também autor do livro recém publicado “Da corrupção à crise – que fazer?”,
afirmava que “no plano social, a presença angolana é descomedida. Nas lojas mais
caras de Lisboa, os milhões jorram. Os consumidores de luxo são a oligarquia
constituída pelas famílias dos grandes grupos económicos portugueses, os
futebolistas e os milionários angolanos”. E acrescentava: “Em Portugal, em tempo
de crise, os portugueses mais pobres estão na miséria, a classe média experimenta as
provações do desemprego, das dívidas familiares e da ausência de futuro. Em
Angola, o desenvolvimento não chega, a assistência na saúde é uma miragem, falta educação,
o povo vive na miséria. Entretanto, as elites angolanas compram os apartamentos
mais caros de Lisboa e Cascais, gastam milhões em automóveis topo de gama e frequentam
os mais caros restaurantes da capital portuguesa.”
Por tudo isto,
Paulo de Morais não tem dúvidas de que“por via deste predomínio económico e
influência social, o domínio dos governantes angolanos sobre o poder político
português é crescente. Há uma corrida de políticos portugueses que se deslocam a
Luanda a prestar vassalagem ao poder vigente. A influência angolana é galopante e
chega a todo o aparelho da Administração portuguesa. Observam-se hoje situações inimagináveis,
como a do deputado Mota Pinto, que coordena a fiscalização dos serviços secretos
portugueses e é, em simultâneo, administrador da ZON, de Isabel dos Santos. Jamais
se imaginaria que um empregado de Isabel dos Santos pudesse fiscalizar as secretas portuguesas.”
Por fim, escrevia
que “as nossas autoridades estão numa dependência tal do governo de Eduardo dos Santos,
que o ministro dos estrangeiros Paulo Portas teve de vir desculpar pelo facto de
a justiça portuguesa andar a investigar alguns poderosos cidadãos angolanos. Uma
atitude indigna dum ministro de um governo ocidental. Com posturas destas, o
governo português transformou-se num dos principais instrumentos das oligarquias corruptas
de Angola na Europa e torna-se cúmplice da miséria a que o governo de Eduardo dos Santos
condenou os seus concidadãos, nossos irmãos angolanos.”
LIVRO INQUIETANTE E
MOBILIZADOR
“Da corrupção à
crise - que fazer?”, de Paulo de Morais, editado pela Gradiva, foi recentemente
apresentado,no Porto (Portugal) por António Marinho Pinto, Bastonário da Ordem
dos Advogados.
O livro da autoria
de Paulo de Morais, vice-presidente da Associação Cívica Transparência e
Integridade,capítulo português da organização não-governamental Transparency
Internacional, contraria – diz o autor – “duas mentiras colossais que contaminam
a sociedade portuguesa: a de que os portugueses andaram a gastar acima das suas
possibilidades e a de que não há alternativa à austeridade”.
A principal causa
da crise em que Portugal se encontra mergulhado é, tal como o autor defende ao longo
desta sua obra, a corrupção. Alguns grupos económicos, apoiados pelas grandes
sociedades de advogados, dominam completamente a actividade política plasmada na
Assembleia da República e que se transformou, ela própria, numa grande central
de negócios.
“Ainda agora,
enquanto o país empobrece, a classe média se extingue e o desemprego alastra, a
corrupção continua a aumentar, os mecanismos de corrupção agravam-se e cresce a
promiscuidade entre a política e os negócios”, diz o autor.
Paulo de Morais, um
dos principais nomes que dão a cara neste combate desigual pela transparência
em Portugal, desmonta e explica o círculo vicioso da corrupção em Portugal. É
uma obra de denúncia, mas também de alternativas à chaga que devasta e
inviabiliza Portugal. Um livro inquietante e mobilizador.
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VÍDEO 1 – VÍDEO 2 – VÍDEO 3 com o destaque PG, sobre Portugal: “O Estado foitomado por interesses e por lobbies”
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