Daniel Oliveira –
Expresso, opinião
Nuno Crato recusou a proposta de passar o exame de ontem para dia 20. Convocou
todos os professores e houve mesmo, segundo relatos dos sindicatos, uma escola
onde foram chamados dezenas de professores para vigiar o exame de um só aluno.
Noutras, o exame realizou-se na cantina, para poupar nos professores, violando
a regra que apenas permite 20 alunos por sala. Até terapeutas da fala,
formadores e professores da própria disciplina terão sido chamados para vigiar.
Mensagens de telemóvel do exterior com quem estava a fazer o exame, atrasos no
começo da prova, alunos fechados à chave nas salas, inexistência de
secretariado de exames ou ausência de vigilantes coadjuvantes. Tudo a
léguas da normalidade prometida.
O ministro
dirigiu-se ao país, no domingo, para dizer que estavam criadas as
condições para realizar o exame com toda a tranquilidade. Estava apostado em
fazer da ansiedade dos alunos uma arma no braço de ferro com os
professores. O resultado está à vista. Quase um terço de estudantes
não conseguiu realizar o exame, o que, tendo em conta que todos os professores
estavam convocados e que nem dez mil eram necessários, demonstra uma esmagadora
adesão à greve. Alguns estudantes viram as condições em que fizeram o exame
perturbadas por alunos que, não o podendo fazer, queriam garantir que mais
ninguém o fazia.
Já foi marcada nova
prova para 2 de Julho. Ou seja, do ponto de vista prático, Crato tem o
mesmo problema que teria se adiasse o exame: foi obrigado a encontrar uma nova
data, coisa que dizia ser impossível.
Mas Crato tem um
problema agravado: como os alunos que não fizeram o exame vão concorrer às
mesmas vagas nas universidades do que os que o fizeram, serão avaliados por
exames diferentes. Isso cria uma situação de injustiça (as provas
nunca têm o mesmo grau de dificuldade) que alunos e pais não deixarão de
contestar (já o começaram a fazer).
Ao ignorar a
ausência de condições para realizar este exame, ao recusar a proposta do
adiamento do exame para dia 20 (em que a greve seria impossível) e ao teimar no
braço de ferro, Nuno Crato enfiou-se num imbróglio sem saída. Julgava que
a chantagem sobre os professores funcionaria e esperava tirar daí dividendos
políticos. Não funcionou. Tudo o que fizesse agora para resolver a asneira que
cometeu acabaria por criar novos problemas. A isto, num político, chama-se de
incompetência.
Não tenho dúvidas
que os próximos dias serão usados pelo governo e seus comentadores para
responsabilizar os professores por esta confusão sem remédio. E que muitos dos
que ainda consideram a greve um mero protesto simbólico, que não deve ter
qualquer repercussão prática, acompanharão esta conversa. Não tem razão quem o
tente fazer. Mas, mesmo que tivesse, de nada serviria. Quem decidiu manter o
exame para ontem foi Crato. Quem tem de responder por tamanha
irresponsabilidade é Crato. Quem arrisca a sua credibilidade política em
demonstrações de força corre este risco: se a força não for suficiente sai da
contenda mais fraco do que estava. Assim ficou Nuno Crato.
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