Diário de Notícias, editorial
E de repente a
surpreendente confissão. "Apresentar uma lista de erros seria demasiado
demorado." O tom monocórdico e a voz arrastada criava suspense. E a frase
seguinte adensou ainda mais a espetativa: "Tenho amplo material para
aprender com os meus próprios erros." A arrebatadora revelação ficaria, no
entanto, reduzida a um erro. Apenas um. O "importante", desabafou o
ministro. A confidência, que surgiu como um sobressalto, indiciava alguma
mágoa. "Pensei que se poderia dar prioridade à consolidação orçamental e à
estabilização financeira sem uma transformação estrutural profunda das
administrações públicas." Não podia, e Gaspar reconhece-o só agora.
Será esta confissão
uma consciente assunção das culpas e dos erros cometidos ou, senão, foi apenas
o contínuo da estratégia que empurra para outros - quase sempre os governos de
Sócrates - a responsabilidade pelos seus próprios enganos? O ministro não
perdeu tempo. Consequências pelos erros cometidos? Nem uma.Vítor Gaspar
continua convicto de que está no bom caminho. Sublinhou, até, que o programa da
troika - o tal que há uns meses tinha sido mal desenhado - não está a falhar.
Mesmo com os erros.
E para que dúvidas
não houvesse explicou onde estão os principais riscos para o futuro. Défice?
Dívida excessiva? Desemprego descontrolado a bater recordes? Não. O que nos
destrói é a "falta de determinação, a inconstância de propósito, a
tentação prematura do poder, a desorientação sectária, a instabilidade política
e a incapacidade de reflexão e deliberação política". E, claro, a chuva no
inverno. Talvez, por isso, Vítor Gaspar cite, e se declare publicamente
apreciador de Bismarck, que um dia escreveu: "Os tolos dizem que aprendem
com os seus próprios erros; eu prefiro aprender com os erros dos outros."
O Governo e a greve
dos professores
Pedro Passos Coelho
decidiu assumir, face à greve dos professores aos exames nacionais marcados
para dia 17 deste mês, uma postura absolutamente original. Criticando a
inflexibilidade dos sindicatos, o primeiro-ministro utilizou o argumento dos
alunos que são potencialmente prejudicados, para sugerir aos docentes que mudem
a data da paralisação, juntando-a à greve geral convocada para dia 27. Como se,
nessa data, os professores estivessem dispensados de se preocupar com os
estudantes.
O chefe do Governo
deu assim, de borla, um pretexto aos sindicatos e também ao País para o
atacarem. Primeiro porque no dia 27 também há exames marcados. E o que disse
Passos Coelho foi que, não sendo os de dia 27 para alunos do 12.º ano, não
fazia mal. Ora, na escola não pode haver alunos de primeira e de segunda. E
depois porque, nunca tal se tinha visto, um primeiro-ministro a recomendar
quando é que é oportuno fazer ou não greve.
É certo que as
paralisações são tanto mais eficazes quanto contarem com o apoio da sociedade.
E está por demonstrar que, no caso concreto dos professores, haja tolerância e
compreensão por parte da generalidade dos portugueses. Mas o direito à greve é
constitucionalmente inalienável. E compete ao Governo, em vez de fazer um
discurso que pode, no limite, considerar-se intimidatório, deitar mão das
formas legais à sua disposição para contornar as dificuldades causadas por uma
greve, qualquer que ela seja.
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