domingo, 9 de junho de 2013

Portugal: OS ERROS DE GASPAR

 

Diário de Notícias, editorial
 
E de repente a surpreendente confissão. "Apresentar uma lista de erros seria demasiado demorado." O tom monocórdico e a voz arrastada criava suspense. E a frase seguinte adensou ainda mais a espetativa: "Tenho amplo material para aprender com os meus próprios erros." A arrebatadora revelação ficaria, no entanto, reduzida a um erro. Apenas um. O "importante", desabafou o ministro. A confidência, que surgiu como um sobressalto, indiciava alguma mágoa. "Pensei que se poderia dar prioridade à consolidação orçamental e à estabilização financeira sem uma transformação estrutural profunda das administrações públicas." Não podia, e Gaspar reconhece-o só agora.
 
Será esta confissão uma consciente assunção das culpas e dos erros cometidos ou, senão, foi apenas o contínuo da estratégia que empurra para outros - quase sempre os governos de Sócrates - a responsabilidade pelos seus próprios enganos? O ministro não perdeu tempo. Consequências pelos erros cometidos? Nem uma.Vítor Gaspar continua convicto de que está no bom caminho. Sublinhou, até, que o programa da troika - o tal que há uns meses tinha sido mal desenhado - não está a falhar. Mesmo com os erros.
 
E para que dúvidas não houvesse explicou onde estão os principais riscos para o futuro. Défice? Dívida excessiva? Desemprego descontrolado a bater recordes? Não. O que nos destrói é a "falta de determinação, a inconstância de propósito, a tentação prematura do poder, a desorientação sectária, a instabilidade política e a incapacidade de reflexão e deliberação política". E, claro, a chuva no inverno. Talvez, por isso, Vítor Gaspar cite, e se declare publicamente apreciador de Bismarck, que um dia escreveu: "Os tolos dizem que aprendem com os seus próprios erros; eu prefiro aprender com os erros dos outros."
 
O Governo e a greve dos professores
 
Pedro Passos Coelho decidiu assumir, face à greve dos professores aos exames nacionais marcados para dia 17 deste mês, uma postura absolutamente original. Criticando a inflexibilidade dos sindicatos, o primeiro-ministro utilizou o argumento dos alunos que são potencialmente prejudicados, para sugerir aos docentes que mudem a data da paralisação, juntando-a à greve geral convocada para dia 27. Como se, nessa data, os professores estivessem dispensados de se preocupar com os estudantes.
 
O chefe do Governo deu assim, de borla, um pretexto aos sindicatos e também ao País para o atacarem. Primeiro porque no dia 27 também há exames marcados. E o que disse Passos Coelho foi que, não sendo os de dia 27 para alunos do 12.º ano, não fazia mal. Ora, na escola não pode haver alunos de primeira e de segunda. E depois porque, nunca tal se tinha visto, um primeiro-ministro a recomendar quando é que é oportuno fazer ou não greve.
 
É certo que as paralisações são tanto mais eficazes quanto contarem com o apoio da sociedade. E está por demonstrar que, no caso concreto dos professores, haja tolerância e compreensão por parte da generalidade dos portugueses. Mas o direito à greve é constitucionalmente inalienável. E compete ao Governo, em vez de fazer um discurso que pode, no limite, considerar-se intimidatório, deitar mão das formas legais à sua disposição para contornar as dificuldades causadas por uma greve, qualquer que ela seja.
 

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