terça-feira, 16 de julho de 2013

GOVERNO ALEMÃO PODE AFROUXAR REGRAS DA DUPLA NACIONALIDADE




Deutsche Welle

Muitos descendentes de estrangeiros, mesmo nascidos na Alemanha, são obrigados a abdicar da nacionalidade de origem para ter a alemã. Partidos políticos e especialistas defendem a regularização da dupla cidadania.

A Alemanha já é, de longa data, um país receptor de imigrantes, mas ainda tem problemas para se entender como tal. A política de imigração, definida sobretudo por governos conservadores, exige dos estrangeiros e seus filhos – mesmo os já nascidos no país – uma lealdade à Alemanha documentada no passaporte. Entre as razões para isso estão um temor, muitas vezes velado, da formação de guetos e das chamadas "sociedades paralelas".

Até hoje, políticos da conservadora União Democrata Cristã (CDU), o partido de Angela Merkel, argumentam que um cidadão não pode ser leal a um país se tiver dupla cidadania. A CDU defende o direito da cidadania adquirida para imigrantes e seus descendentes, sem, contudo, a possibilidade de manter mais de uma nacionalidade.

Em 2000, social-democratas e verdes tentaram, durante o governo de coalizão, modernizar o "Direito de Nacionalidade e do Reich", datado de 1913 e ainda em vigor no país. As duas facções tentaram fazer com que os estrangeiros tivessem maior facilidade de adotar a cidadania alemã, possibilitando a dupla nacionalidade.

A reforma desencadeou algumas mudanças: desde então, passou a ser possível ao estrangeiro que vive no país há seis ou oito anos adotar a cidadania alemã, em vez dos 15 anos necessários anteriormente. No entanto, a câmara alta do Parlamento (Bundesrat), na época dominada pela CDU, impediu que democrata-cristãos e verdes aprovassem o reconhecimento legal da dupla nacionalidade. O acordo selado entre os partidos em 2000 criou uma situação que vem trazendo problemas para muitos imigrantes e seus descendentes.

Situação jurídica confusa e perigosa

Há, por exemplo, muitos estrangeiros vivendo na Alemanha, cujos países de origem não tirariam deles a cidadania. Este é o caso de Brasil, Marrocos, Síria, Irã e de dezenas de outras nações. Quem vem de um destes lugares e quer ter um passaporte alemão precisa entrar com um "requerimento de manutenção da nacionalidade anterior". A essas pessoas é possível manter duas nacionalidades.

O direito de dupla cidadania é também exercido pelos três milhões de descendentes de alemães que migraram para o país depois da derrocada da União Soviética, bem como aos filhos de pais americanos ou de qualquer país da União Europeia. Todos os outros imigrantes de países que não pertencem à UE precisam optar por uma só nacionalidade: ou a alemã, ou a de origem. A situação mais complexa diz respeito aos filhos de imigrantes que nasceram na Alemanha. Até os 18 anos de idade, eles podem manter as duas nacionalidades, mas com a maioridade são obrigados a optar por uma delas.

Chamados de "crianças que precisam optar", eles são obrigados a resolver entre o 18° e o 23° ano de vida se querem continuar mantendo a nacionalidade alemã. Para isso, é preciso abdicar oficialmente da outra nacionalidade de origem. O documento do outro país que comprova a perda da cidadania pode, contudo, levar meses para ser expedido.

"E quem não puder provar até o aniversário de 23 anos que não tem mais uma segunda nacionalidade perde automaticamente a alemã", alerta Susanne Worbs, do Departamento Federal de Migração e Refugiados.

Uma pesquisa oficial confirma que a maioria dos jovens atingidos por esta questão não detém as informações necessárias sobre tais obrigações burocráticas. "Quem perde os prazos precisa, em último caso, entrar com um pedido de visto na Alemanha", alerta Worbs, ao salientar que o tempo gasto para este procedimento não deve ser subestimado.

Decisão forçada gera polêmica

Na Alemanha, o grupo mais atingido pela obrigação de escolher entre uma ou outra nacionalidade é o de origem turca, que forma a maior comunidade de imigrantes e descendentes no país. Muitos turco-alemães – ou seja, filhos de turcos, mas nascidos na Alemanha – a reclamam da lei que os obriga a abdicar da nacionalidade de seus pais quando optam pela alemã. Ao fazerem isso, eles têm a sensação de estarem abdicando de sua cultura de origem. E acham injusto que a muitos outros estrangeiros seja permitida a dupla nacionalidade, o que lhes é negado.

A opção pelo passaporte alemão permite votar e, com isso, poder contribuir para determinar os rumos do país. E também usufruir da proteção das representações diplomáticas alemãs em todo o mundo. Por outro lado, abdicar da cidadania turca pode trazer também desvantagens, como por exemplo a dificuldade ou até a proibição do exercício de determinadas profissões, só permitidas aos cidadãos do país. Isso dificulta a mobilidade profissional do cidadão. Receber uma herança na Turquia, sendo cidadão de outro país, também é mais complicado.

"Na verdade, não deveria ser assim, mas na realidade muitos departamentos públicos das prefeituras se veem sobrecarregados", afirma Serkan Tören. Deputado federal de origem turca pelo Partido Liberal Democrático (FDP), ele tomou há cinco anos a decisão de se tornar alemão. "Você se torna de repente parte da sociedade na qual vive. Isso foi para mim muito importante", completa.

Tören acredita que a obrigação de optar por apenas uma nacionalidade não é positiva e defende a permissão de dupla cidadania a todos os imigrantes e seus filhos. "Muitos outros países do mundo permitem isso também. Se quisermos concorrer com eles, na luta para angariar mão de obra especializada para a Alemanha, precisamos aceitar a dupla nacionalidade", reivindica o parlamentar.

Mudanças à vista

Esta postura política do deputado é comum entre os membros do FDP, que apoiam em sua maioria a dupla cidadania. Não se sabe, porém, se eles conseguirão se impor frente à conservadora CDU. Social-democratas, verdes e membros do partido A Esquerda pretendem, caso cheguem ao poder, regularizar a dupla nacionalidade.

Uma iniciativa do Bundesrat (câmara alta do Parlamento), hoje de maioria social-democrata, opôs-se oficialmente à obrigação da opção por uma nacionalidade e está à espera de uma decisão do novo Bundestag (câmara baixa do Parlamento), a ser eleito no segundo semestre deste ano. Enquetes atuais provam que há um número cada vez maior de alemães que defendem a dupla nacionalidade para os imigrantes e seus filhos.

"Mais cedo ou mais tarde as regras atuais vão cair por terra, pois elas são alheias ao tempo presente", aponta o pesquisador da Universidade de Osnabrück Jens Schneider. Ele teme que todo aquele que não puder manter duas nacionalidades acabe voltando a seu país de origem. "O atual direito de nacionalidade tem alto potencial explosivo", acredita Schneider. Nas escolas, diz ele, isso causa graves "problemas de estranhamento" – uma observação comprovada por suas pesquisas.

No estado da Renânia do Norte-Vestfália, o maior do país, os requerimentos pedindo a nacionalidade alemã caíram em torno de 40% – uma tendência que pode ser observada em todo o país. A Secretaria de Integração do estado vê a não introdução do passaporte duplo e a obrigação de abdicar da segunda cidadania como uma das razões para isso. Pois manter a nacionalidade de origem é parte essencial da identidade do cidadão.

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